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Críticas

Cineplayers

Lançado à época de Tropa de Elite, Juízo também trouxe sua crítica às instituições brasileiras.

7,0

O cinema nacional aborda com certa frequência as mazelas sociais do país, o que virou alvo de críticas de muitos cinéfilos que não aguentam mais ver o lado feio – e realista - do Brasil retratado nas telonas. O polêmico e amplamente comentado Tropa de Elite, por exemplo, escancarou questões conhecidas por todos, mas o choque de realidade não parece ter sido capaz de trazer consigo mudanças perceptíveis para a sociedade. José Padilha acusou sem piedade a classe média de ser o grande mantenedor do tráfico e da violência, assim como condenou a participação de jovens que consomem drogas em manifestações contra a violência, já que eles ajudam a manter o quadro de caos social.

Juízo, de Maria Augusta Ramos, é mais uma obra nacional preocupada em mostrar a realidade de um país em que as instituições não funcionam da maneira como deveriam. Para isso, acompanha a trajetória de diversos menores infratores desde o momento da detenção até o julgamento por roubo, tráfico ou homicídio. O Brasil que ninguém gosta de ver, mas todos sabem que existe, é mais uma vez retratado com a preocupação de gerar reflexão nos espectadores. A diretora foi inteligente e utilizou recursos que acrescentaram qualidade à narrativa. Como a lei brasileira proíbe a identificação de menores infratores, eles foram representados por jovens não-infratores que vivem em condições sociais semelhantes. Os menores foram substituídos por atores inseridos em cena por meio de uma técnica denominada contraplano. Isso foi possível porque Ramos gravou as cenas sempre de frente para os juízes, deixando os menores de costas para a lente. 

Com apenas 90 minutos e desenvolvido lentamente, Juízo torna-se, por vezes, repetitivo, entretanto o mais importante nesse caso não é apenas a qualidade cinematográfica, e sim as discussões que o filme pode gerar. Para discutir a maioridade penal, evidencia-se como os menores são usados pelo crime organizado, independente de terem consciência do que estão fazendo. Deveria haver redução da maioridade penal de 18 para 16 anos? Ou de nada adiantaria? Talvez a diminuição da maioridade deveria ser ainda maior. Qual o papel das instituições de reeducação de menores infratores? Elas claramente não funcionam, deixam os internos sem nada para fazer o dia inteiro, e não os tratam como deveriam. O estatuto da criança e do adolescente precisa ser corrigido? Falhas, evidentemente, não faltam. O crime é, claramente, consequência da evasão escolar e a falta de políticas educacionais é um problema longe de ser corrigido. O acompanhamento dado aos menores após a liberação é falho e só ajuda a produzir pessoas mais descompromissadas com a sociedade.

Deixando de lado toda a importantíssima discussão proposta pelo filme de Maria Augusta Ramos, destaca-se na produção a grande atuação do elenco juvenil. Todos convencem perfeitamente no papel que interpretam, parecendo ser os réus verdadeiros. Os atores repetiram cautelosamente as palavras ditas pelos infratores durante os julgamentos. Os demais personagens são pessoas reais que realmente ocupam os cargos mostrados. Outra pergunta fica no ar: os que estão do lado da lei estão preparados para fazer algum juízo de valor sobre os infratores? Sem dúvida, a figura mais marcante é a juíza Luciana Fiala de Siqueira Carvalho, que se esforça para tentar, ainda no tribunal, corrigir os desvios de conduta dos menores por meio de broncas, pois sabe que enviá-los para instituições de jovens infratores, apesar de inevitável em alguns casos, não é a melhor solução.

Juízo gera perguntas e algumas respostas. Apesar de curto, não foge da repetição. Se não é o melhor que o Brasil pode produzir como documentário, é mais uma obra preocupada em mostrar o que o país produz com o descaso de suas políticas públicas.

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