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Críticas

Cineplayers

Auschwitz no tribunal.

7,0
Nazismo é um tema inesgotável. A Alemanha, com esse seu Labirinto de Mentiras, escolhido para tentar uma vaga no Oscar 2016, traz um acerto de contas do país com o mundo. Ou ao menos uma tentativa. Passa-se em Frankfurt, no ano de 1958, nos corredores da promotoria pública. Um acerto de contas moral é fortemente elaborado, uma vez que após poucos anos do fim da guerra, nazistas continuavam espalhados pelas ruas. Em certo instante do filme alguém explana isso: “eles ainda estão por aí”. Um tipo herói de terno e gravata fragmentado em ambições pessoais buscará punir todos os envolvidos, o que talvez signifique punir uma nação inteira.

Tal acerto de contas mencionado no início desse texto diz respeito à verdadeira odisseia pela qual um procurador da justiça passará para incriminar alguns alemães que participaram do massacre em Auschwitz. Num primeiro ponto, dentro da ordenação investigativa do roteiro a partir de seus personagens, o que aconteceu em Auschwitz ainda era desconhecido pela nova geração alemã. Após descobrirem o que aconteceu nesse campo de concentração, a busca pelos responsáveis tornou-se obsessão. São centenas de suspeitos. E são 120 minutos de um drama investigativo eficiente, com um ritmo progressivo e com um idealismo como bandeira sobre fazer o que moralmente deve ser feito. Há quem possa incomodar-se com isso.

Dentro da lógica da narrativa, o que interessa é desvendar os culpados. A direção faz isso com certa elegância, com a montagem que reveza suspeitos num plano semelhante, como um enquadramento em comum anexo a linha de indagações. Estão todos sob a mesma ótica, exceto por um personagem específico: o anjo da morte, Josef Mengele. Tal figura teve os últimos dias de sua vida retratados no drama argentino O Médico Alemão (Wakolda, 2013) de Lucía Puenzo. Mengele é o alvo central da investigação uma vez ser envolvido em uma promessa, mas ele é uma figura oculta aos personagens e aos espectadores. Sua busca torna-se essencial no meio da história, o que implica em outros desdobramentos.

A possibilidade de Mengele ser capturado ou não é um arco quase independente da história, talvez o mais importante diante as intenções do roteiro em nos manter atentos até o fim. É uma fórmula bastante usual, um clichê prático e necessário. Esse clichê é trabalhado com bastante competência, pois ele é o principal responsável pelo desenvolvimento de seu personagem central, o procurador Johann Radmann. Sua gana por justiça constantemente é frustrada por aqueles que desejam mascarar o que acontecera no país durante a segunda guerra, rendendo-lhe profundas angústias que lhe desequilibram. O alcoolismo, suas abdicações e a forma com a qual seu personagem se transforma – seus ternos e penteados irretocáveis são arruinados junto a sua personalidade – dão dimensão a sua conduta.

São detalhes que dão conteúdo dramático à obra, já favorecida por nosso natural enternecimento. Alguns relatos sobre algumas das vítimas contribuem com nosso interesse. O trabalho mergulha em convenções dramatúrgicas habituais e planta um romance que pouquíssimo empolga. Realizado em proporções biográficas a partir de altruísmo moral, opera como uma espécie de reconhecimento de culpa, representando possíveis compensações após o Holocausto.

Labirinto de Mentiras é livremente baseado numa história real, em um dos casos de tribunais que muito se assemelhou ao famoso julgamento de Nuremberg. Se o filme não é extraordinário, ao menos apresenta com certo requinte esses dias de justiça. 

Visto durante a 39ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo

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