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Laranja Mecânica

(Clockwork Orange, A, 1971)
8,9
Média
1911 votos
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Sua nota

Críticas

Cineplayers

Um pertubador retrato de uma sociedade que pode ser perfeitamente vista como um espelho da nossa.

9,0

Ultraviolência. Quando Laranja Mecânica se inicia, somos apresentados a essa palavra que, durante toda a duração do filme, será trabalhada. Não, não digo somente de forma física, como as primeiras meia hora de filme apresentam, e sim o violento tom psicológico no qual o filme é conduzido magistralmente por Stanley Kubrick (Dr. Fantástico, 2001: Uma Odisséia no Espaço) até o seu final. Tudo de modo cínico, hipócrita, denunciando todo o egoísmo em uma visionária concepção de sociedade. Algo que, assustadoramente, em pleno século 21, continua atual, senão pior do que nos é apresentado em termos de violência no mundo.

O anti-herói do filme é Alex DeLarge, um jovem líder de uma gangue de delinqüentes, amantes de leite drogado e música clássica, que tem por diversão bater, estuprar, matar... Enfim, cometer qualquer brutalidade que tenha vontade, não se importando com as leis ou o senso humanitário, somente pensando na própria diversão. Quando finalmente é pego pela polícia, sofre um tratamento duro de reabilitação. Um novo método, cruel, que faz com que a pessoa fique totalmente indefesa com relação a violência do mundo. E, mais uma vez, Kubrick brilha de maneira fascinante comparando os atos de Alex antes de sua internação com os da sociedade em resposta ao seu passado na segunda metade do filme. Você realmente se questiona sobre qual tipo de atitude é pior, mais fria, desumana. Não digo isso somente nas pessoas da rua, os antigos amigos de Alex, e sim com toda a falta de escrúpulo em volta dos interesses políticos sobre a situação. Uma ousadia incrível de Kubrick, perfeitamente retratada, questionar o sistema de modo tão duro.

Quem interpreta o problemático Alex é Malcolm McDowell, simplesmente perfeito no papel. O seu olhar, sua frieza, chega realmente a intimidar. Pense na cena de abertura do filme, aquele olhar intimidador, característico de alguns filmes do Kubrick, acho que nunca se encaixou tão bem em um personagem seu antes (e nem depois). A sua importância dentro do contexto é tanta que li, certa vez, que Kubrick chegou a cogitar a possibilidade simplesmente não rodar Laranja Mecânica caso Malcolm não aceitasse o papel. É curioso como Kubrick tem total controle sobre seus atores. O modo como eles falam, o jeito cínico, tudo é captado mesmo que de forma inconsciente pelas pessoas que estão assistindo. O controle se reforça por uma curiosidade muito peculiar: Malcolm tem fobia a cobras, e advinha o animal de estimação que Kubrick deu a Alex?

Kubrick tem também o total domínio sobre as técnicas de filmagem. Misturando diversas dessas técnicas, ele cria o ambiente que quer da maneira que quer. Mesmo que possa parecer estranho (seus cenários tem cores sempre extravagantes, poucos objetos de cena, chão brilhando, luzes estourando nas paredes e tetos), tudo tem uma perfeita sintonia com o mundo em questão. Aliás, essa característica não se diz somente à Laranja Mecânica, e sim a todos os filmes de Kubrick (até mesmo Spartacus!), mas citei para reforçar que nada foi ao acaso, tudo está lá propositalmente. Certas vezes temos o tempo do filme alterado, passando mais rápido ou devagar, tudo ao som da mais bela música clássica. Aliás, Kubrick também brinca com temas clássicos, como nunca vistos antes. Além dos clássicos já supra citados, temos canções inocentes como ‘Singing in the Rain’ interpretadas de um modo bem diferente.

O engraçado é que Laranja Mecânica custou apenas 2 milhões de dólares e, sem sombra de dúvidas, é um grande clássico. O que prova que a qualidade não está nos orçamentos milionários de Hollywood, e sim na competência de seus realizadores. É tão óbvia essa afirmação que me pergunto como filmes horrorosos que custaram dez vezes mais conseguiram ser aprovados por seus produtores. É ao mesmo tempo divertido e cruel. Fascinante e perturbador. Uma reflexão e medo. Ousado e intrigante. É Kubrick em sua melhor forma.

Comentários (2)

Luiz Phillipe Lameirão Côrtes | terça-feira, 02 de Setembro de 2014 - 21:08

Não tem um motivo sequer pra não levar nota 10. E mais, um dos raríssimos casos de filme que supera o livro original. Li o livro, ganha uma nota 6,5, enquanto o filme é irrepreensível.

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