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Críticas

Cineplayers

Apesar do tema recorrente da Guerra do Iraque, filme ganha pontos pelas interpretações muito boas.

6,0

E a Guerra do Iraque novamente é tema de um drama em Hollywood. Em Nossa Vida Sem Grace, não há pretensões políticas grandiosas, mas nem por isso a abordagem é menos séria do que em, digamos, no recente No Vale das Sombras, de Paul Haggis. O desconhecido James C. Strouse, que era o roteirista e ganhou a direção do longa-metragem após Rob Reiner ter abandonado o projeto, teve o desafio de mostrar de forma sutil, mas marcante, as consequências que o conflito teve (e ainda tem) nos lares dos familiares dos soldados. Aqui o drama está disfarçado em um road movie agradável, mas no final das contas o grande ponto a favor da obra são mesmo as interpretações.

Para sair um pouco da rotina, a mãe é quem foi à guerra, ficando o pai responsável por cuidar de duas filhas, uma delas pré-adolescente e a outra ainda na fase de ser fofinha e engraçadinha. A mãe acaba morrendo no campo de batalha. O pai não sabe como contar para as crianças e lança-se desesperado com elas pelas estradas do país. No caminho, param na casa da avó. Todas as passagens bem redondinhas, limpinhas e corretinhas. Surpreendentemente, não é apenas John Cusack que consegue encarnar seu papel com a sutileza e o realismo necessários; ambas as atrizes mirins (de nomes difíceis – Gracie Bednarczyk e Shélan O'Keefe) conseguiram a façanha de manter o nível dramático exigido de forma muito competente.

É agradável acompanhar o trio em suas desventuras pelas estradas norte-americanas. Lembra muito o sucesso crítico Transamérica: tem aquele mesmo sentimento de road movie, liberdade, mas com o drama, os problemas que insistem em perseguir os personagens, com algo engasgado dentro deles, que também permeia aquele filme. Os conflitos óbvios vão acontecer, é claro, não há surpresas aqui. Mas o trabalho de Strouse foi competente o suficiente para criar textos e situações admiráveis, no sentido de gerar expectativa pelo próximo acontecimento. Não há um grande momento no filme – talvez apenas o momento em que o pai acaba tendo que contar o destino da mãe às filhas, uma ótima cena – e talvez por isso ele seja tão agradável. Por causa de sua simplicidade, fica fácil nos identificarmos com aqueles personagens. Há poucas cenas esquemáticas ou forçadas.

Mas essa simplicidade também é sua principal limitação. O filme tem surpreendentes 85 minutos, duração que geralmente é dada às comédias pastelões. Não significa, porém, que não haja desenvolvimento de personagens. O trio principal entrega informações interessantes ao espectador, sempre com algo novo que nos faça sentir a dor do pai, e entender o medo que ele sente por contar sobre a morte da mãe às garotas. Por causa desse tempo limitado, também, e como já foi comentado acima, há pouco tempo para discursos políticos, embora eles existam – todo o ato envolvendo a visita ao seu irmão na casa da avó foi montado para discutir os prós e contras dos Estados Unidos entrarem nessa guerra. É uma cena bem desconexa do restante do filme, até mesmo um tanto quanto desnecessária.

Com relação ao trabalho de Strouse como diretor, há pouco o que criticar. Ele entregou um filme muito bonito (mas afinal são poucos os road movies norte-americanos que são feios), de ritmo acertado, direção de atores competente (prova disso é a qualidade das interpretações infantis, provindas de atrizes novatas, algo difícil de se conseguir) e gosto por planos tão simples como o desenrolar da história. Obviamente o filme foi um fracasso de público – os norte-americanos, em sua maioria, não gostam de dramas familiares que envolvam morte, e ainda se desconfiarem que haja política no meio. O Globo de Ouro agraciou o filme com duas indicações pela parte sonora – uma delas, pela música original “Grace is Gone”, criada por Clint Eastwood e com letra de Carole Bayer Sager.

Como já foi comentado, não há elementos novos nem mesmo especialmente bons senão as interpretações. O filme é extremamente certinho, artisticamente e tecnicamente, e provavelmente por isso (o fato de nunca ousar realmente) seja no máximo um bom trabalho. John Cusack interpreta novamente um pai de família, mas aqui tem que lidar com algumas camadas extras (perda, medo, confusão) que diferenciam, pelo menos um pouco, este papel dos papéis médios de sua carreira. E vale à pena assistir ao filme principalmente por conta dele e das garotas, que fazem um trio muito bom.

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