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Críticas

Cineplayers

Um marco do cinema brasileiro, satirizou a tudo e a todos, redefinindo os moldes conservadores e criando novos.

9,0

O Bandido da Luz Vermelha, primeiro longa-metragem do jovem cineasta Rogério Sganzerla, que com 22 anos inaugura no Brasil uma nova escola cinematográfica: o Cinema Marginal. Antes de se tornar diretor, Rogério já era respeitado como crítico de cinema do Jornal da Tarde e do Estadão. Com esse filme, ele define e inova os moldes estéticos de um tipo de cinema que não se preocupa com a claridade dos fatos; filmes que buscam explodir com linguagem e mostrar uma relação totalmente pessoal da imagem com o cinema, a política, a arte e a vida.

“Movimento” instaurado posteriormente ao Cinema Novo, ambos tinham alicerces ligados ao Neorrealismo Italiano. Porém, o Cinema Novo era ligado à cultura brasileira (cangaceiros, negros, pobreza), enquanto que o Cinema Marginal tinha uma proposta mais experimental, era ligado a várias artes e ligado ao anarquismo (os meios de comunicação de massa, as drogas, o psicodelismo, o nonsense em geral).

Fanático por Orson Welles e Jean-Luc Godard, Sganzerla começa seu filme com uma homenagem ao diretor francês. Em vez de créditos iniciais convencionais, o filme se inicia com um painel luminoso no qual se movimentam por ele as informações. Começa com “um filme de cinema de” e logo após o nome de toda equipe que idealizou o filme. O roteiro do filme foi baseado na vida de João Acácio Pereira da Costa, bandido catarinense que atormentou a polícia paulista na década de 60. Paulo Vilaça (Jorge) faz o papel principal.

Helena Ignez (Janete Jane), que futuramente casaria com o diretor e seria a musa do Cinema Marginal, cria um estilo de atuar debochado, extravagante. Ela faz o papel de uma prostituta que se torna a relação mais pessoal entre o assassino e as pessoas. Um momento que o assassino deixa de matar e começa a amar. O filme, feito em um estilo documentário, utiliza sempre de recursos da comunicação em massa (rádio, TV), e sempre com um tom de galhofa, uma narração policial sensacionalista.

O matador nos lembra o poeta de Terra em Transe, que, com técnicas extravagantes, consegue invadir mansões na capital paulista, sempre com uma lanterna vermelha e sempre a manter um diálogo com suas vítimas. Um anti-herói que na história real só era odiado pelos policiais; o povo de um certo modo o amava, soava como um Robin Hood moderno que, ao invés de distribuir o dinheiro roubado aos pobres, distribuía seu sêmen à burguesia.

Atenção! Spoilers a seguir!

O desfecho se dá com mais uma homenagem a Godard, dessa vez a O Demônio das Onze Horas (Pierrot Le Fou, 1965). O bandido finge ter sido baleado pela polícia e cambaleia às gargalhadas, ironizando o medíocre serviço de uma polícia que não consegue e nunca conseguirá pegá-lo. Aqui ele não se suicida com uma dinamite como no filme de Godard, ele morre eletrocutado num lixão. Posteriormente seu corpo é achado pela polícia, que, duvidando que seja o famoso assaltante, convoca o delegado ao local, que comete o mesmo erro que o bandido e acaba morto eletrocutado ao seu lado gritando comicamente ao final: “Mamãe!”

Esse filme é um marco inconteste do cinema brasileiro. Aclamado pela crítica, Sganzerla estreia em longas-metragens com o mesmo prestígio de um Acossado (À Bout De Souffle, 1960) de Godard e Accattone - Desajuste Social (Accattone, 1961) de Pasolini. O Bandido da Luz Vermelha satiriza tudo e a todos, redefine moldes conservadores e cria uns vindouros. Genialmente editado, torna-se o expoente máximo do Cinema Marginal.

Texto retroativo da série Clássicos Brasileiros

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