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Críticas

Cineplayers

Um outro conto de messias.

6,5

Até Guardiões da Galáxia conquistar as bilheterias no ano passado, era quase de acordo geral que a ficção-científica intergaláctica sofria de uma falta de interesse das novas gerações. O sucesso de crítica dos dois novos Star Trek dificilmente está associado a um apelo juvenil, o que o filme não tem (basta comparar quantas lancheiras escolares foram estampadas com a imagem de Spock e Kirk em comparação ao Star-Lord de Chris Pratt). Outros, como John Carter e Lanterna Verde foram um franco fracasso. É mais provável que O Destino de Júpiter, dos desgraçados Lana e Andy Wachowski, confirme Guardiões como exceção da regra: o tempo da aventura espacial acabou.

Será um desfecho um tanto injusto para o filme e o gênero, mas inevitável. Interesses mudam, e parte dessa mudança motiva inclusive O Destino de Júpiter. Finalmente, temos uma mulher protagonizando um blockbuster de ficção-científica. Com que frequência isso aconteceu fora da saga Alien? É realmente uma pena que, do caminho de A Viagem para este filme, os Wachowski tenham abrido mão de sua sofisticação narrativa fantástica ou da capacidade criativa responsável por Matrix.

O Destino de Júpiter é mais uma narrativa messiânica dos Wachowski. Brinquei com um colega que me acompanhava à pré-estreia que eles pareciam querer recontar a história de Cristo a cada filme. Mas não é apenas recontar, na verdade, é deturpar, ressignificar ou simplesmente construir uma nova leitura dela, uma fantasia sobre como seria a trajetória de um messias em determinados contextos de lugar e tempo.

A predestinada, neste caso, é Júpiter (Mila Kunis, de presença agradável, mas distante), uma imigrante russa ilegal que trabalha com a família fazendo faxina em casas da classe média alta de Chicago. Graças ao gosto dos Wachowski por manter as implicações de sua trama um mistério até meados do segundo ato, entenderemos que Júpiter está predestinada a alguma coisa porque a jovem é caçada/resgatada por uma série de personagens excessivamente maquiados. Ela também é assunto das artimanhas de três irmãos da nobreza queer interestelar, os eternamente jovens Kalique, Titus e Balem Abrasax (o último, um pavoroso Eddie Redmayne).

É difícil falar das coisas boas de Júpiter (sim, elas existem) sem entregar algumas surpresas da trama, mas vou tentar. Há uma movimentação política nos filmes dos Wachowski que normalmente me agrada muitíssimo. Em A Viagem, mais do que em qualquer outro deles, isso foi amadurecido para uma história complexa e sofisticada. O meu problema com A Viagem, é que o filme, porque precisa ser, é demasiadamente criptografado. Animei-me com a perspectiva de Júpiter para ter esse mesmo amadurecimento em um filme pipoca. Foi uma meia decepção. O Destino de Júpiter mantém uma posição anticapitalista muito forte, que se ramifica para além do clichê vilão-em-busca-de-lucros. O que mais me chamou a atenção nesse sentido, no entanto, foi a já mencionada inversão do messianismo.

A história da salvação prometida é um clássico da narrativa da nossa sociedade e carrega um caráter um tanto determinista. Quero dizer, quando se diz que o sujeito está predestinado a grandes coisas usa-se a mesma justificativa que aqueles que detém o poder hegemônico, mais obviamente no caso de uma monarquia, podem usar para se manter no poder: “Este é o lugar ao qual pertencemos”. Insisto mais uma vez que Júpiter é uma antimessias porque ela é, na realidade, feita messias pelos seus inimigos. No fim da sua jornada, ela rejeitará esse lugar de messias, uma escolha dela.

Espero que pelo menos as boas referências a Guerra nas Estrelas (que contestam justamente o determinismo da saga de George Lucas) salvem este filme do generalizado ódio que já o cerca. É uma rejeição que francamente não entendo. Poderia ser melhor escrito e montado, de fato, mas O Destino de Júpiter é, ao menos, sincero em suas poucas intenções.

Comentários (17)

Ted Rafael Araujo Nogueira | terça-feira, 10 de Fevereiro de 2015 - 18:25

Continuando...

Ainda acho que os diretores ainda merecem uma ponta de curiosidade por,pelo menos, tentarem fazer algo diferente na maioria de seus trabalhos. Se for uma porcaria, como creio que seja, será uma pena, mas assistirei pela curiosidade mórbida. Vai que presta... 😏

Lucas Souza | terça-feira, 10 de Fevereiro de 2015 - 20:14

Ted, como sempre falando tudo...

Diogo Serafim | quarta-feira, 11 de Fevereiro de 2015 - 07:18

engraçado ted, temos opiniões quase opostas. não gosto da trilogia matrix, considero v de vingança um desastre total e speed racer um filme bem bacana (5). não assisti a viagem :/

Wellyson Rodrigues | quinta-feira, 12 de Fevereiro de 2015 - 23:45

O quê os irmãos Wachowski e o M. Night Shyamalan tem em comum?

Cada um fez um filme no mesmo ano (1999) que foi sucesso de público e crítica. E a partir daí, tentam criar um estilo próprio se baseando no filme que os consagrou.

Resultado: Bomba atrás de bomba.

Pobres diabos sem talento!

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