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Críticas

Cineplayers

Um retrato seco e sem qualquer profundidade sobre um dos maiores conquistadores que o mundo já conheceu.

4,0

Sergei Bodrov tem demonstrado nestes últimos anos ser um autor de interesses bem definidos no que diz respeito ao campo temático que deseja trabalhar em seus filmes. Desde a infância um apaixonado declarado pela história e por seus mitos, o cineasta russo viu na rica quantidade de histórias destes pequenos países da Ásia em séculos passados, até o momento pouco utilizadas pelo cinema, uma forma de construir para si uma identidade de imediata assimilação. Bodrov, hoje, para o ocidente, depois de lançar em seqüência dois filmes sobre acontecimentos de grande importância histórica para países como Cazaquistão e Mongólia, é o homem dos grandes épicos orientais, fato que deve ser confirmado novamente com a já anunciada versão para a vida de Marco Polo que deverá filmar em breve.

Este Mongol, ou O Guerreiro Genghis Khan, filme que deu ao seu país de origem, a Mongólia, sua primeira indicação ao Oscar de filme estrangeiro, quando perdeu a estatueta para o também filme de época Os Falsários, é a segunda destas incursões investigativas de Bordov pelo campo histórico oriental na década. O objeto de estudo neste caso é a formação de caráter do conquistador e imperador mongol Genghis Khan, tido por especialistas como uma das figuras de maior importância do período das grandes conquistas e um dos principais ícones de seu país, reverenciado até hoje e considerado não apenas um herói, mas o pai daquela nação.

A proposta de Bordov, porém, passa ao largo de toda esta grandiosa história de conquistas construída por Khan durante sua estadia no poder. Mongol se concentra na infância e juventude deste ícone histórico, indo de encontro àquela fórmula já bastante utilizada de humanizar figuras até então vistas como intocáveis, superiores. O argumento, construído a partir de uma longa pesquisa realizada pelo diretor (que desde os anos 90 mantinha este como um de seus projetos de vida) em parceria com o roteirista Arif Aliyev, foi baseado no pouco que existe sobre a vida de Khan antes de se tornar o grande herói que é - a maior parte deste material produzida com registros posteriores à época, já que até hoje poucas evidencias do período foram encontradas.

Uma pena que esta ligação tão pessoal entre realizador e obra tenham resultado em um produto tão frio, duro e acomodado. Embora vendido como um filme diferenciado por retratar parte obscura, pessoal e emotiva da vida de Khan, Bodrov não consegue se desvincilhar das armadilhas que normalmente cercam estes filmes de temática histórica – sejam eles hollywoodianos ou não. Mongol é um filme raso, que se contenta em narrar, simplesmente, estas passagens misteriosas da vida do herói como uma espécie de livro ilustrado. É uma coleção de imagens que mostram, ilustram, mas não dizem, não remetem, não refletem absolutamente nada. Os esforços de Bodrov parecem estar muito mais direcionados a resgatar o maior número de informações obscuras possível e garantir a veracidade destas informações do que tentar captar e transmitir a essência, o peso e as conseqüências da ação, o que por fim acaba fazendo de Khan uma figura novamente desumanizada.

A grandiosidade do projeto, que foi filmado em dois períodos distintos e em locações reais, também contribui para este distanciamento afetivo. A equipe técnica formada pelo realizador é composta por várias figurinhas tarimbadas de Hollywood, e até mesmo aquelas que não possuem ligação efetiva com a produção em massa cinematográfica parecem contagiados pela máquina. Desde o roteiro, que segue à risca a cartilha de campos temáticos dos filmes históricos de Hollywood – há o sofrimento do herói, as intrigas familiares, o romance dificultado por adversários, a batalha comprada pelas intrigas pessoas, tudo muito bem dividido em esquetes que gradualmente evoluem e convergem em uma disputa épica e heróica – até a edição, que conta com a colaboração do premiado Zach Staenberg, de Matrix, Mongol é um filme burocrático e muito pouco imaginativo – basta ver, por exemplo, como as cenas de batalha são impotentes do ponto de vista visual, sempre conduzidas pelo básico jogo de plano americano/de detalhe, que dão a impressão de a mesma ação estar se repetindo indefinidas vezes.

A exceção à regra é a batalha final, para a qual, assim como em algumas outras cenas, basicamente as melhores de Mongol, a equipe recebeu a contribuição do diretor de fotografia russo Sergey Trofimov, de Guardiões da Noite. Substituindo o holandês Rogier Stoffers, de Escola de Rock, que não pôde retornar às filmagens depois da pausa realizada, Trofimov imprimiu vida às imagens com seu criativo trabalho de luz e alguns belos planos gerais da ação – a cena da tempestade próximo ao final é brilhante neste sentido, uma pena que, assim como as cenas de Khan com a mulher e o filho na montanha, a melhor seqüência por conseqüência do carinho com a qual são registrados aqueles poucos momentos de contato, algo que faltou a todo o restante, dura tão pouco. A presença de Trofimov faz um grande bem não apenas para a captura da imagem. Até mesmo a edição, muito em virtude da beleza dos planos, parece ir em busca de soluções visuais mais expressivas nos momentos fotografados por ele.

Infelizmente são momentos isolados, e que, por parecerem comunicar sozinhos tudo o que o filme deveria transmitir em suas longas duas horas de duração, apenas evidenciam a falta de profundidade de todo o restante. Por ser um filme sem grandes batalhas, já que tem como objetivo apresentar o que existe por trás dos fatos; sem grandes cenas de afeto, em virtude de a maior parte das seqüências em que existe o contato físico entre as personagens com maior ligação sentimental serem tão profundas quanto uma colher; e sem muitos detalhes que quebrem esta impressão de livro de história filmado, por ficar o tempo todo preso à ação, aos fatos, O Guerreiro Genghis Khan não conseque conquistar mais do que a antipatia.

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