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Críticas

Cineplayers

O bizarro em Lanthimos: Um olhar particular sobre relacionamentos.

7,5
Quando comentei Alpes (Alpeis, 2011), exprimi a bizarrice do cinema do grego Giorgos Lanthimos. Naquela ocasião, trouxe algumas considerações acerca de seu filme de relativo sucesso, Dente Canino (Kynodontas, 2009), e das características que eram similares a Alpes, referente às construções individuais de seus incomuns personagens. Sua filmografia é assinalada com filmes de estranhezas, tal como esse seu atual The Lobster. Aqui, ele incursiona em terras americanas. The Lobster é igualmente estranho e bizarro tal como seus anteriores, num misto de surrealismo amórfico e excentricidade que contagia. É cômico, além do mais. Lanthimos tem características notáveis e consegue emprega-las independentemente de onde filma. Para ele, as pessoas são estranhas. Em qualquer lugar.

A história apresenta um futuro distópico onde solteiros são enclausurados num local a fim de encontrarem um parceiro dentro de um determinado prazo. Se fracassarem, serão transformados em um animal previamente escolhido pelos mesmos. Qual o sentido disso tudo? A tradução do título da obra escancara uma decisão bem explicada em certo instante, durante uma entrevista. Tudo é metáfora. As relações humanas e os acordos que lhe regem são metaforizados em uma comunidade ordenada por regras estabelecidas, levadas ao espectador de forma confusa, desvelada em suas minúcias, em suas reminiscências que nunca são suficientemente claras, mas elucidadas em lapsos de loucura. Para o diretor, o mundo é um hospício. E nesse hospício, as representações são jocosas. 

Em facetas psicológicas, interesse óbvio da trama, temos um estudo do comportamento humano quando este se situa em diferentes ambientes. Não à toa, ambientes distintos são elaborados, cortados por uma narração em off que tem muito mais função do que simplesmente narrar os fatos que assistimos. Eles são analisados numa tentativa de enquadramento. 

Como o homem vive em diferentes meios? Seguimos David (interpretado por um burlesco Colin Farrell) sendo asilado nesse espaço juntamente a outras figuras bem, digamos, particulares. Chamo de particulares frente ao comportamento socialmente considerado normal que reconhecemos. Eu poderia emendar aqui e questionar: e o que é normal? E você leitor encerraria sua leitura me considerando aborrecido e pós-moderno. Então nessa visão (a)normal, o que importa para o filme é a quebra do modelo de naturalidade, dando espaço ao artificialismo das relações e das pessoas, quando estas estão sob controle de algo ou alguém.  

Somos seduzidos por toda a estranheza da trama. No decurso narrativo, é justamente ela que dá conta de nos manter atentos do início ao fim, curiosos sobre o desfecho desse universo enlouquecido. É aí que entra a habilidade de seu realizador, na forma com a qual conduz seu filme, orientado pela bizarria que consagra seu cinema enquanto cinema de autor. Os personagens são bem construídos e os diálogos favorecem o estigma criado. O tempo corrente parece encontrar uma cronologia própria, de forma que o ritmo torna-se afetado, não sendo arrastado, mas inconstante e mutável. É por isso que a experiência em assistir qualquer filme dirigido pelo diretor é destoada, para o bem e também para o mal. 

Nessa linha progressiva de inconstâncias reside sua originalidade inventiva que problematiza as relações e estabelece o caos. O roteiro metafórico está sempre trazendo possibilidades de surpresa, pois há muito o que se esperar de um universo assim. O roteiro raramente entrega algo de novo, o que não significa que não articule bem suas singularidades. Os personagens são bons. Os atores melhores ainda, especialmente por estarem fora de seus confortos. John C. Reilly, por exemplo, engrandece com seu tom cômico. O humor é marcante e englobado nas ações de seus personagens. Colin Farrell se deleita!  Rachel Weisz e Léa Seydoux, primorosas, extravasam com personagens desconformes.   

The Lobster propõe um olhar diferenciado sobre relacionamentos. Ele trata das similaridades e completudes que um enxerga no outro, entendendo isso como justificativa para uma saudável relação amorosa. Destaco a mulher cujo nariz sangra encontrando um homem que tem um problema semelhante. Ou não tem? É uma obsessiva e neurótica busca pela ternura de um afeto ideal. Uma intensa caça! Ei, uma caça a animais está no filme como uma alegoria extra, uma metáfora condizente a demanda de seus caçadores. Tanta devoção a procura por alguém que possa lhe dar sentido existencial é uma ilusão predatória. E esta ilusão é compartilhada pelos personagens de Lanthimos, em seu hospício inventado. A lucidez é variável. 

Comentários (1)

Victor Santos Lima | terça-feira, 17 de Maio de 2016 - 09:33

Caramba, tinha visto Dente Canino na época e não fazia ideia que era desse mesmo diretor. Agora me interessei mais por The Lobster.

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