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Críticas

Cineplayers

Um trabalho menor, mas ainda assim interessante do gênio Hitchcock.

6,0

Esse é um dos últimos filmes da fase inglesa de Hithcock (seu último dessa fase foi A Estalagem Maldita, de três anos depois), quando suas obras eram menores e, porque não, mais pessoais do que nunca. Um ano antes, ele acabara de dirigir o que é considerado seu principal e melhor filme dessa fase: Os 39 Degraus. Sabotagem não chega a ser tão interessante quando este último, mas é um filme menor do diretor que, embora limitado, já demonstrava muito de seu potencial. Afinal, Hitchcock ainda estava em constante crescimento técnico.

Sabotagem é uma adaptação do romance “O Agente Secreto” de Joseph Conrad, e fala sobre um marido e dono de uma sala de cinema (Anton Verloc, interpretado por Oskar Homolka) que está envolvido com criminosos – uma gangue de sabotadores internacionais – para tentar assustar a população da cidade de Londres. Um grande golpe está sendo tramado: uma explosão que mataria muitas pessoas. Mas um agente da Scotland Yard está em seu encalço, trabalhando disfarçado, e acaba entrando na vida da sua família através da amizade que faz com a esposa (interpretada pela atriz Sylvia Sidney) e o sobrinho de Anton.

O roteiro tenta criar suspense através da aproximação do agente disfarçado com a família, mas talvez tenha sido precipitado por entregar não só ao espectador a real identidade do agente, e sim para todos os personagens, incluindo mesmo Anton, o que diminui o nível de suspense. A cena principal é a sequência em que Anton, encurralado pelo agente e não podendo completar seu serviço pessoalmente, manda seu sobrinho com um pacote contendo a bomba para ser repassado para o destinatário final. É uma sequência bastante interessante, embora para os padrões atuais soe forçada e mesmo inocente, mas ainda assim Hitchcock tem o controle nas suas mãos e consegue criar momentos de tensão bem grandes a partir de uma situação tão simples. O resultado não só funciona como surpreende pela sua ousadia, o suficiente para ter sido banido na Finlândia na época de seu lançamento, por exemplo.

Fora essa sequência em especial, o filme mostra-se um tanto arrastado e sem ritmo adequado, o que é até natural e desculpável levando-se em conta a época dele, onde o ritmo das produções era muito menor do que agora, e os elementos que hoje são considerados bobos ou inocentes podiam ser vistos como sérios e tensos. Alguns diálogos podem ser considerados lentos e até mesmo desnecessários: o filme possui uma metragem bem baixa e ainda assim é cansativo em alguns momentos. Levando-se em conta esses pequenos pontos negativos, ainda posso recomendar o filme para os verdadeiros amantes do cinema e, claro, para os fãs do diretor, que poderão ver aqui e ali alguns momentos que exemplificariam o porquê, na década seguinte, do diretor alcançar repercussão mundial, trabalhando já nos Estados Unidos.

Hitchcock voltaria ainda muitas vezes a tratar do assunto crime, conspirações e atentados envolvendo pessoas comuns. O Homem que Sabia Demais, Intriga Internacional, Correspondente Estrangeiro e Festim Diabólico são outros exemplos que possuem algum desses temas, mas agora tratados com toda a pompa dos filmes de Hollywood: grandes orçamentos e atores e atrizes famosos. Outro ponto que deve-se destacar é a personagem feminina do filme: Sylvia Sidney. O diretor sempre se destacou pela escolha e direção de mulheres, já que elas geralmente têm papel fundamental em seus filmes. Aqui não é diferente: a simplória Sra. Vernoc logo vê-se suspeitando das ações do marido (influenciada, obviamente, pelo agente secreto) e quando o clímax do filme acontece ela vira a peça principal da trama, e seu final chega perto de poder ser dito arrebatador.

Já comentei antes aqui que o filme dá algumas pistas da imensa capacidade técnica do diretor, então vou desenvolver isso um pouco agora. Além da inteligência em conseguir criar tensão a partir de elementos comuns, Sabotagem demonstra um bom uso da câmera ao saber quais ações demonstrar e quando demonstrar as ações dos personagens na tela. Uma cena de assassinato que ocorre dentro do filme é quase genial porque o diretor consegue deixar o espectador em dúvida sobre o ocorrido até o momento perfeito da revelação, antes disso alternando planos dos rostos dos personagens que revelam apenas um pouco do que sentem, o suficiente para criar tal dúvida, então... PAH!! O assassinato ocorre quando pouco se espera. É o tipo de cena que cria descendentes de seu estilo até hoje: Shyamalan fez algo assim em A Vila, recentemente.

Em todos os seus prós e contras, Sabotagem é um bom filme do diretor, embora seja algo menos ágil e divertido do que seu melhor pacote de filmes – esse ficaria em segundo plano na minha coleção. Possui alguns momentos de genialidade indiscutível, mas não o torna suficientemente bom para ser recomendado para qualquer um. Então, como já foi comentado, apenas os reais fãs de cinema e do diretor podem assistir para tirar prazer visual desse filme. O filme não foi um grande sucesso de público, e o próprio diretor dizia-se culpado pelo fato, justificando que realmente não reconhecia o filme como um de seus bons trabalhos. Acho que Hitchcock estava MEIO certo nessa afirmação.

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