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Poderoso Chefão: Parte III, O

(Godfather: Part III, The, 1990)
8,2
Média
1020 votos
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Críticas

Cineplayers

O encerramento sombrio e ambicioso da família Corleone.

8,0

Primeiramente, é obrigatório denotar a coragem e o risco de Francis Ford Coppola quando decidiu trazer, dezesseis anos depois, mais um capítulo sobre a odisseia sombria da família Corleone. O Poderoso Chefão chegou e se firmou quase que instantaneamente como um marco dentro do Cinema, apresentando uma gama de personagens de presença marcantes (como mencionar o título dos filmes e não lembrar imediatamente de Marlon Brando como Vito Corleone?), diálogos que entraram para o hall imaginário do público (“I believe in America”) e uma história rascante que adotava fortemente temas como corrupção pessoal, redenção e o amor e valorização da família acima de qualquer coisa. Na sequência que viria dois anos depois, Coppola obteve total liberdade criativa e retratou, com um êxito sobrenatural, a ascensão de Vito Corleone no mundo da máfia (e que rendeu o primeiro Oscar de Robert De Niro) e a queda vertiginosa de Michael Corleone (Al Pacino) em seu próprio poder. Ao encerrar estas duas primeiras partes, o próprio Coppola afirmou que aquilo que havia para ser dito sobre a família Corleone já havia acontecido, o que causou um furor quando o diretor voltou atrás e resolver construir um novo complemento para a história.

O resultado foi uma grande divisão de opiniões sobre a relevância de O Poderoso Chefão: Parte III. Talvez não seja exagero afirmar que uma grande maioria aponta este terceiro e derradeiro capítulo como uma adição desnecessária, que ao não conseguir se equiparar aos seus outros dois irmãos, não consegue justificar sua existência. Ledo engano. O Poderoso Chefão 3 é claramente uma adição essencial bem-vinda para o que já fora mostrado por Coppola anteriormente, onde o diretor resgata com maestria o espírito indócil e rebelde dos rostos que já conhecemos, coloca novamente em debate a questão da valorização familiar, e nos traz um Michael Corleone em busca de sua própria redenção pelos pecados acumulados no capítulo anterior.

De fato, O Poderoso Chefão 3 talvez não seja o mais ambicioso da trilogia, mas é certamente o mais corajoso. Já numa idade avançada, Michael segue lutando firmemente para a legalização de seus negócios, desta vez envolvendo seu nome com a própria Igreja Católica (o roteiro, inclusive, é capaz de envolver a misteriosa morte do papa João Paulo I), que após uma enorme doação, confere a ele um dos títulos mais importantes que a igreja pode oferecer e o controle majoritário de uma importante empresa controlada também pela igreja, o que irá despertar a ira dos interessados em derrubar sua majestade. Neste meio, ele encontra dificuldades para se relacionar com seu filho Anthony (Franc D'Ambrosio), que deseja ser cantor lírico ao invés de advogado, e uma ainda amargurada Kay (Diane Keaton). Em contraponto, Michael mantém uma relação saudável com sua filha Mary (Sofia Coppola), ao mesmo tempo em que a vê se aproximando intimamente de Vincent (Andy Garcia), filho rebelde e impetuoso de Sonny, irmão morto no primeiro filme.

A amargura de Michael é o que move a narrativa de O Poderoso Chefão 3. Sendo este um capítulo sobre redenção, os roteiristas Mario Puzo e Francis Ford Coppola visam trabalhar em cima da sombra de culpa que paira sobre Michael devido a todos os seus pecados acumulados. O personagem precisa, mais do que nunca, lutar para manter a estrutura de sua família, seja ela emocional ou monetária. Este sempre foi um dos principais pontos do retrato de Coppola sobre a Máfia: o amor aos familiares e seu apego a eles é motivo mais do que suficiente para que o indivíduo, independente dos resultados, sacrifique a si mesmo e justifique qualquer tipo de ação, mesmo que sangue inocente precise ser derramado. Coppola continua acentuando com brilhantismo esta característica obscura e amarga dos personagens, especialmente nos momentos em que vemos um Michael Corleone afundando em sua cadeira, mergulhando nas sombras, onde a fotografia do mestre Gordon Willis ajuda a configurar esta realidade sufocante que cerca os Corleone.

Coppola também mantém a excelência na hora de orquestrar os momentos de maior tensão da bora, aqueles que exigem um certo nível de violência gráfica e realismo. O ritmo mais lento deste terceiro capítulo incomoda (sendo que é o que possui o menor número de núcleos para serem desenvolvidos), mas também funciona como um contraponto aos momentos explosivos de tiroteios e sanguinolência, que se tornam mais impactantes graças a esta narrativa calcada em passos um tanto vagarosos. Mas este ritmo contribui, em especial, para a fantástica sequência na ópera que marca o clímax do filme, muitíssimo bem orquestrada por um trabalho de edição que oscila com maestria entre o espetáculo e as tentativas em assassinar Michael Corleone.

A técnica dos filmes, aliás, também continuam sendo algo notável. Além da já comentada fotografia de Gordon Willis e sua importância na construção climática do filme, a música-tema de Nino Rota mais uma vez marca presença e encanta aos ouvidos, desta vez com algumas colaborações musicais de Carmine Coppola, pai do diretor. O trabalho de maquiagem é também excepcional e consegue envelhecer Pacino e Keaton, os principais veteranos da trilogia, sem que exageros tomem conta do rosto dos atores, evidenciando assim o sofrimento e o cansaço destas duas figuras após tantos anos de tragédias e conflitos. E a direção de arte é soberba ao recriar perfeitamente a década de 70 através de cenários tão suntuosos quando decadentes.

Ao encarnar um Michael Corleone vitimizado por seu passado e por sua já avançada idade, Al Pacino se apoia numa atuação mais contida, onde os pontos emocionais mais ricos se encontram em suas sutis nuances, o que não impede que o ator também demonstre domínio em seus momentos mais explosivos, como é o caso do diálogo após o massacre promovido por Joey Saza (Joe Mantegna). Diane Keaton finalmente ganha seu devido brilho como a ex-esposa Kay, que após anos de amargura, finalmente deixa aflorar todos os seus sentimentos durante o lindíssimo passeio com Michael pelas ruas Sicília. Talia Shire, mesmo com participação discreta, surpreende na pele de Connie, já conformada com as atitudes e a personalidade do irmão, chegando inclusive a incitar o sobrinho Vincent a seguir os mesmos caminhos. Andy Garcia, indicado ao Oscar de ator coadjuvante por este papel, não se destaca mas também não compromete na pele deste personagem, ao contrário de uma inexpressiva Sofia Coppola, que não consegue se sustentar em nenhuma das cenas que aparece.

Finalizando a trilogia com um dos momentos mais emblemáticos e doloridos da família Corleone (mais do que o assassinato de Fredo no filme anterior, por exemplo), O Poderoso Chefão pode não ter a mesma perícia narrativa dos outros capítulos, mas em nenhum momento pode ser apontado como uma adição desnecessária para a leitura trágica e poética de Coppola sobre seus personagens e o universo da Máfia. É um épico sobre a descida ao inferno e tentativas desesperadas em enxergar a luz novamente. E ao subir dos créditos, o espectador percebe que esteve diante de uma das mais poderosas histórias de amor e ódio do Cinema.

Comentários (15)

Rique Mias | sábado, 28 de Março de 2015 - 09:02

Filme mais subestimado da história! Nota 10,0 igual aos outros!

George | sábado, 28 de Março de 2015 - 09:53

Al Pacino devia ter levado o Oscar daquele ano

Lucas Souza | segunda-feira, 30 de Março de 2015 - 07:49

A atuação do Pacino não perde em nada para os capítulos anteriores e alguns estão até melhores, como Talia Shire na pele de Connie por exemplo, agindo agora como uma 'consigliere'... Keaton também está formidável... Aquele ano no Oscar como todos sabem quem merecia levar melhor diretor e melhor filme seria "Os Bons Companheiros"... Até GodFather III merecia, menos "Dança com Lobos"...

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