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Críticas

Cineplayers

Cada um por si e Deus contra todos.

6,5

Meus primeiros contatos com o cinema de Werner Herzog aconteceram com Meu Melhor Inimigo, famoso por mostrar a conturbada relação entre Herzog e Klaus Kinski - o ator que esteve presente nos melhores filmes do diretor, apesar de todos os problemas que causava -, e O Enigma de Kaspar Hauser cuja história tornou-se tão inesquecível pra mim que até criei uma maneira de adjetivar pessoas baseada nele. E a imagem que guardei do diretor foi o de uma força cinematográfica latente, aquele cinema que sabemos fictício, mas que nos traz mensagens tão reais que é impossível não levá-las embora pra casa.

Em O Sobrevivente, no entanto – e que chato dizer isso logo assim, de cara – apesar da força do filme estar personificada no personagem de Dieter Dengler (bem interpretado por Christian Bale), numa história em que o diretor pode novamente nos apresentar a um personagem que precisa adaptar-se a um desconhecido e hostil ambiente, trazendo para a superfície os instintos naturais que aprendemos a enterrar bem fundo dentro de nós, o que levei pra casa foi algo diferente do que costumei a associar a Herzog.

Esse longa tem sua origem num documentário de 1997 dirigido e roteirizado pelo próprio Werner Herzog, Little Dieter Needs to Fly, com uma versão para a TV alemã e outra um pouco mais longa que foi editada para o cinema. Baseada na história real de Dengler, um alemão que se tornou piloto da Força Área americana e em sua primeira missão importante foi enviado para bombardear o Laos, ainda nos inícios do que viria a ser a longuíssima Guerra do Vietnã, e acabou caindo com seu avião, sendo capturado e aprisionado por lá.

Como o próprio título em português sugere, e durante toda a ação por mais bizarras que parecessem as situações em que Dengler se metia minha mente sempre recorria ao título para lembrar que ele ficaria bem, o que quebrou um pouco o nível da expectativa e pode ter contribuído para essa minha crítica.

Falemos dos vários aspectos que o filme nos traz: como descever a interpretação de Christian Bale?

[pensando...]

Bale parece um ator de quem não se pode duvidar do gosto pela profissão. É daqueles que quebra os próprios ossos se for preciso, e isso é bonito. Em O Sobrevivente o vemos em diversas situações desagradáveis – que inegavelmente devem ter sido vividas pelo verdadeiro Dengler -, como ser arrastado no chão por alguns metros, amarrado apenas pelos pés ou ser mergulhado num poço estreitíssimo, com as mãos amarradas e tendo que se equilibrar pra manter a cabeça fora d’água. Além disso, é visível o emagrecimento paulatino do ator durante a prisão, ou quando depois de perdido no meio da floresta ele passa fome. Seu rosto vai afinando e se transformando como conseqüência da "febre da selva" que vai se apoderando dele.

E apesar de dizer isso e apesar de achar que foi realmente uma boa interpretação, algo nele não me convence. Resumindo, o que diria é que Bale tem amadurecido como ator, mas que isso é um processo que ultrapassa a imersão do "quebrar os próprios ossos". Espero que ele seja indicado pela atuação e um dia "chegue lá"!

A aura meio documental do filme é ponto forte e talvez uma característica da direção de Herzog, que sempre transita pelos dois gêneros, por vezes misturando as coisas. A ação ou os "problemas" vividos pelo personagem, a luta dele por adaptar-se às novas situações, como alimentar-se com vermes e cobras, demonstram essa força que exala dos filmes do diretor. Mas o fato de Dengler tentar arquitetar uma fuga para a noite do 4 julho me pareceu apelativa demais!

Parece verdade que Dieter sente-se muito grato aos USA pela chance de voar, um sonho que ele trouxe da infância, quando pela janela de seu quarto disse ter olhado nos olhos de um piloto enquanto sua cidade era bombardeada. Parece também que ao ser resgatado, ele realmente foi ovacionado daquela forma heroicizante que só os americanos sabem fazer. Mas apesar de tudo que passou e viu acontecer, o personagem não parece vacilar em nenhum momento em sua lealdade ao país. E isso me deixou um pouco confusa entre acreditar que essas atitudes tenham surgido espontaneamente do personagem real, sendo por isso transpostas dessa forma na narrativa do filme, ou se foi uma escolha do diretor-roteirista enfatizar essas coisas.

Então que minha opinião ficou dividida entre reconhecer o cinema de Werner Herzog em mais este filme e estranhá-lo ao mesmo tempo. É como se o considerasse tão bom quanto ruim, tudo ao mesmo tempo, com esses clichês de americanos-que-sobreviveram-ao-Vietnã que "engorduraram" um pouco a limpeza da narrativa.

Termino o texto com a melhor frase do filme: "para sobreviver você precisa esvaziar o que está cheio e encher o que está vazio". E talvez eu mesma devesse ter esvaziado o que tinha de cheio pra digerir melhor este filme. Por que vocês também não o assistem pra me dizer o que acharam?

Comentários (1)

Cristian Oliveira Bruno | sexta-feira, 22 de Novembro de 2013 - 15:19

Quem são os idiotas que escolhem os nomes dos filmes no Brasil??? O título tira a tensão do filme. Ainda estou na espera pelo \"naufrágio\" em O Naufrago......

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