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Críticas

Cineplayers

Apesar de esporádicos momentos "mágicos", este é apenas um clássico menor da Disney.

5,0

Peter Pan pertence a um grupo de filmes dos quais todos já conhecemos a história, mas raramente assistimos à obra de fato. Foi o meu caso, que assisti ao Peter Pan em live action, dirigido por P. J. Hogan, de 2003, e mesmo ao cultuado Em Busca da Terra do Nunca, de 2004, que conta a história de James M. Barrie, o criador da peça original sobre Pan, antes desta versão de Walt Disney. Faz um tempo que esta versão de 1953 recebeu uma edição em um belo DVD, e abriu oportunidade para a nova geração – incluindo a mim mesmo – assistir finalmente a uma das histórias mais populares de todos os tempos, sob a perspectiva de Walt Disney e de seu trio de diretores, Clyde Geronimi, Wilfred Jackson e Hamilton Luske, que utilizaram-se de um roteiro escrito a quase 10 mãos.

Infelizmente, esta versão animada é fraquíssima. Apesar da fama do personagem, o filme poderia ser colocado em um grupo secundário ou mesmo terciário de animações da empresa. Apesar do bom nome da peça teatral de Barrie, esta versão, pelo menos, é um dos piores filmes da Era de Ouro da empresa de Walt Disney. Com um ritmo bem fraco, não há muita excitação no filme, e toda a história é bastante aborrecida – salvam o filme da mediocridade total alguns diálogos inspirados e uma ou outra ocorrência visual. O vilão Gancho não é, de forma alguma, alguém a se temer, e em nenhum momento Pan parece realmente correr perigo, tornando os embates entre ambos cenas burocráticas – estão lá porque é uma espécie de obrigação haver uma batalha entre Pan e Gancho.

Outro ponto a se comentar é o fato de que a Disney sempre foi acusada, pelo menos informalmente, de explorar em seus filmes, para o terror de muitos pais, temas sexuais de forma subliminar. Não concordo com essa afirmação de forma alguma. Acho que o caso, pelo menos aqui, não é nada subliminar. Já havia feito comentário semelhante quando escrevi sobre Pinóquio (1940); assim como no filme do boneco mentiroso – e em um nível muito mais elevado agora – Peter Pan é recheado de tons sexuais. Eles estão incorporados de forma quase que totalmente explícita pela fada Sininho, que de graciosa nada tem: além de vestir roupas inapropriadas, de executar poses lotadas de sensualidade, o comportamento dela é absolutamente reprovável: para garantir seu lugar ao lado de Pan, por quem é apaixonada, ela é responsável, entre outras maldades, pela quase morte de Wendy. Enfim, é provavelmente o mascote menos “fofo” que a Disney já teve, embora seja universalmente reconhecido – erroneamente – como uma peça fundamental e positiva na jornada das crianças pela Terra de Nunca.

Para complementar as evidências relacionadas ao tom sexual do filme, mais tarde na história, Pan e Wendy visitam um grupo de sereias – loiras, lindas e cheias de curvas provocantes, obviamente – que também demonstram odiar Wendy, porque todas elas são apaixonadas por Pan. Enquanto as crianças podem não notar esses elementos sexuais no filme (hoje em dia, apenas crianças muito novas não notariam), fica óbvio para qualquer adulto a presença deles, o que, convenhamos, é algo de absoluto mal gosto. Alguns poderão me acusar de excesso de moralismo, ou pior: falar que não tenho o coração puro para enxergar a beleza do trabalho da Disney. Pois que seja, os fatos estão aí, basta não deixar-se levar pela pseudo-magia da empresa, e sim notar que os desenhistas do estúdio eram simplesmente pervertidos.

Deixando de lado Sininho e as sereias, o próprio Pan não é lá um personagem muito interessante: seu excesso de auto-confiança acaba transformando-se logo em arrogância, e o fato do personagem nunca sofrer perigo real algum (pois Gancho é um vilão excessivamente estúpido) faz dele um protagonista limitado. Apesar do filme ter feito bastante sucesso à época de seu lançamento, diz-se que o próprio Walt Disney não gostou de seu resultado, reprovando justamente o personagem de Pan, citando-o como alguém difícil de se gostar. Outro ponto negativo, agora tecnicamente, é a baixíssima qualidade de sua animação, que é muito inferior, por exemplo, à de Branca de Neve e os Sete Anões, um filme 16 anos mais antigo. A paleta de cores sem graça, tanto nas cenas de Londres quanto nas da Terra do Nunca, ajudam a justificar o adjetivo “aborrecido” que dei ao filme anteriormente.

Peter Pan não é um desastre total por utilizar elementos ricos em imaginação, proveniente da fértil mente de  Barrie. Apesar de mal desenvolvido ao extremo, cenas como as do esconderijo dos órfãos na Terra do Nunca (uma bagunça divertida) e o vôo do barco perto do final do filme mostram lampejos de qualidade que justificam a fama da história, o que acaba salvando um pouco a obra. Dentre os trabalhos mais antigos da Disney, é um dos piores, e definitivamente não é uma demonstração feliz da capacidade da empresa em encantar. Vale como curiosidade, talvez, mas não necessariamente para as crianças.

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