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Críticas

Cineplayers

Navegando por águas de salsicha.

5,0
Em 2003, Piratas do Caribe: A Maldição do Pérola Negra (Pirates of the Caribbean: The Curse of the Black Pearl, 2003) lembrava aqueles filmes matinês dos anos 40, 50, onde a ação era descompromissada com uma história que só fazia levar esquetes de ação com personagens carismáticos para a frente em busca de algum artefato lendário. Baseado em um brinquedo da Disney e lotado de rostos conhecidos do público, a fórmula fez tanto sucesso que imediatamente engatilhou duas sequências muito próximas uma da outra, lançadas em 2006 e 2007 que, apesar de faturarem na casa do bilhão de dólares, cansaram sua imagem por não terem o mesmo carisma e uma história fraca demais para a grandiloquência que a série tentou alcançar, deixando de lado aquele descompromisso que atraía a diversão. Em 2011 houve uma outra tentativa de resgatar Piratas do Caribe, mas o resultado foi a prova real de que Jack Sparrow precisava descansar.

Seis anos no hiato, chega aos cinemas Piratas do Caribe: A Vingança de Salazar (Pirates of the Caribbean: Dead Men Tell No Tales, 2017), uma tentativa de reaproximação com o material original e de decolar novamente a franquia, que embora acerte em alguns pontos, esbarra nos mesmos problemas dos episódios anteriores. A verdade é que esse novo episódio é exatamente o que você já viu antes na série, para o bem e para o mal.

Jack Sparrow (Johnny Depp) não goza mais do prestígio que tinha antigamente: sem barco e sem tripulação, vê sua sorte ir embora e o seu destino esbarrar com os jovens Henry (Brenton Thwaites) e Carina Smyth (Kaya Scodelario), que procuram, cada um por seus motivos, o lendário Tridente de Poseidon. É claro que ele será perseguido por um perigoso morto-vivo conhecido como Capitão Salazar (Javier Bardem), que anos atrás viu-se amaldiçoado por Sparrow e deseja vingança ocupando todo o mar com morte; o que tira da vida boa o Capitão Hector Barbossa (Geoffrey Rush), que irá atrás de Sparrow para encerrar esse pesadelo.

É engraçado ver como Sparrow segue como um catalisador de toda essa confusão: sua persona jamais está à altura da fama quando os personagens o conhecem pessoalmente, bêbado e desengonçado. Ele segue funcionando no sentido de ligar os pontos de toda a história, a maravilha da coincidência da fantasia, sem nunca ter uma função relativamente principal na trama, apesar de ser um personagem ultra desgastado; Depp faz exatamente as mesmas coisas que fazia há quatorze anos atrás.

É irônico também notar como a história exalta o papel da mulher, tão relevante na igualdade de gêneros dos dias de hoje, já que a personagem Carina é a única que consegue ler o mapa que leva ao Tridente, mesmo com toda a imagem de Depp abalada pelo recente caso de agressão à mulher. Deixando isso de lado, apesar de Brenton e Kaya serem atores competentes e bonitos, seus personagens jamais chegam à altura do que Orlando Bloom e Keira Knightley significaram anos atrás, e não é a toa que a trama tenta trazê-los de volta caso o casal principal não vingue. Sparrow nunca funcionou sozinho, e isso talvez explique porque os filmes anteriores, que focam nele como figura central, acabam sendo tão frágeis estruturalmente.

Já Javier Bardem, pra variar, faz um papel brilhante ao encarnar um Salazar perigoso e extremamente bem feito; não só ele como todo o trabalho de composição do vilão e sua trupe. O barco é muito bom e a maneira como parece abrir a boca como um tubarão nas batalhas é fantástico, assim como os corpos despedaçados e vazios de uma tripulação que não apenas viu a morte de perto como se tornou sua própria personificação. Esse espetáculo gráfico já era esperado, uma vez que era o principal atrativo dos filmes de 2006 e de 2007. O grande problema é que eles são usados mais uma vez como narrativa e não como ferramentas para auxiliar uma história, deixando novamente o filme visualmente 'verborrágico', pesado, gastando preciosos minutos entediando o público tentando impressioná-lo ao invés de investir no que faz de melhor, diverti-lo.

Esse excesso de cenas de ação estendidas deixa pouco tempo para o filme desenvolver sua história; algo que nunca foi o foco da franquia, e justamente por isso ela sempre foi tão fria e distante, apenas com uma diversão aqui ou ali oriunda de sua essência totalmente Sessão da Tarde. Deviam apostar mais nisso e menos na pretensão. A cena da guilhotina ficou bem bacana e criativa e a da âncora fecha bem o filme, mas acabam sendo exceções em um trabalho novamente longo e cheio de gorduras; a cena do casamento é constrangedora e inútil e o Pérola Negra, 'o barco mais veloz que já se viu', é facilmente alcançado logo depois, não honrando a própria lógica criada dentro do longa. A participação especial de Paul McCartney, apesar de gratuita, é divertida e bem vinda. Quando poderemos ver um Beatle bem humorado e como pirata? Se há algo de inesperado, é quando o filme arrisca uma poesia ao colocar Sparrow sentindo saudade do passado ao colocar o seu barco em miniatura contra o horizonte, como se ele estivesse navegando naquele gigantesco mar. O momento funciona.

É claro que a Disney fará a roda da fortuna que é a franquia girar outras vezes, só que esperamos que ela crie histórias à altura dos artefatos que quer reinventar, com personagens que funcionem e uma ação mais divertida e enxuta. Das cinco tentativas, apenas a primeira acertou o alvo, e talvez porque era novidade no mercado. Você já viu esse filme antes outras quatro vezes; se segue gostando deles, A Vingança de Salazar é para vocês. Eu cansei anos atrás.

Ps: há uma cena extra após os créditos.

Comentários (6)

Araquem da Rocha | sexta-feira, 26 de Maio de 2017 - 13:36

Só gosto do primeiro,que é ótimo.

Luiz F. Vila Nova | domingo, 28 de Maio de 2017 - 14:16

Gosto da franquia como um todo, mas concordo que os filmes foram decaindo em qualidade a cada nova sequência. O primeiro segue sendo o melhor da franquia. O segundo e o terceiro são divertidos, embora não tenham a mesma energia de outrora. O quarto tentou recuperar o tom escapista e inocente do primeiro filme, mas falhou ao apresentar um Jack Sparrow muito caricato e desgastado, embora tenha alguns momentos que salvam a produção. O quinto filme é ligeiramente superior ao anterior, com um vilão mais marcante, cenas de ação estilo matinê e um final nostálgico que é um verdadeiro presente para os fãs da franquia.

Kennedy | terça-feira, 30 de Maio de 2017 - 11:13

Ah, vai... Esse quinto foi bem melhor que o quarto e que o terceiro. Realmente, não há nada de novo. Mas nem precisava né. Lógico que tem os excessos do Sparrow que não são engraçados. Mas não achei a ação inchada não, pelo contrário, achei até que moderaram.

A cena da guilhotina, então, nem se fala. A cena de humor mais épica e engraçada do ano até agora.

O novo casal é legal, funciona dentro dos limites do filme. E melhor, é uma obra que não se leva a sério. Mas claro, ainda tá longe do primeiro filme em tudo (embora já tenha uns 7 anos a última vez que assisti).

Kennedy | terça-feira, 30 de Maio de 2017 - 11:14

Enfim, o que achei melhor tecnicamente foi a o som. Puta que pariu, tava tudo muito detalhado: águas pingando, velas balançando, o barulho da madeira dos navios, tudo ao mesmo tempo. Ficou de alto nível, a ponto de merecer indicações em premiações nessas categorias. Encontrar uma mixagem que aproveita bem as possibilidades de uma sala de cinema tá cada vez mais difícil. Ultimamente os mixadores vêm disfarçando muito suas limitações, e utilizam desarrazoadamente as caixas frontais e o subwoofer pra tudo.

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