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Críticas

Cineplayers

A boa premissa não é aproveitada, resultando em um filme fraco que acaba limitado às crianças.

4,0

Certamente você já viu esse filme antes. Em alguma cidade pacata do interior, jovens e adultos tocam as suas vidas tentando superar as preocupações diárias, como a carreira e o amor. Certo dia, sem qualquer aviso, chega à comunidade uma nave espacial, da qual desce um ser alienígena. Prontamente, o exército, provindo de uma base secreta responsável por manter o público alheio à existência de vida em outros planetas, cerca o veículo, enquanto inicia uma caçada para encontrar o alienígena. A criatura acaba por estabelecer amizade com os nativos, que o ajudam a voltar para casa.

Essa é a trama de Planeta 51, a mais recente animação a chegar aos cinemas brasileiros. No entanto, o enredo – a princípio, nada original – apresenta uma reviravolta interessante em sua premissa: o alienígena, na verdade, é um humano, que chega a um planeta que julgava estar desabitado. Algo como um E.T. - O Extraterrestre ao contrário, no qual a criatura acuada, na verdade, faz parte de nossa espécie e o menino Elliot assume a forma de um jovem verde, sem nariz e que não tem o costume de usar calças.

Não deixa de ser uma abordagem original. A trama criada por Joe Stillman acerta no início ao inverter as expectativas da plateia. Trata-se, de certa forma, de mais um filme situado nos anos 50 sobre uma invasão alienígena, com a única diferença de que, agora, a lógica é inversa. Pode-se vislumbrar as possibilidades criativas de tal ponto de partida, o que realmente poderia fazer de Planeta 51 uma história curiosa e certamente divertida. Não é o que acontece. Infelizmente, tanto o roteiro de Stillman quanto o trabalho de direção de Jorge Blanco são nulos de inspiração e tomados de preguiça, fazendo do filme uma obra totalmente enfadonha – ao menos para os adultos.

Na verdade, Planeta 51 seria mais bem recebido alguns anos atrás, quando animações de qualidade não surgiam com tanta frequência. Hoje em dia, porém, principalmente com o advento da Pixar, o gênero alcançou um status realmente artístico, conseguindo superar a limitação de falar unicamente ao público infantil para encantar da mesma forma – ou até mais – gente grande de todas as idades. Por isso, Planeta 51 não deixa de ser um retrocesso. Em uma época na qual as animações se tornaram obras de real valor cinematográfico, o filme volta no tempo, deixando de lado a qualidade narrativa para se preocupar unicamente em encher os olhos das crianças com um espetáculo visual.

E os pequenos, certamente, irão gostar do que Planeta 51 tem a oferecer. É uma produção esteticamente competente (ainda que nada além disso), com diversas cenas movimentadas, muito colorido e, claro, bonecos alienígenas. Porém, é só. A construção de qualquer conflito dramático é nula, tanto no que diz respeito aos personagens quanto no que concerne o desenvolvimento do relacionamento entre eles. Não há, por exemplo, qualquer espécie de base para a aproximação entre Chuck e Lem, o que faz com que a amizade entre os dois jamais convença a plateia. Tudo ocorre de forma rápida, abrupta e sem maiores explicações.

Com isso, do lado de cá, a plateia jamais consegue estabelecer uma identificação com os personagens. Nem Lem, nem Chuck, nem Nyra, nenhuma das criaturas vistas em tela desperta o mínimo interesse, fazendo com que a aventura que eles vivem se torne emocionalmente nula para o público, que assiste o que acontece, mas jamais se importa com aquilo. Difícil se empolgar com as cenas de ação quando se é indiferente ao destino daqueles personagens. Essa, uma lição tão básica para qualquer filme, parece ser completamente esquecida pelo diretor Blanco e pelo roteirista Stillman.

Da mesma forma, o roteiro ainda demonstra preguiça criativa ao não buscar novas ideias que poderiam ter gerado mais interesse dentro do universo criado. Fica até difícil de entender como Joe Stillman pode ser a mesma mente criativa por trás de Shrek, uma produção irreverente e repleta de sacadas originais. Em Planeta 51, o roteirista se limita a recriar uma pacata cidade dos anos 50, ao invés de explorar as possibilidades de que isso acontecesse em outro planeta. Ou seja, tudo o que os personagens do filme fazem é repetir o que a plateia está acostumada a ver em produções passadas na época, sem qualquer personalidade. O fato de ser uma espécie alienígena não faz a menor diferença.

Esta letargia vale também para outros aspectos de Planeta 51, dos quais o mais importante talvez seja a baixa qualidade das piadas. Se falha nos desenvolvimento dos personagens, era de se esperar que a produção ao menos proporcionasse momentos divertidos, o que não acontece. São poucas as cenas supostamente engraçadas que geram um sorriso e, quando isso acontece, ele é mínimo. As piadas não possuem inspiração e os diálogos são totalmente infantis, como: “Fique aí direitinho. Ou aqui seria esquerdinho?”. Claro que só é possível avaliar a dublagem, e não deixa de ser irritante que a empresa responsável pelo trabalho apele para gírias e expressões nacionais, perdendo a ideia original proposta pelo roteiro (“Pedala, meu filho!” é a frase que me vem à mente).

Além disso, as referências a clássicos de ficção-científica, que aparecem aos borbotões, também acabam soando gratuitas e inseridas de forma nada orgânica à trama, como ocorre no momento em que Chuck utiliza a clássica tagline de Alien, O Oitavo Passageiro: “No espaço, ninguém vai ouvir você gritar”. Como se não bastasse, o roteiro ainda não se preocupa em oferecer explicações para diversos pontos relevantes da trama, desde as verdadeiras razões da viagem do astronauta até os motivos pelos quais os seres verdes falariam exatamente o mesmo idioma que Chuck.

O que sobra, então? Para os adultos, praticamente nada. Planeta 51 é uma produção voltada única e exclusivamente às crianças, que ficarão deslumbradas com seu visual. Isso, no entanto, não significa que seja um bom filme. É uma animação ordinária, narrativamente desinteressante e sem qualquer sopro de criatividade. Em resumo, um planeta que está a anos-luz do que é feito no gênero hoje em dia.

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