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Críticas

Cineplayers

O que de fato aconteceria se um adolescente ganhasse poderes especiais.

7,0

Pense na seguinte hipótese. Você é um adolescente, que depois de ser picado por uma aranha, passou a desenvolver poderes anormais inexplicáveis. Sua primeira reação seria pensar em usar esse “dom” para combater o crime na sua cidade violenta, pulando de arranha-céus e salvando velhinhas indefesas das mãos de bandidos vestidos com roupas de borracha moldadas no corpo, certo? Não, errado. Na verdade, se você é um garoto em idade escolar e descobre que tem poderes tele cinéticos, seu primeiro impulso será levantar as saias de um grupo de meninas passando no corredor do colégio, ou arremessar contra a parede aquele cara insuportável que faz da sua vida um inferno. Sim, como podemos notar em Poder sem Limites (Chronicle, 2012), os super-poderes nas mãos de um típico adolescente americano renderiam histórias diferentes daquelas que vemos em filmes como Homem-Aranha (Spider-Man, 2002).

Poder Sem Limites tem propostas claras e bem diferentes do que estamos acostumados em filmes desse gênero. Suas escolhas narrativas e sua sinopse podem parecer batidas, mas na prática o resultado é outro. Primeiramente, é filmado no famoso formato popularizado por A Bruxa de Blair (The Blair Witch Project, 1999), onde os atores manuseiam as câmeras, resultando na constante trepidação das imagens, enquadramentos desfocados e ar de produção independente e barata. É um formato que, por mais interessante que pudesse parecer em 1999, com o tempo foi ficando tão desgastado e até banalizado, que atualmente seria difícil alguém usá-lo com algum propósito eficiente e fora do gênero de terror. Mas no caso de Poder Sem Limites, essa escolha não é meramente gratuita ou desnecessária; pelo contrário, é a grande sacada de toda a produção.

Andrew é um garoto impopular e cheio de problemas na família, que compra uma câmera para filmar seu dia a dia e descarregar seus desabafos – o que nos serve para entender a fundo seus problemas pessoais logo de cara. Sua vida monótona ganha outros ares quando, junto com dois colegas de escola, ele acaba se aventurando dentro de uma misteriosa cratera aberta no chão de um vasto campo. O que de fato acontece dentro deste lugar ele não sabe, já que não se lembra de nada ao acordar no dia seguinte em sua casa. O curioso é que depois deste ocorrido, Andrew e os outros dois garotos passam a desenvolver poderes tele cinéticos (podendo movimentar objetos apenas com a força do pensamento).

Há duas situações que se desenrolam deste ponto de partida. A primeira, mais leve e cômica, nos apresenta a adaptação dos garotos com seus novos poderes, que usam e abusam para se divertir (levantando saias de garotas, atacando objetos gigantes uns nos outros, assustando criancinhas etc.). O interessante é que, ao contrário dos filmes de super-heróis, os personagens de Poder Sem Limites não desenvolvem subitamente um patriotismo descabido e um senso de dever para com a sociedade que os motiva a combater o crime, nem nada parecido. Eles fazem exatamente o que qualquer adolescente faria nessa mesma situação – aproveitam e tiram o máximo de vantagens possíveis. E é dessa inconseqüente atitude de abusar do novo dom, que os rumos desta história passam a mudar. Nessa segunda situação, tudo vai ganhando um ar mais sério e violento, quando esses garotos se descontrolam e começam a apresentar um sério perigo às pessoas em volta.

A cereja do bolo vem neste momento, quando finalmente a escolha do formato de câmera na mão tomada pelo diretor ganha um sentido. Agora que nossos protagonistas têm o poder de mover objetos com a mente, não é mais preciso ficar carregando a câmera de Andrew para lá e para cá – ela simplesmente ganha vida própria sob a influência dos poderes de seu dono. A partir deste ponto os enquadramentos ganham maior enfoque, os ângulos de filmagem se tornam ilimitados e, de repente, podemos acompanhar todo o desenrolar da história através de pontos de vista indescritíveis, mostrando assim a capacidade do diretor Josh Trank em aproveitar e inovar ao máximo essa técnica que já havia perdido a graça há tanto tempo. No fim das contas, é uma escolha que não apenas enriquece o filme, mas também um recurso essencial para que a história atinja seu ponto máximo.

A dificuldade de todo jovem em assumir o controle das situações e saber respeitar seu próprio tempo é a grande lição latente por trás de toda a trama. O fato dos adolescentes da história possuírem poderes e não saberem como lidar com isso, só realça a idéia de que, de fato, é uma época complicada para lidar com tantas novidades e mudanças constantes (uma idéia trabalhada também, indiretamente, no super violento Kick-ass – Quebrando Tudo [Kic-ass, 2010]). Ao mesmo tempo, é a época para aprender a tomar o controle das situações da vida e deixar de ser levados por elas – quando finalmente aprendemos a tomar decisões e medir as conseqüências disso; o que, de uma maneira ou de outra, não deixa de ser um super-poder capaz de afetar todos a nossa volta. Afinal, a grande dificuldade de Andrew não era aprender a controlar seus novos poderes, e sim continuar tentando superar seus velhos problemas. E não é preciso ser um super-herói para entender e se identificar com esta situação. 

Comentários (5)

Leo | domingo, 04 de Março de 2012 - 18:50

fico muito legal mesmo, normalmente eu leio só um pedaço e depois paro mais nesse n li ate o final, uma de suas melhores criticas Heitor😁😁

Gustavo Hackaq | segunda-feira, 05 de Março de 2012 - 04:56

Heitor ahazando as usual. amei a crítica.

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