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Críticas

Cineplayers

O grande ponto do filme é exigir que seu espectador utilize ativamente sua imaginação. Sem ela, o filme perde a graça.

7,0

Ponte para Terabítia é um filme infantil da melhor estirpe. Conta a história de dois amigos, ele um menino (Josh Hutcherson, de O Expresso Polar) de classe média baixa com cinco irmãs que sonha em ser corredor, ela (AnnaSophia Robb, de Meu Melhor Amigo) filha única de um casal de escritores liberais e que corre mais rápido do que ele. São vizinhos. Juntos, constróem uma casa no meio do bosque (Terabítia) e imaginam estórias que têm relação com o mundo (muitas vezes difícil) da vida real. Essas estórias vão ajudá-los a superar tristezas e dificuldades do dia-a-dia, além de contribuir para o processo de amadurecimento.

Dirigido pelo húngaro Gabor Csupo (animador que dirigiu Os Anjinhos, aqui em sua estréia na direção, digamos assim) com bela fotografia do veterano Michael Chapman (antigo colaborar de Martin Scorsese), foi produzido pelos mesmos idealizadores de As Crônicas de Nárnia: o Leão, a Feiticeira e o Guarda-roupa, com o apuro visual conhecido – os efeitos visuais ficaram a cargo da Weta Digital, a empresa responsável por O Senhor dos Anéis e King Kong.

O que o filme e seus efeitos especiais apresentam de melhor é justamente o fato de não mostrar monstros e bichos ameaçadores logo no início. Vai sugerindo. Do gigante, vemos somente o pé. Das aves predadoras, ouvimos os gritos. De Dark Master, o maléfico conspirador, só vemos as sombras. Assim como nas crianças do filme, é necessário usar a imaginação para “completar” as cenas. Ou ainda, sem ela, não é possível sequer que o filme exista. Essa é a lição do filme: exercitar o uso da imaginação.

A escritora Katherine Paterson escreveu o livro que dá origem ao filme em 1976 depois da trágica morte de uma grande amiga de seu filho mais novo. A história é permeada por uma tristeza pungente e, como foi bem dirigido na tela, o resultado é comovente. Há uma referência à Crônicas de Nárnia, o livro, nas páginas de Ponte de Terabítia, quando a menina dá exemplo de obras que continham histórias de fantasia. No Brasil, Paterson foi traduzida pela badalada escritora Ana Maria Machado e tem outros três livros publicados no país pela editora Salamandra: Duas Vidas, Dois Destinos e O Mestre das Marionetes.

O filme não subestima as crianças. Difere realidade e ficção com sofisticação e mostra a dura vida de um casal sem muita grana para criar seis filhos. O menino recebe sermões e é chamado a ajudar na organização da casa. Sofre com a ausência paterna. Apaixona-se pela professora de música e apanha dos maiores da escola. Essa comunicação tão honesta com o público infantil talvez seja inédita nas telas, pelo menos no nível da franqueza. Chega até a incomodar um pouco, no bom sentido, em se fazer um filme para crianças tão triste e sério. Mas quando Terabítia, a terra mágica, começa a surgir (ela só se revelará por completo na última cena), nós os adultos céticos, já estaremos conquistados pela magia “realista” do filme.

Assim, nesse tom baixo adotado propositadamente pela direção e produção, não há cenas grandiloqüentes ou majestosas (exceto o final). Como tudo é usado com comedimento e senso de economia, o espectador é obrigado a procurar nas fissuras do que vai sendo mostrado onde está o significado para as cenas. É preciso imaginar, imaginar, imaginar durante toda a projeção de Terabítia. Um feito e tanto para o cinema atual, acostumado a mostrar cenas luxuriantes e custosas nas grandes produções de Hollywood.

Filmado na Nova Zelândia, o filme tem duas grandes cenas: a reconciliação do pai e filho – quando se revela o maior segredo da narrativa – e quando o menino resolve compartilhar Terabíta a sua irmã mais nova, uma implicante e ferina garota que se tornará a nova rainha da terra imaginária. É quando ele constrói a tal ponte do título. Impossível não se emocionar.

Csupo, o diretor húngaro, é formado em música e imigrou para os EUA em 1979, período conturbado da história do país, quando houve uma fuga de artistas (quem também terminou em Los Angeles na mesma época foram os diretores Milos Forman, tcheco, e o polonês Roman Polanski). Ele arranjou emprego na Barbera Studios. Fez parte da equipe de criação de Os Simpsons, em 1988, até que desenvolveu a idéia e ele mesmo dirigiu Rugrats - Os Anjinhos, um dos programas infantis mais populares nos EUA há mais de uma década. O filme do desenho foi feito em 1998 e foi o primeiro desenho animado não Disney a arrecadar mais de US$ 100 milhões.

Quem optar por ver o filme dublado, as vozes são do casal Rafael Almeida e Pérola Faria, o que pode sugerir um suposto namoro entre as personagens que não existe no filme original.

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