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Críticas

Cineplayers

Como cinema, fraco, não sustenta a força do romance de Eça de Queiroz.

5,0

Uma coisa é inegável. Sempre se soube que sendo boa ou ruim, a adaptação para o cinema, do livro de Eça de Queiroz, Primo Basílio, seria sucesso de bilheteria. E os motivos são vários: o livro é ótimo; a rede Globo a transformou em uma ótima minissérie; a obra faz parte da lista de alguns vestibulares do país; é leitura obrigatória nas escolas. Além disso tudo, o elenco global se faz presente. De qualidade muito questionável, o longa não chega nem perto de ser bom, entretanto também não é a bomba que poderia ser. Primo Basílio atraca em nossos cinemas com a certeza de retorno financeiro garantido, independente de sua qualidade.

A história se passa em 1958, em São Paulo. Luíza (Débora Falabella) é uma jovem romântica casada com o engenheiro Jorge (Reynaldo Gianecchini), que está envolvido com a construção de Brasília. Com a ausência do marido, a jovem se sente só, e acaba se confortando nos braços de seu primo, Basílio (Fábio Assunção). O pesadelo vira uma constante na vida de Luísa quando sua empregada, Juliana (Glória Pires), descobre as cartas de Basílio para Luísa, e resolve começar a chantageá-la a fim de garantir uma boa quantia em dinheiro para sua velhice.

Algumas mudanças são feitas em relação ao livro. A história é transportada de Lisboa para São Paulo, e os acontecimentos se passam quase na década de 60. Até aí, nenhum problema. Porém, o filme do diretor Daniel Filho, responsável por Se Eu Fosse Você e Muito Gelo e Dois Dedos D’Água, acaba por tirar toda a profundidade da história concebida por Eça de Queiróz, e a transforma em algo raso. A maioria de suas escolhas são erradas. Caso o diretor fosse outro, tudo poderia ser diferente, e o filme poderia funcionar melhor. O que dá folêgo ao longa de Daniel Filho é mesmo a personagem de Glória Pires, Juliana, possuidora de uma personalidade assustadora. Mas, mesmo assim, Juliana, no livro, é muito mais tirana e, por consegüinte, muito mais interessante. 

Deixando de lado as comparações livro-filme, que são, quase sempre, mais completos e interessante do que as adaptações para o cinema, Primo Basílio é um exemplar regular. Como cinema, ainda possui um pouco de caráter televisivo (leia-se novela), e aparenta ser, em algumas oportunidades, um genuíno dramalhão mexicano. O que é no mínimo estranho, já que o próprio diretor Daniel Filho foi quem dirigiu a minissérie O Primo Basílio, exibida pela rede Globo no fim da década de 80. O roteiro da série mostrou como transpor às telas, com competência, as páginas escritas por Eça de Queiróz. A minissérie é muito mais completa (e extensa) e muito menos comercial do que o filme. Mas, não adianta culpar apenas o roteirista Euclydes Marinho pelas falhas: como já disse, a direção não se mostrou inspirada.

Falando especificamente sobre o longa, além dos defeitos já apontados, como a semelhança com novelas e a superficialidade da adaptação, há ainda uma grotesca trilha sonora assinada por Guto Graça Mello. A musicalidade soa sempre artificial ao tentar conferir intensidade às cenas, sejam elas quais forem. 

Ninguém dúvida da competência de todo o elenco de Primo Basílio, mas, nessa adaptação, os atores estão fracos. A impressão é de que as escolhas foram erradas. Ninguém combina muito com seu personagem, a exceção de Débora Falabella que até consegue transmitir toda ingenuidade de Luísa. Glória Pires também não desagrada – mesmo com Marilia Pêra sendo inesquecível no papel -, talvez porque, estranhamente, sua personagem acaba sendo a mais engraçada. E isso é um erro brutal. Ao invés de sentirmos exclusivamente medo de Juliana, de repudiramos suas atitudes, no fundo, acabamos simpatizando com ela. Justamente, o contrário da intenção da obra. O livro quer que fiquemos ao lado de Luísa, mesmo depois de ela ter praticado o adultério. Entretanto, no caso do filme, queremos mesmo é que Juliana continue por cima para nos divertir com sua temporária “ascenção social”. 

Quem espera ver o filme como forma de substituir a leitura do livro, saiba que estará conhecendo os pontos mais relevantes da trama, mas de maneira muito superficial. E não se deixe enganar com algumas alterações feitas nesta adaptação, como local e século. Ou seja, se não estiver a fim de ler, vale mais a pena mesmo ver a minissérie global que, por sinal, será lançada em DVD ainda este ano.

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