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Críticas

Cineplayers

Pacto Sinistro às avessas.

6,5

Um dos maiores dilemas de sempre no universo do cinema é a descoberta da fórmula para cometer um crime perfeito. Afinal, as ficções tem essa vantagem de facilitar tudo na vida de seus personagens, de modo que nelas é até possível que ocorra tal crime. Só de pensar nisso, logo vem à mente a sinopse de um dos trabalhos mais geniais de Alfred Hitchcock, Pacto Sinistro (Strangers on a Train, 1951), no qual dois completos estranhos que se conhecem casualmente em uma viagem de trem combinam de assassinar um o desafeto do outro – um crime sem suspeitos. Se na lente do mestre do suspense essa premissa faz congelar a espinha, no caso do novo filme de Seth Gordon o foco é outro. Quero Matar Meu Chefe (Horrible Bosses, 2011) é uma brincadeira muito bem humorada do diretor em colocar seus personagens completamente inexperientes em uma trama perigosa de homicídios em massa.

Há um total de sete personagens importantes – os três amigos e seus respectivos chefes, além de um “personal killer”. Nick Hendricks (Jason Bateman) precisa agüentar diariamente as peripécias de seu patrão alcoólatra (vivido por Kevin Spacey), que parece estar sempre planejando sua desgraça na empresa; Kurt Buckman (Jason Sudeikis) é o subordinado de um cara nojento, Bobby Pellit (Colin Farrell, em caracterização impagável), que o coloca diariamente em situações desagradáveis e constrangedoras; e Dale Arbus (Charlie Day), assistente de uma dentista ninfomaníaca (Jennifer Aniston) que investe pesado em jogos de sedução. Depois de perderem por completo a paciência, eles se reúnem e começam a cogitar a possibilidade de “eliminar” um o chefe do outro, a fim de não levantar suspeitas. Para isso, eles contratam os serviços de Jones (Jamie Foxx), um cara que encontram no bar e que se diz expert no assunto, mas que na verdade é um belo picareta.

A proposta inicial é bem divertida e dinâmica, a começar pelas apresentações da vida que cada um ali leva no trabalho. Claro que, se tratando de uma comédia nesse estilo escrachado, tudo é corrido e forçado demais. As situações são todas exageradas, assim como a composição do trio de patrões infernais. Mas é exatamente nesse ponto que se encontra o maior triunfo da produção, que não se preocupa tanto em ficar jogando uma piada atrás da outra, e sim em colocar seus personagens em situações cômicas que por si só já valem o ingresso. O roteiro se aproveita da total inexperiência dos seus protagonistas, que nunca sequer pegaram em uma arma, para destilar um humor negro de qualidade, coisa rara no currículo de todos ali envolvidos.

A partir desse ponto, o que realmente prende a atenção do espectador é a ansiedade em saber que “fim levará” cada um dos chefes e como se sucederão os planos quando colocados em prática. Diferente do que se poderia imaginar, o roteiro se vale de várias pegadinhas e engana o público com relação ao destino de cada um ali, nunca caindo na previsibilidade e nem no politicamente correto.

O que vale a pena também é a pequena retratação que essa situação de eterno desafeto entre chefes e empregados significa agora em um país em estado de crise econômica, como é os Estados Unidos. Além do mais, o núcleo entre a dentista Julia Harris e o assistente Dale Arbus é uma grande ironia, ao apresentar a inversão de papéis entre o homem e a mulher no mercado de trabalho. Julia não é somente a chefe de Dale, como também uma predadora sexual sem nenhum peso na consciência, enquanto Dale é um cara correto e sensível que se mantém fiel à sua namorada sem graça apesar das investidas de sua patroa. Ou seja, ela assume aqui o papel que sempre foi designado aos personagens masculinos do cinema em geral, enquanto ele cai no clichê da moça casta e fiel – uma troca muito bem humorada e ácida que rende momentos hilários, em especial pela ajuda de uma Jennifer Aniston inspiradíssima, que finalmente conseguiu um papel fora de sua zona de conforto e mostra ao público o carisma perdido desde a época de sucesso do seriado Friends.

Colin Farrell é um caso à parte. Fugindo dos papéis de bom moço já há algum tempo, ele consegue aqui deixar de lado qualquer vaidade pessoal e mergulhar de cabeça na pele de Bobby, um viciado em cocaína, que transa com as mais baratas prostituas e que não tem o menor talento ou responsabilidade no comando da empresa deixada por seu pai (vivido por Donald Sutherland). Para ajudar em sua interpretação veraz, ele conta com um penteado vulgar que com certeza arrancará muitas risadas por si só.

Por último, Kevin Spacey também merece um grande destaque, principalmente por se mostrar muito à vontade em seu papel (nota-se a diversão do ator em algumas passagens). Mas, se for para analisar a competência do trio de vilões, surge um grande desfalque em relação aos protagonistas. Não que Jason Bateman, Charlie Day e Jason Sudeikis estejam mal, mas Kevin, Jennifer e Colin são atores muito mais experientes e queridos pelo público, além de terem pegado os personagens mais divertidos. Enquanto os primeiros se esforçam arduamente em manter a graça do filme do início ao fim, os três últimos conseguem naturalmente chamar a atenção e arrancar boas risadas. Jamie Foxx, como coadjuvante de luxo, deita e rola na pele de Jones e rouba a cena toda vez que aparece.

Tudo bem que não se trata de uma comédia espetacular, mas Quero Matar Meu Chefe está acima da média e consegue com méritos se manter politicamente incorreta do início ao fim, ao contrário de muitas outras que sempre acabam sucumbindo ao moralmente aceitável em seus momentos finais. A forma como o diretor usa o clássico de Hitchcock como referência, além do entrosamento do elenco, é fenomenal e se mostra o ponto mais forte do filme, principalmente para aqueles que já tiveram a oportunidade de ver Pacto Sinistro para um efeito de comparação. Claro que não há como comparar a qualidade entre um e outro, até porque os gêneros são diferentes, mas fica mais delicioso de assistir quando entendemos a influência de um sobre o outro. De qualquer jeito, Seth Gordon mostra um talento apurado para as comédias escrachadas através desse trabalho e também prova ser um cineasta rentável em Hollywood, o que certamente garantirá futuros projetos seus pela frente. Basta esperar.

Comentários (3)

Vinicius Marins | domingo, 08 de Janeiro de 2012 - 01:07

Jeniffer Aniston como ninfomaníaca é coisa espetacular.

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