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Críticas

Cineplayers

Um filme que retrata muito bem uma sociedade jovem pós-moderna virada de cabeça para baixo e suas tendências.

8,0

Talvez, junto com ‘Titanic’, este filme venha a ser um dos que mais me sinto à vontade para comentar, pela enorme quantidade de vezes que o assisti e por, a cada nova investida, descobrir peculiaridades fantásticas na obra de Roger Kumble, que até mesmo hoje ainda prendem minha atenção.

Segundas Intenções’ é facilmente identificado como a película cult dos anos 90 que fez um estrondoso sucesso para o público em fase final da adolescência. Acreditem, o filme rapidamente fez sucesso nos EUA por incluir uma gama de atores em ascensão naquele momento e, quando saiu em DVD ao redor do mundo, só aumentou ainda mais o frisom.

No filme, Ryan Phillippe e Sarah Michelle Gellar interpretam um casal de meio-irmãos que, juntos, sorrateiramente controlam a vida social de muitos de seus colegas na escola preparatória de Nova York. Sebastian (interpretado por Ryan Phillippe) se vê como uma espécie de Don Juan, que sempre consegue suas mulheres (ou melhor, todas as mulheres); enquanto Kathryn (Gellar) gosta de se vingar de ex-parceiros íntimos e brincar com os novos calouros de seu meio. Um dia, o desejo de Sebastian acaba de explodir justamente para cima de Kathryn que seria, teoricamente, a única menina na cidade que ele não poderia ter. Então, em meio à toda excitação, os irmãos fazem um aposta: se Sebastian conseguisse seduzir a filha do novo diretor de sua escola (Reese Witherspoon), que havia até mesmo produzido uma matéria intitulada “Porque eu pretendo esperar até o dia do casamento”, ele poderia ter a irmã, do jeito que quisesse! Caso Sebastian não conseguisse completar seu objetivo, Kathryn ficaria com seu carro, lindo e caro, diga-se de passagem.

Antes de começarmos a deliberar sobre os aspectos técnicos, existem alguns pontos específicos que conseguem aos poucos retratarem o porquê do filme ter sido um sucesso e ter atraído uma legião de fãs. O primeiro desses pontos, como não poderia deixar de ser, é a nova gama de atores citados no parágrafo acima que encabeçaram grandes nomes na televisão norte-americana antes de partirem para o cinema. Para algum deles, “Segundas Intenções” foi mesmo uma estréia pra lá de notória. Ryan Phillippe, por exemplo, já havia feito até o presente momento filmes como ‘Eu Sei o que Vocês Fizeram no Verão Passado’ e ‘Studio 54’. Depois do filme de Kumble, Phillippe ganhou mais notoriedade ainda chegando até mesmo participar da consagrada produção ‘Assassinato em Gosford Park’. O personagem de Ryan é realmente muito intrigante e pessoalmente marcante. Sebastian é ao mesmo tempo chic, cult, bonito, sedutor, safado, tórrido e rico, muito rico. Resumindo, tudo que um adolescente um dia sonhou ou sonha e aspira a ser. E toda essa gama de características que cercam o personagem do ator torna-o ambíguo, e suas ações, imprevisíveis.

Já Sarah Michelle Gellar dispensa comentários. Famosa até dizer chega no meio teen pela audiência do seriado “Buffy: A Caça Vampiros”, a atriz também da um show de sensualidade e perversidade na película. Kathryn é a imagem e semelhança do irmão, numa versão um pouco pior e muito mais maligna. Impulsionada por seu espírito competitivo e criativo, Kathryn consegue tudo a seu modo. A forma de como Kumble mostra a “boa moça” vista pela escola como uma figura altamente perversa quando não está aos olhos do público, de certa forma, é uma critica ao comportamento dos estudantes de classe média/alta nos EUA.

Já a bonequinha de luxo que mais tarde viria a ser conhecida como senhora ‘Legalmente Loira’, Reese Witherspoon, estava com a carreira apenas começando quando deslanchou em “Segundas Intenções”. Antes disso a moça havia feito apenas o bom e interessante ‘Pleasantville – A Vida em Preto e Branco’ ao lado de excelentes atores como Tobbey Maguire e William H. Macy. Ingênua, bonita, dócil e passional, Annette Hargrove é um pote de pureza prestes a ser devorado. A menina é durante boa parte do filme tratada como um objeto, o que, de certa forma, dá um impacto maior ainda ao final da produção.

A película ainda conta com outros grandes nomes da cultura televisiva norte-americana como Selma Blair e Joshua Jackson (do seriado ‘Dawson’s Creek’). Passado esse primeiro ponto do porquê do sucesso do filme, chegamos à parte em que ele realmente começa a atrair não só o público jovem como o geral. O apelo sexual. E isso é com certeza um dos pontos fortes do filme, entretanto, sem partir para a vulgaridade. Kathryn e Sebastian “per se” são personagens que exalam a todo tempo sensualidade á flor da pele. Suas vestimentas, finas e chiques por parte de Sebastian, curtas e justas por parte de Kathryn, só ajudam ainda mais a reforçar isso.

Como diz o próprio subtítulo do filme: “In the game of Seuction, never fall in love”. Isso retrata bem o que é o filme, um jogo de sedução manipulado pelo par de irmãos. Claro, não poderíamos deixar de comentar também sobre a cena que mais chamou atenção do público na película. O beijo lésbico entre Sarah Michelle Gellar (Kathryn) e Selma Blair (Cecile); esse beijo acabou por não marcar apenas o filme, mas como toda uma geração que se formava ao final da década de 90. Bonito, real, ousado e absolutamente não menos vulgar, o beijo chegou a ganhar até mesmo prêmios como o famoso “sem-prestígio” MTV Movie Awards, em uma edição especial. Até mesmo em dias atuais você pode encontrar comédias pastelonas que ainda retratam, lembram e parodiam a famosa cena, como o filme ‘Não é mais Um Besteirol Americano’.

O terceiro aspecto que cerca o sucesso do filme diz respeito ao universo que cerca o mesmo. A obra do diretor Roger Kumble é uma adaptação aperfeiçoada em dias atuais do filme ‘Ligações Perigosas’ de Stephen Frears, filmado em 1988 com estrelas de alto escalão como Glenn Close, Keannu Reeves, Michelle Pfeiffer, Uma Thurman & John Malkovich. Os cenários, a riqueza, a direção de arte, enfim, tudo que cerca o universo no qual os personagens estão imersos é bem tratado e estilizado, como o quarto de Kathryn, por exemplo, que retrata bem sua personalidade gritante e sempre em conflito.

Claro que, por ser um filme voltado mais a um determinado nicho, é comum que você escute constantes reclamações da “critica especializada” no que tange as atuações dos jovens atores. Falácias. Assista ao filme sem preconceitos e deixe-se envolver pela história e seu ritmo. Os personagens são simples, porém envolventes. Alguns outros muito ingênuos, mas estão apenas fazendo sua parte no “jogo”.

Como não poderia faltar, o quarto item que embala o sucesso do filme, não poderia deixar de ser a belíssima (e bota qualidade nisso) trilha sonora de “Segundas Intenções”. Simplesmente uma das melhores de 1999. Logo na abertura do filme é tocada a musica do grupo “Placebo” que estourou nas rádios de todo o mundo impulsionado pelo filme: “Every You Every Me”. Aimee Mann, nome inesquecível que também participou da maravilhosa trilha de ‘Magnólia’, canta “You Could Make a Killin”.

É praticamente impossível falar de todas elas. Simplesmente fantásticas. Grupo Blur com Coffe & Tv. O Fenômeno Fatboy Slim com Praise You. O grupo Counting Crows com Colorblind e ainda The Verve com o “hino” do filme: Better Sweet Symphony. Uma musica mais linda que a outra, uma musica que caracteriza mais o filme em seu estilo e molda seus personagens de maneira mais sutil ou grotesca (de acordo com suas características) que outra. Infelizmente não irei citar todas as musicas aqui porque, afinal, isso é uma analise de um filme, não somente de uma trilha sonora. Mas se pudesse dar apenas um conselho, esse seria: Comprem. “Cruel Intentions Original Soundtrack” é uma trilha comercialmente tão forte e com nomes tão expressivos da música mundial que, ainda hoje, ao lado da não menos comercial trilha de ‘Cidade dos Anjos’ uma das que mais vende no mundo, cinco anos depois do lançamento do filme. Cinco anos!

Não há duvidas que o mérito de refilmar a película seja toda por parte de Kumble. Incluindo as modificações e inclusões que o mesmo fez no roteiro de Choderlos de Laços. Mas infelizmente parece que o sucesso do primeiro filme não acabou fazendo muito bem à cabeça do diretor. Pois o mesmo acabou por tentar fazer umas das continuações mais ridículas e medíocres que já vi em minha vida, um lixo, em outras palavras. Algo tão abominável que só é comparado em termos de fracassos seqüenciais a porca seqüência de ‘A Bruxa de Blair’.

Apenas concluindo minhas divagações sobre ‘Segundas Intenções’, gostaria apenas de ressaltar mais uma vez que a película é um filme que retrata muito bem uma sociedade jovem pós-moderna virada de cabeça para baixo e suas tendências materialistas e sexuais. Pertencer a uma sociedade como essa e, mais do que isso, fazer parte ativa dela, pode parecer um martírio para alguns, mas eu vejo como um privilégio. Afinal, como o filme mostra, há beleza visual e estética na tristeza e há sensualidade no cinismo. Difícil conciliar não? Pois bem, bem-vindo ao novo século.

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