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Críticas

Cineplayers

Milos Forman retorna à direção com um filme cheio de erros insuportáveis.

6,0

Sombras de Goya é um filme cheio de erros insuportáveis, sendo o maior deles a escalação de Natalie Portman para o papel principal duplo, de mãe e filha espanholas. O objetivo da obra é contar um pouco da história do pintor Francisco Goya, um dos maiores da história da arte, sem cair na cinebiografia de artista, que parece ter virado um subgênero em Hollywood, tamanha a quantidade de exemplares nos últimos anos. Em alguns momentos, o filme até consegue ser belo em alguns momentos, mas em seguida derrapa miseravelmente.

Começa engenhoso e criativo. Estamos na Espanha do início do século 18, o terror da Inquisição soterra a rica Espanha. Seus padres carrascos, ao verem as litografias de Goya, querem logo a condenação do artista. Um dos inquisidores (Javier Bardem) o protege pois, vaidoso, quer ser pintado pelo então maior artista da Espanha (Goya já era o pintor oficial do rei Carlos IV).

Enquanto isso, os inquisidores levam para as masmorras católicas uma jovem de família rica apenas por ela ter rejeitado carne de porco numa taberna, sendo acusada de judaísmo. O pai da moça recorre então a Goya para interceder com os carrascos e daí entra o pintor completamente falso, interpretado pelo sueco Stellan Skarsgard - Goya era praticamente surdo.

Mas a Igreja Católica via em qualquer judeu uma ameaça, recusa qualquer piedade em relação à moça, o que leva seu pai a atitudes desesperadas. O padre vai às catacumbas conhecer a moça torturada e termina por estuprá-la, gerando-lhe uma filha, menina esta que vai resumir um pouco a história da Espanha pós-Revolução Francesa: o prostíbulo da Europa.

Até aqui, é o que o filme tem a sensibilidade artística européia do diretor tcheco Milos Forman (radicado nos EUA desde a década de 60) aliado à perícia do roteirista francês Jean-Claude Carrière. O filme caminha elegante e refinado, com belas imagens, algum ritmo e diálogos razoáveis. Funcionam aqui tanto a produção esmerada do produtor Saul Zaentz (de O Paciente Inglês) quanto a direção de arte de Patricia von Braumeister. Destaque para quando o filme focaliza todo o processo de se produzir uma serigrafia, que tornou Goya não só famoso em seu país, mas em toda a Europa, em especial a França, então um caldeirão fervilhante que desaguaria na Revolução.

Juntos, diretor e roteirista tentaram contar um pouco da história da Espanha, da Europa, jogaram com filosofia libertária do iluminismo e principalmente contra todas as formas de submissão do ser humano, seja religiosa ou política, além de flertar com as pinturas de Goya, que foram transpostas para as principais cenas do filme. Daí em diante, o filme se torna um dramalhão insuportável, risível até.

Há excesso de melodrama na segunda parte da trama, uma atriz sem talento e careteira no papel principal, excessiva simplificação quando Napoleão entra na trama (afinal, só pinceladas para o público não se perder), de forma que Sombras de Goya definha e se apequena.

O cineasta Milos Forman tornou-se famoso pelo filme Amadeus, um dos melhores filmes dos anos 80, também biografia de artista, no caso de Mozart, e pelo superestimado Um Estranho no Ninho. Sua carreira oscila muito. Quando abandonou os filmes mais artísticos e enfiou-se na cultura pop, como quando fez outra biografia, agora do editor da revista pornográfica Hustler em O Povo Contra Larry Flint, fez filmes menores, no entanto não desprovidos de interesse. Foram filmes muito criticados e de bilheterias fracas, que sepultaram a reputação de Forman e provavelmente afastaram o público deste Goya’s Ghosts.

Quando solta sua enorme cultura e sensibilidade européias na feitura de seus filmes, Forman acerta em cheio. Quando opta por reducionismos massificantes, comete equívocos, como esses que soterraram Sombras de Goya.

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