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Críticas

Cineplayers

Mal conduzido, o filme é uma negativa na antes promissora carreira do diretor Mike Binder.

5,0

Admito jamais ter ouvido falar em Mike Binder até dois anos atrás, quando lançou A Outra Face da Raiva. Diretor e roteirista, Binder tem outros trabalhos no currículo, mas foi neste filme com Joan Allen e Kevin Costner que o cineasta chamou a atenção pelo talento em orquestrar a delicada combinação entre drama e comédia. Após este reconhecimento, Binder conseguiu mais espaço, inclusive com a oportunidade de contar com um grande astro como protagonista. O resultado, infelizmente, foi Um Cara Quase Perfeito, um filme irregular e significativamente aquém de seu esforço anterior.

Na obra, Ben Affleck intepreta Jack Giamoro, poderoso e bem-sucedido agenciador de talentos, casado com uma mulher maravilhosa. Apesar de sua vida quase perfeita, Giamoro acredita estar-lhe faltando algo, o que o leva a um curso com o objetivo de descobrir a si mesmo. Como resultado, começa a escrever um diário, ao mesmo tempo em que descobre a traição da esposa e os desejos de uma jornalista destruir sua carreira.

A Outra Face da Raiva podia estar longe de ser uma obra-prima, mas era um filme indiscutivelmente bem realizado, com um roteiro enxuto, boas atuações e uma direção hábil, que mantinha o aspecto cômico apenas como acréscimo à história. Em Um Cara Quase Perfeito, quase tudo vai por terra. Binder, dessa vez, não consegue encontrar o equilíbrio entre os gêneros, resultando em uma mistura artificial que jamais acha o tom certo e dispersa o espectador.

Um dos principais problemas do roteiro é a forma com a qual estrutura a história. Intercalando a narrativa principal com flashbacks, o cineasta dilui o foco de seu filme, inserindo tais cenas do passado de maneira descuidada. Um Cara Quase Perfeito é sobre um homem em uma jornada para se reencontrar. É sobre o agora, sobre o que ele faz para preencher o vazio da sua vida. Neste sentido, flashbacks já são desnecessários e tornam-se prejudiciais à obra, especialmente quando realizados sem acrescentar nada à história “atual”.

Da mesma forma, as subtramas nas quais o personagem se envolve jamais levam o espectador a acreditar que possam fazer Jack crescer. Seu relacionamento com Nina, por exemplo, é abordado de maneira incrivelmente superficial. Até a metade do filme, os dois dividem apenas três ou quatro cenas, falhando ao construir um relacionamento que é central à apreciação da obra. O mesmo acontece com a história envolvendo a “vingança” do caminhoneiro, completamente injustificada em suas proporções.

Como resultado, o arco dramático pelo qual o personagem passa jamais convence. Seu aprendizado não ocorre de forma gradual e fluida, mas aos pulos. É como se o roteiro perdesse oitenta minutos em piadas sem graça e dispensáveis para depois se dar conta de que precisava encerrar a jornada de maneira satisfatória. A solução foi forçar um final, mesmo sem apresentar motivos que levasse a ele.

E não é só o roteiro o culpado pelo fracasso do filme. A direção de Binder segue o mesmo caminho, sem jamais alcançar a sensibilidade que garantiu um bom resultado em A Outra Face da Raiva. Aqui, o espectador deve agüentar cenas realmente embaraçosas, como a que envolve o protagonista no dentista, e momentos dramáticos construídos de maneira preguiçosa pela falta de desenvolvimento das relações entre os personagens.

O diretor falha também na condução dos seus atores. Todos sabem que Ben Affleck não é a melhor escolha para papéis com forte carga dramática, mas o ator consegue se sair razoavelmente bem sob um bom comando (vide seu bom trabalho em Fora de Controle). Em Um Cara Quase Perfeito, Affleck foca a composição do personagem no lado cômico, deixando a jornada de auto-aprendizado de Jack Giamoro em segundo plano. Se o espectador seguir pela interpretação de Affleck, o personagem não muda nada do início ao final da obra.

Quanto ao resto do elenco, o único que se destaca é John Cleese, de longe o melhor que o filme tem a oferecer. Sempre com um timing cômico perfeito, o ex-Monty Pyhton rouba a cena como o professor do curso. Rebecca Romjin também consegue escapar do desastre, apesar de ter sua personagem prejudicada pelo roteiro (ou talvez seja o fato de ser tão linda que nem dei bola pra atuação).

Um Cara Quase Perfeito coloca em dúvida o talento de Binder, que despontou como uma boa surpresa há dois anos. Apesar de um ou outro bom momento e alguns diálogos e reflexões interessantes, o filme é exagerado, dispersivo e mal conduzido, com cenas que são verdadeiras torturas para o espectador. Uma pena, principalmente por ver uma possibilidade de talento não dar em nada.

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