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Críticas

Cineplayers

O talento dos protagonistas é soterrado por um material irregular e pouco original.

5,0

Muito provavelmente, quem ouvisse o nome de Zach Galifianakis até o ano passado iria se perguntar: “Zach o quê? Quem é esse?”. E não poderia ser diferente, afinal, mesmo com uma filmografia até certo ponto volumosa, faltava ao comediante norte-americano um sucesso que o apresentasse ao grande público. Pois esta virada na carreira veio com o hilariante Se Beber, Não Case (The Hangover, 2009), uma das melhores comédias a chegar aos cinemas nos últimos anos, com personagens carismáticos, cenas realmente capazes de despertar gargalhadas e, de quebra, a revelação do talento de Galifianakis. De lá pra cá, o ator se tornou presença constante em programas de comédia e já emendou uma série de projetos para o cinema.

O primeiro filme pós-estrelato de Galifianakis é Um Parto de Viagem (Due Date, 2010), comédia que marca a reunião do novo astro com Todd Phillips, mesmo diretor de Se Beber, Não Case. Se esta nova parceria da dupla poderia gerar expectativas, elas aumentaram exponencialmente com a presença de Robert Downey Jr., um ator cada vez mais interessante, no papel do coprotagonista. Infelizmente, Um Parto de Viagem fica apenas na promessa. Mesmo com todo este talento envolvido, trata-se de uma comédia irregular e apenas esporadicamente engraçada, na qual a história não funciona em seus objetivos narrativos e as piadas parecem requentadas de outras produções semelhantes.

A própria premissa do filme, aliás, já peca pela falta de originalidade, pois remete diretamente ao divertido trabalho de John Hughes, Antes Só do que Mal Acompanhado (Planes, Trains and Automobiles, 1987). Nesta produção, um executivo interpretado por Steve Martin tinha que aguentar uma longa viagem ao lado do inconveniente John Candy. Mais parecido com o que se vê aqui, impossível. Se o ponto de partida da produção já demonstra preguiça criativa, fica difícil esperar algo diferenciado do roteiro. Creditado a nada menos do que quatro pessoas, o texto oscila entre piadas realmente boas (ainda que fique a impressão de que boa parte delas seja resultado da improvisação dos atores) e outras constrangedoras e gratuitas.

Assim, o espectador é levado a acompanhar momentos de pura hilaridade, como a cena envolvendo o café ou a de certo costume de um dos personagens antes de dormir, mas também é apresentado a instantes dignos de um filme ruim produzido diretamente para a TV, como o inverossímil resgate no México e a tediosa briga com um deficiente. Cenas como estas últimas estão presentes em um número maior que o esperado para um filme com tanto talento envolvido – são situações nas quais a artificialidade das piadas prejudica a suposta graça, uma vez que tudo se torna mais divertido quando os acontecimentos parecem naturais, não forçados.

Da mesma forma, o roteiro busca fazer o espectador acreditar em uma ligação emocional entre os personagens que simplesmente não existe. O relacionamento entre Peter e Ethan segue o caminho esperado pelas regras hollywoodianas – o que no início é ódio acaba se tornando amizade –, mas não há um desenvolvimento satisfatório para a mudança de comportamento, tornando difícil a conexão do espectador com os personagens. Em determinado momento da trama, por exemplo, eles dizem que amam um ao outro, mas é uma revelação tão desconexa com o que havia sido construído até o instante que só resta à plateia questionar se realmente os roteiristas acreditaram se tratar de uma cena emocionante.

No entanto, os problemas em relação ao desenvolvimento dos personagens não param por aí. É difícil se interessar pela jornada deles quando o Peter Highman de Downey Jr. soa apenas como um babaca egocêntrico e mimado. Se, em situações específicas, o ator consegue destilar a atraente ironia na qual vem se tornando especialista (Tony Stark, alguém?), o seu personagem é o tipo de pessoa com a qual ninguém gostaria de conviver e que, na tela, torna-se apenas irritante. Como se não bastasse, seu companheiro também não consegue resultados melhores, uma vez que Ethan Tremblay parece uma mera reedição do personagem de Zach Galifianakis em Se Beber, Não Case. Além disso, o ator exagera em trejeitos que soam apenas gratuitos, como a forma afetada de caminhar.

Se os atores não estão em seus melhores momentos, Todd Phillips também não fica muito longe. O cineasta já provou ser capaz de orquestrar cenas engraçadas – não somente na produção sobre os quatro amigos de ressaca, mas também no divertido Dias Incríveis (Old School, 2003) –, porém, dessa vez, sua mão afinada para o timing cômico parece irregular, por vezes acertando em cheio e em outras alongando-se em cenas com nada a oferecer. Um Parto de Viagem, além disso, oscila entre momentos nos quais parece ter a coragem de surpreender e abordar o politicamente incorreto (quando Peter tem uma reação levemente exagerada com uma criança, por exemplo) e outros em que abraça a vida plastificada e artificial sempre retratada no cinema norte-americano (como no final onde tudo são rosas).

Dessa forma, Um Parto de Viagem jamais chega a ser um filme ruim, mas acaba por se revelar um exercício que parece inacabado, no qual, provavelmente, um pouco mais de esforço poderia gerar um resultado melhor. Sim, é possível encontrar algumas risadas ao longo da projeção e o elenco, por vezes, salva cenas que poderiam ser apenas embaraçosas. No entanto, considerando o pedigree dos envolvidos, era de se esperar coisa melhor.

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