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Críticas

Cineplayers

O filme não consegue nem encontrar o seu público – que já não é muito exigente.

4,0

Lançado em 2001, Velozes e Furiosos era um eficiente filme de ação. A obra de Rob Cohen não se destacava pela inteligência ou desenvolvimento dos personagens, mas era eficaz na apresentação da história e contava com empolgantes cenas de ação. A inevitável sequência, dois anos depois, não entregou nada disso, além de perder o carisma de seu protagonista. Em 2006, a série ganhou um pouco em qualidade ao mudar os personagens e o cenário, em um divertido filme passado no Japão. Agora, os produtores decidiram voltar ao princípio, reunindo os mesmos personagens da obra original em uma nova, mas decepcionante, aventura.

Escrito por Chris Morgan (O Procurado), Velozes e Furiosos 4 tem início com Dominic Toretto e sua namorada Letty de volta à ação. Ainda procurado pela polícia americana, Toretto continua aplicando seu talento na direção para assaltos em estradas, agora na República Dominicana. Quando descobre que a polícia está fechando o cerco, Toretto abandona Letty para se refugiar em outro país. É quando fica sabendo que alguém próximo a ele foi assassinado. Toretto, então, decide voltar aos Estados Unidos para descobrir o que aconteceu, e reencontra o agente do FBI Brian O’Conner envolvido na mesma investigação.

Sejamos francos: a série Velozes e Furiosos sabe qual é o seu público. A ambição dos criadores não é promover tratados sobre a natureza humana, levar o público à reflexão ou mesmo oferecer uma trama inteligente e capaz de surpreender. É sobre carros modificados, alta velocidade, hip hop e mulheres. Foi assim que a saga conseguiu sobreviver até aqui, sempre torcendo o nariz da crítica, mas fazendo a festa dos fãs. Para quem isso é o suficiente, Velozes e Furiosos 4 pode até funcionar. No entanto, é inegável que o filme é extremamente pobre em termos cinematográficos e a direção de Justin Lin pode decepcionar até mesmo os defensores da série.

O roteiro aproveita o fato de a platéia já conhecer os personagens para jogar o espectador direto na ação. E, nisso, não há qualquer problema – seria desnecessário perder minutos para apresentar Toretto, Brian e companhia. No entanto, o roteirista parece acreditar que esse conhecimento prévio já basta para a platéia engolir qualquer idéia estapafúrdia de desenvolvimento. O texto não se preocupa em estabelecer uma relação lógica entre os personagens, o mínimo que se pede para o espectador acreditar na história. Jamais fica claro, por exemplo, qual o sentimento de Toretto por Brian: os dois iniciam o filme em clima de hostilidade, mas poucos minutos depois estão jantando juntos, agradecendo a Deus pela amizade. O mesmo vale para Brian e Mia, cuja relação é tratada de maneira extremamente superficial – o momento em que eles se beijam é, provavelmente, a cena mais inverossímil de um filme repleto delas.

Enquanto isso, a trama propriamente dita é igualmente subdesenvolvida. Morgan e o diretor Justin Lin parecem não fazer a menor questão de encontrar algum sentido naquele enredo, pois o roteiro permanece repleto de furos – ou melhor, meras desculpas para que a próxima cena aconteça como eles querem. Afinal, como funcionava a operação de Braga? Por que ele precisava de pilotos como aqueles? Só para correr no deserto? Será que um grupo de carros modificados correndo pelas ruas não atrairia mais atenção da polícia? Por que os traficantes mataram os pilotos anteriores? Por que Toretto voltaria para casa após uma operação que deu errada, com toda polícia atrás dele? Não seria o primeiro lugar a procurar? Essas são apenas algumas das perguntas que surgem no decorrer de Velozes e Furiosos 4, tornando o filme uma mera coleção de imagens, e não uma narrativa coerente.

E apreciar a obra se torna ainda mais complicado com um grupo de atores como esses. Mesmo que não tenham material para compor personagens mais ricos, o elenco falha miseravelmente, a começar por Paul Walker. Com o carisma de uma porta, Walker é um caso inexplicável de ator sem talento e qualquer forma de conexão com a platéia que Hollywood insiste em tentar transformar em astro. Jordana Brewster segue o mesmo caminho, com capacidade dramática limitada, ainda que tenha a beleza a seu favor. Já Vin Diesel, que demonstrou imenso carisma e presença de cena no primeiro filme, surge em Velozes e Furiosos 4 sem qualquer apelo. O ator parece interpretar com preguiça, grunhindo todas as suas falas e sem expressão – exceto quando quer fazer cara de mau, quando utiliza biquinhos ridículos. Na verdade, a atriz mais interessante do filme, Michelle Rodriguez, é a pior aproveitada, descartada logo no início, ainda que também deixe a desejar em uma conversa com Diesel na beira da praia.

Mas Velozes e Furiosos, se analisarmos dentro daquilo a que se propõe, poderia dar certo se ao menos oferecesse ao público aquilo que ele espera. No entanto, nem isso o cineasta Justin Lin consegue fazer. Tudo é em menor escala do que nos filmes anteriores, além de parecer mera reciclagem. A melhor cena de Velozes e Furiosos 4 é, exatamente, aquela que abre o filme, apesar de ser uma variação daquelas já vistas no primeiro filme. Depois disso, há uma sequência decente de corrida passada no meio da cidade, e só. Muito pouco para oferecer à platéia ávida por motores e com a testosterona explodindo. Lin até coloca outra cena passada dentro de um túnel, porém, além de usá-la duas vezes, é difícil entender o que acontece e o diretor apela inexplicavelmente para a computação gráfica – por que usar CGI se o grande barato das corridas é ver o que os pilotos conseguem fazer?

E esse é o grande problema de Velozes e Furiosos 4. Tudo bem que o filme é um clichê ambulante, com roteiro pobre e sem qualquer originalidade. Mas ninguém que vai ao cinema ver uma produção dessas tem expectativas de assistir uma grande obra. Basta uma história decente, algumas boas cenas de ação e muitos carros, mulheres e hip hop que o filme certamente será um sucesso. Justin Lin, no entanto, não consegue nem agradar ao seu público – que, convenhamos, não é lá muito exigente. Um sinal de que a série já deu o que tinha para dar.

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