Saltar para o conteúdo

Críticas

Cineplayers

Uma artista e, que bom, nada mais do que isso.

7,5

Violeta Parra era, fora do Chile, uma figura quase esquecida. Mas sua personalidade, responsável pelo caminho artístico que trilhou, junto com sua ideologia de vida - e por consequência política - a tornaram importante para a história cultural daquele país. Aos poucos, essa importância se espalhou por países vizinhos, como o Brasil, e conquistou a Europa a partir da exposição de seus quadros no Museu do Louvre, em Paris.

Artista na concepção maior da palavra, Violeta dedicava-se principalmente à música. Contudo, isso não a impedia de criar também como tecelã, escultora, pintora e poetisa. Por isso, é facilmente identificada como referência no conceito de arte pela arte, sem reais fins mercadológicos – a não ser com o objetivo de levar a própria criação adiante. Violeta carregava em suas canções questões da cultura local do interior do Chile, com destaque para a indígena, parte de sua descendência. Ela, inclusive, lamenta o fato de sua mãe ter se casado com um homem branco.

O pai, por sinal, é figura controversa para Violeta. Ainda garota, ela mostrava profunda irritação com o uso que o pai fazia da música. E por isso, de forma birrenta, o atrapalhava em meio às suas espalhafatosas apresentações informais. O diretor Andrés Wood, entretanto, é elegante ao retratá-lo sem julgamentos, como se fosse capaz de atribuir a ele certa importância pela escolha da filha de seguir o caminho da música, seja por contestação ou dom. O pai aparece ora furioso, destruindo um ambiente com um violão, ora terno afagando Violeta nos momentos de raiva dela. Com apenas nove anos, de forma autodidata, ela começou a cantar.

Mas o filme é, para além do resgate histórico da carreira simples de Violeta, sobre vida e morte. Essa é a moral e a reflexão que permeia a história de ponta a ponta. Os pais partem cedo e ela fica com seus irmãos. Com uma irmã, aliás, começa a carreira artística até decidir seguir só. Depois, já mãe, perde um dos filhos ao deixá-los no Chile enquanto aceita convite para cantar na Polônia comunista. Violeta colocava a arte como o combustível de sua vida e por isso deixou os filhos para trás, sob cuidados de um pai relapso, a fim de apresentar a cultura chilena na Europa. Por lá, ficaria por dois anos, com passagens bem sucedidas pelo lado ocidental.

A morte, ainda presente no simbolismo do gavião e da galinha, também serve para representar a relação de opressores e oprimidos, este tema urgente na obra de Violeta. Geniosa e genial, ela aparece como uma mulher decidida e intransigente nas suas crenças. Acima de tudo, só tinha olhos para sua arte, estritamente local e histórica, a ponto de renegar a canção dos parabéns no ritmo exportado pelos Estados Unidos. Para ela, a cultura regional não pode ser apagada pela massificação da cultura dominante.

Em uma passagem que retrata bem a visão da elite chilena da época, meados do século XX, Violeta aparece como convidada para cantar em um encontro de uma sociedade masculina durante jantar com suas respectivas mulheres. A cantora é interrompida para que a refeição seja anunciada, ao passo que ela é convidada para comer na cozinha, longe dos anfitriões. A alta sociedade a via com extravagância, como um artista menor, e que, portanto, não poderia estar no meio deles – mas é politicamente correto aceitá-la, ainda mais se a Europa via qualidade nela. Violeta responde com esbravejos à situação.

Até por isso, segue a vida identificada com princípios socialistas, sem nunca abandonar suas origens e buscando jogar luz sobre os excluídos. A tenda La Carpa de La Reina, montada por ela, tinha esse caráter coletivo inclusivo, como espaço para propagação da arte tipicamente regional. Mas o posterior fracasso da iniciativa se junta à impossibilidade de estar com o segundo amor de sua vida, o também músico Gilbert Favre. Desolada, a morte aparece novamente no filme. Violeta não sabia como lidar com a solidão, seja artística, seja amorosa.

Violeta foi para o Céu (Violeta Se Fue a Los Cielos, 2011) adota uma estrutura não linear para narrar a vida e a morte da artista, com idas do presente narrativo ao passado histórico costuradas em perfeita harmonia, com a andança livre pelo tempo como ferramenta para dar significado, ou sentido, ao recorte do tempo presente da narrativa. Francisca Gavilán, registre-se, faz soberbo trabalho ao representar a cantora.

A figura de Violeta Parra precisava de um retrato eficaz, principalmente após a arte de esquerda ser sufocada por movimentos repressivos no Chile. A artista é considerada fundadora da música popular chilena e uma importante folclorista. Suas canções, contra o chamado sistema, são usadas hoje para embalar os movimentos estudantis chilenos. “Volver a los 17”, por exemplo, foi regravada por outra artista local conhecida pela crítica ao “monstro grande que pisa forte”, Mercedes Sosa.

Comentários (1)

Marcus Almeida | quinta-feira, 14 de Junho de 2012 - 10:31

Esse foi o vencedor do cine ceará, tenho curiosidade em ver.

Faça login para comentar.