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Críticas

Cineplayers

A realidade vista no filme pode estar mais próxima do que pensamos.

8,0

Jacobo (Andrés Pazos) é o velho dono de uma pequena fábrica de meias no Uruguai. Marta (Mirella Pascual, em uma das interpretações mais minimalistas e perfeitas dos últimos tempos) é sua fiel e silenciosa supervisora. Ambos vivem uma relação próxima, porém fria, demonstrada muito mais por sutis gestos e olhares do que por palavras, compartilhando uma rotina seca e insípida. Esta convivência melancólica ficará abalada quando Jacobo pede a Marta que se passe por sua esposa enquanto Herman (Jorge Bolani), seu irmão que vive no Brasil há muitos anos, estiver visitando-o para a cerimônia judaica de um ano de falecimento da mãe de ambos.

Um brilhante retrato dos efeitos do tempo e da solidão sobre as pessoas, o filme não poupa suas personagens da amargura e outros sentimentos menos nobres. O roteiro investe em estruturas de repetição que poderia tornar o filme enfadonho, mas só denota ainda mais o quão perecíveis são as vidas dessas pessoas. É como se as vidas de Jacobo e Marta fossem pesados fardos a serem carregados até a morte.

Já Marta se torna a personagem mais complexa da trama, principalmente depois da entrada em cena de Herman. O filme não apresenta absolutamente nada sobre sua vida ou seu passado, senão ela ser funcionária da fábrica. Ela acaba se transformando no vértice de um renegado triângulo formado pelos irmãos. Dá a entender ser apaixonada por seu patrão – e talvez por isso tenha aceitado participar da farsa, mas ao mesmo tempo demonstra estar se afeiçoando a Herman. Ou apenas tentando agarrar uma oportunidade qualquer que a vida lhe der para fugir de sua situação atual.

Dirigido por dois uruguaios, Juan Pablo Rebella e Pablo Stoll (este suicidou-se há pouco tempo, deixando em seu legado um outro filme, 25 Watts, que por aqui passou apenas em festivais), o filme consegue emocionar sem nunca cair em armadilhas fáceis ou resolução piegas. Com notável criação de uma atmosfera suja, decadente, é propositalmente esquemático e repetitivo, como a vida de suas personagens. Sem qualquer tipo de excessos, deixa aflorar sentimentos reprimidos – os sorrisos agridoces de seus protagonistas ao proferir ‘whisky’ para tirar uma fotografia são os mesmos que emolduram os espectadores ao término do filme. A realidade mostrada ali pode estar mais próxima do que pensamos.

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