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Críticas

Cineplayers

O limite entre a vida e a morte dos videojornalistas que cobrem Mianmar.

8,5

A liberdade de imprensa só pode existir em locais democráticos e a restrição à atuação de órgãos jornalísticos é o primeiro, senão o maior, sinal de que a liberdade individual e coletiva de um povo está sendo desrespeitada. VJs de Mianmar - Notícias de um País Fechado conta como um pequeno grupo anônimo de jornalistas se organizou para clandestinamente gravar e enviar para o exterior imagens do dia-a-dia em Mianmar . A ditadura militar do país é bastante violenta – jamais me arriscaria a chamá-la de "ditabranda" - e restringe qualquer contato de seus habitantes com o mundo exterior. Qualquer pessoa com uma câmera em mãos vira alvo preferencial da polícia militar, o que torna o trabalho dos que filmam o cotidiano do país ainda mais arriscado.

Na década de 80, Mianmar registrou protestos da população pelo fim da forte repressão, mas o resultado foi o massacre de três mil cidadãos. O país continuou sob forte intervenção dos militares e, em 2007, uma nova onde de protestos, liderados pelos monges budistas, contagiou o país. O filme conta a atuação desses repórteres de pequenas câmeras manuais durante todos esse anos de chumbo e como eles faziam para enviar suas imagens para todo o mundo, por vezes reproduzidas por emissoras mundialmente famosas como CNN e BBC. Se por um lado é instigante acompanhar o trabalho dos jornalistas, por outro é estarrecedor ver de tão perto a repressão violenta contra qualquer cidadão que se arrisque a protestar contra o governo.

Utilizando-se de uma trilha sonora pulsante, VJs de Mianmar narra uma história que conforme cresce em tensão, sufoca o espectador a ponto de tirar o fôlego. O mais importante é que a trilha não é a responsável por construir o clima de impotência e revolta diante das atitudes – o que seria desonesto em um documentário. A musicalidade só colabora para o clima pulsante do filme.

O trabalho dos videorrepórteres é admirável pela coragem e qualidade do material coletado, isso se for considerado os meios pelos quais são obrigados a exercer a profissão e a condição precária de filmagem que possuem. A estruturação da redação é simples, mas capaz de acabar com a paciência dos militares por sua eficácia. A comunicação entre os jornalistas se dá por meio de conversas on-line ou ligações telefônicas. Ser um profissional da notícia em países como Mianmar, e aceitar combater o regime vigente, é escolher viver ao lado da morte, em que um passo em falso, um olhar para o lugar errado, pode significar o fim da vida.

Assim, é fácil constatar que, por pior que seja o estado democrático em que se vive, o simples fato de estar nele e de ter as liberdades individuais e coletivas asseguradas pelo Estado, podendo receber todos os tipos de informação – independentemente da qualidade delas – criticar a política, a organização social e qualquer outro elemento que constitui o convívio em sociedade é uma conquista para ser valorizada.

O documentário é primeiramente um alerta sob o esquecimento do mundo para com Mianmar, que continua vivendo sob um Estado autoritário, e como a repressão militar é um crime contra a humanidade, evidenciando a importância do papel do jornalismo como instrumento para dar visibilidade social aos acontecimentos. Secundariamente, funciona como um alerta para a não aceitação de qualquer tipo de restrição às liberdades. E, por fim, como um recado pela valorização da democracia em países com livre circulação de informação e de opiniões. Um filme forte, bem narrado e que cumpre sua missão. Candidato real a melhor documentário internacional no É Tudo Verdade 2009.

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