É justo que já não havia mais um monte de alternativas para dar a um filme da saga Rocky Balboa roteiro fresco e original. Desde o início, com o longa dirigido por John V. Avildsen, o desenvolvimento em especial do personagem interpretado por Sylvester Stallone é que dava o tom e, por isso, fez enorme sucesso. O público se identificou. A partir de um certo momento, não havia para onde correr. Por isso, Rocky III já fora desprovido de uma história à altura, com um antagonista caricato e grosseiro em demasia. A insistência gerou o quarto filme, para lucrar, em que Balboa e Apolo Creed se juntam de novo.
Apoiado no tema da época (1985), Sly escreveu um roteiro atrelado à política, pois confrontava os EUA com a União Soviética durante a longa Guerra Fria. Até aí, a princípio, ok, um pouco de cérebro à saga, sem deixar as fascinantes lutas de lado, não faria mal. O problema é que o discurso parcial gritante, em quase tudo, tratou o rival norte-americano como um povo sem alma, arrogante, entre outros maus adjetivos. Assim, tudo começou a ir por água abaixo. Será que Stallone não se importou, achou que precisava apelar ou não é capaz de discernir mesmo que o que fazia era um insulto à parte do mundo?
O fato é que Apollo resolve enfrentar Ivan Drago, a máquina soviética, sabe-se lá porque razão - não fica explicado logicamente a motivação que o tirou da aposentadoria após cinco anos desfrutando de sua fortuna. Rocky, então, com o famoso coração mole, embarca na ideia e passa a treiná-lo. Com golpes poderosos, o russo mata o ex-oponente do heroi, como previsto na sinopse, e dá partida à ira de Balboa. Apenas assim para, mais uma vez, demovê-lo da decisão de nunca mais lutar.
O ator sueco Dolph Lundgren parece mal saber pronunciar palavras em inglês, o que torna seu personagem tão caricato e hilário, por vezes, quanto Clubber Lang na versão anterior da saga. Ele se aproxima de um impiedoso assassino gigante, e não de um esportista em busca de seu lugar ao sol. Veja, tudo indica ter ajustado com o pano de fundo da feia propaganda, embora, para disfarçar, no fim Rocky "apazigue" o caso com falatório cansado e muito superficial.
Sem a música que embalou a série (Gonna Fly), o heroi segue para o gélido inverno do leste europeu, onde treina para a volta aos ringues. Até mesmo a cena da corrida, agora, tem novo estilo: escala, sozinho, uma montanha e, de seu cume, ergue os braços. Em termos de trilha sonora, só sobra Eye Of The Tiger - e ainda timidamente - entre as famosas. As outras canções, bem anos 1980, servem para enrolar os vários buracos na trama, que, se fosse enxugada, não teria nem 80 minutos.
Antes da entrada da maior delas, aliás, enquanto dirige seu carrão, há, me parece, uma das atitudes mais dissonantes com a postura essencial de Rocky: quando ele diz a Adrian, sua esposa, que morreria se fosse preciso no combate. Ora, Balboa tem uma esposa e um filho para cuidar. A honra do lutador está no coração dentro do ringue, não do modo como foi mostrado. Sly é limitado como ator, mas o personagem é tão ele mesmo que jamais ousou-se insiná-lo como se faz. Mas essa escorregada...
É uma pena que haja tanto vazio na obra, que, como de costume, sempre criava a expectativa de que seria muito boa como a primeira, de 1976. Mas não é só de aspectos ruins que o filme vive. Afora os problemas citados, os momentos de ringue são grandiosos, perto do nível dos dois primeiros filmes e a emoção de ver Rocky virando a luta aos poucos permanece legal. Frases como "Ele não é humano, é de ferro", dita por Drago, contrastam em boa sequência com "Ele não é uma máquina, é humano!", levantada pelo treinador do heroi, após um round de vantagem.
Além disso, há uma leve crítica à empáfia de Creed, que monta um circo para a disputa, achando que estava acima de todos e que o público só queria vê-lo em ação de novo, ignorando a preparação física e mental para o evento, que contou com James Brown e muita pirotecnia, o que surpreendeu e irritou ainda mais o "trambolhão" Drago. Depois de anos, equívocos perdoados (ou engolidos) à parte, a saga de Rocky Balboa se tornou clássica e Lundgren até abocanhou alguns papéis em Hollywood - é difícil crer! O clima geral, então, talvez salve a produção do fiasco total. Apesar disso, era inevitável pensar ao cair dos créditos: "Que venha o próximo!"
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