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Filmes de 2002

Durante a comemoração de 10 anos do Cineplayers, fizemos um especial bem bacana pegando todos esses anos de existência do site e os transformamos em listas.

De 2012 a 2003, cada editor escolheu um filme e falou algumas linhas sobre ele. Como cada um podia escolher apenas um filme, e não fazer uma lista de mais votados entre os editores (como os sites costumam fazer), abrangemos um maior número de gostos pessoais, desde filmes poucos conhecidos até unanimidades entre a maioria dos cinéfilos. Foram vários filmes sugeridos pela nossas equipe, que podem servir como uma espécie de guia para o que se assistir e o que você pode ter deixado passar sem querer com tantos lançamentos chegando ao mercado.

A ideia foi comprada pelos nossos leitores, que participaram ativamente de todas elas, comentando e citando faltas (que obviamente acontecem e acontecerão, já que é um número limitado de editores para tantos filmes), e que lamentaram muito quando chegamos ao fim do especial, pedindo sua continuação.

Pois bem, nós os atendemos. Segue abaixo a lista dos filmes selecionados em 2002.

Vale citar que a mesma regra foi utilizada, apenas um filme por editor e apenas algumas linhas para justificar suas escolhas (que nem sempre correspondem ao seu melhor filme, mas sim aquele que o editor quis falar algo a respeito).

Esperamos que curtam e, sim, iremos dar continuidade ao longo dos outros anos, até o nascimento do cinema, em ordem decrescente para não virar bagunça.

E se é novo e ficou curioso, porque não visitar as edições anteriores?

2003, 2004, 20052006, 2007, 2008, 2009, 2010, 2011, 2012.

Aguardamos a sua participação!

 

Adaptação, de Spike Jonze

Adaptação é um filme sobre o seu roteirista escrevendo o próprio roteiro de Adaptação. Se apenas a frase acima pode dar um nó na cabeça, imagine quando se acrescenta na mistura a busca por uma flor perfeita, Darwin e sua teoria da evolução e um fictício irmão gêmeo. Só mesmo Charlie Kaufman para conseguir dar sentido a essa possivelmente indigesta salada. Partindo de um bloqueio criativo verdadeiro – quando foi contratado para adaptar ao cinema o livro “O Ladrão de Orquídeas” –, Kaufman acabou realizando, ironicamente, um incrível exercício de criatividade, entrelaçando de forma deliciosa reflexões sobre sua própria insignificância, flertes com a metalinguagem, críticas a Hollywood e seus clichês, epifanias sobre a vida e muito, muito mais. Adaptação é o tipo de história que apenas a mente doentia de Charlie Kaufman seria capaz de conceber, e apenas Spike Jonze conseguiria traduzir em um longa que fizesse algum sentido. Uma obra original e inventiva, que solidificou a posição de Kaufman como uma voz única em meio à pasteurização do cinema norte-americano neste início de século.

- Silvio Pilau

 

Chicago, de Rob Marshall

Chicago foi o grande ganhador do Oscar em seu ano, com 6 estatuetas incluindo a de Melhor Filme e Melhor Atriz Coadjuvante para Catherine Zeta-Jones. Uma adaptação para as telas da peça antológica da Broadway tinha o grande desafio de transportar para os cinemas a mesma qualidade que o musical. Transformar uma obra bastante minimalista, com quase nenhum cenário, basicamente todos os atores sentados em cadeiras e se levantando para fazer seu número, em uma luxuosa extravagância, com figurinos perfeitos e uma direção de arte impecável, sem perder a essência. Rob Marshall, diretor estreante responsável pela missão, conseguiu provar para a Miramax que muitas vezes o caminho mais curto ao Oscar é simplesmente fazer um bom filme, como foi apontado na festa daquele ano. Também fugiu do efeito “Razzle Dazzle”, de fazer um filme estonteante, sem perder o conteúdo. Chicago conseguiu ainda, na esteira de Moulin Rouge, fazer o gênero musical ser “legal” novamente em Holywood. Desde então, entre sucessos e fracassos, todo ano tem pelo menos um. Os fãs de musicais agradecem.

- Felipe Tostes

 

Cidade de Deus, de Fernando Meirelles e Kátia Lund

Em época de UPP (Unidade de Polícia Pacificadora), as favelas cariocas se transformaram. Não só pela ação direta do policiamento comunitário, mas como resultado de políticas públicas mais amplas, das de transferência de renda às de geração de emprego e aumento real de salários. Não que esteja tudo bem, que a criminalidade sumiu, que não se ouve mais tiros. Mas o cenário já não é o mesmo de 2002, quando Cidade de Deus expôs com riqueza a dominação dos morros cariocas não só pelos traficantes, mas pela cultura da violência. Foi aquele dedo que, em vez de estancar o sangramento, abriu ainda mais a ferida a ponto de torná-la impossível de ser ignorada. É um cinema marginal, mas é também social. Aquele que registra para transformar. Um filme que contribui para o cinema, para a arte em geral e para a sociedade.

- Emilio Franco Jr.

 

Coisas Secretas, de Jean-Claude Brisseau

Levando em conta os cinco filmes que dirigiu entre 2000 e 2012 (incluindo o recente La fille de nulle part, ainda não visto, mas vencedor do último Festival de Locarno, num júri presidido pelo tailandês Apichatpong Weerasethakul), não seria exagero considerar Jean-Claude Brisseau o maior cineasta do século XXI (se a Nouvelle Vague sobrevive nesse novo século, então é pelas suas mãos e pelas suas lentes), com Coisas Secretas como o momento-chave no percurso do realizador francês. Seus filmes versam sobre as relações de poder, com o sexo como o instrumento que move os personagens dentro das disputas e manipulações às quais se entregam. Poucos filmam o sexo com tanto talento quanto Brisseau; enquanto os demais quando o tratam quase sempre ficam na superfície, Brisseau vai além, faz filmes densos, tortuosos, com personagens que descem até as profundezas, contemplam o abismo, com direito ao regresso para o troco final, por mais destruídos que estejam. Coisas Secretas no fundo trata da colisão entre a eterna luta de classes e os sentimento cristãos, com muito que dizer sobre o campo de batalha que são as relações entre os sexos, com um lado sendo vitima de outro que detém o poder, que abusa das circunstâncias, para logo em seguida livrar-se delas. Os filmes de Jean-Claude Brisseau são registros desse confronto, verdadeiras pelejas entre deuses e mortais, anjos e demônios, embates dos quais não se sai ileso ou impune.

- Vlademir Lazo

 

Dolls, de Takeshi Kitano

As três histórias de Kitano sobre o amor fogem de qualquer sentido clássico em matéria de narrativa e estética: Dolls é um filme completamente contemporâneo em sua estilização, cujas três histórias só tem entre si um tema de “amor imortal”, que torna seus personagens marginais, pouco psicologizados, porém ricamente explorados em sua relação com espaço e tempo, com atmosfera e com elementos extra-diegese. Inspirado no teatro de fantoches, Dolls foge da tradição realista, tipicamente da dramaturgia burguesa do Ocidente, para assim como conterrâneos seus como Ozu e Mizoguchi, investir nos elementos exclusivos cinema, investindo no lado plástico, na não-ação, na observação, nas histórias de sofrimento e devoção exploradas de maneira intesa em seu aspecto cromático – o vermelho do desejo, o preto do luto, a neve, as flores de cerejeira, o mar, o aspecto outonal. Kitano é um cinema que funciona por outra lógica, por outra estética, que recusa as amarras do storytelling para investir no aspecto temporal (a música, o tempo diluído) e visual-espacial (cores, composições em profundidade, movimentos econômicos de câmera), costurando um filme sensível em sua aparente simplicidade que logo se revela tão complexa em seus muitos pequenos detalhes. É, junto a Verão Feliz, um dos primeiros filmes que mostram a recusa de Kitano à inicial pecha de ator cômico e a fama de rei do cinema yakuza para, acima de tudo isso, ser uma das sínteses do cinema japonês dos últimos 20 anos.

- Bernardo D.I. Brum

 

Durval Discos, de Anna Muylaert

Durval Discos, ironicamente – talvez contraditoriamente, começa com um grande e movimentado plano sem cortes, por onde a câmera passeia livremente por vários minutos pelo centro da cidade de São Paulo. O filme, entretanto, tem uma abordagem retrógrada em vários sentidos – o que não deixa de ser interessante: adentramos no universo da venda de discos, bolachões em vinil, que ainda insistem em existir, tal como a extinta loja de discos. Tudo isso em cenas bastante quadradas e engessadas, com planos estáticos de longa duração, uma visão fixa e voyeurística do derradeiro destino do velho modelo do comércio de música, bem como do próprio Durval (Ary França), proprietário da loja que dá título ao filme. Durval Discos poderia ser considerado algo como uma espécie de Alta Fidelidade (High Fidelity, 2000) brasileiro. Mas é certamente mais do que isso. Não se trata de um filme sobre coleção de discos. Apesar de sua aparência simplória, sua monotonia, há uma densidade comovente na composição dos principais personagens. E, por meio do fim de uma era, chega-se a uma reflexão sobre aspectos intrínsecos a jornada individual, sobre a condição humana. As referências ao surrealismo no filme não são gratuitas. E, fora do filme, em 2013, o motivo da volta crescente da comercialização de discos de vinil, ainda que pequena, encontra sua resposta ali.

- Juliano Mion

 

Fale com Ela, de Pedro Almodóvar

Como dito pelo próprio Almodóvar, Fale com Ela “é sobre temas muito básicos do ser humano: solidão e comunicação”. Acima disso, há ainda os constantes conflitos amorosos sempre presentes em seus filmes, fora a relação pactual entre o sexo e o caos que sempre pontua seus trabalhos. A diferença é a opção de colocar em evidência o ponto de vista masculino sobre esses temas, embora não haja exatamente limites de gênero quando assistimos ao quadrado amoroso de Benigno, Marco, Alicia e Lydia, em que os personagens parecem assexuados (seja Benigno e suas habilidades femininas, sua delicadeza nata e sua inocência afeminada, seja Marco e sua incapacidade de conter as lágrimas quando diante de qualquer coisa minimamente bela, ou mesmo Lydia e sua praticidade emocional e sua profissão tipicamente masculina). Quebrando barreiras de gêneros, Almodóvar cria um dos mais belos filmes sobre o amor, a solidão e o poder da comunicação, em que os três sentimentos são colocados à prova quando os personagens não podem fazer nada além de conversar com suas parceiras moribundas. O carinho, respeito e cuidado de sua câmera em filmar Lygia e Alicia em coma, fora o curta-metragem Amante Minguante, mudo e em preto e branco, sobre o desejo nato masculino de se aventurar sobre o corpo feminino, colocam Fale com Ela na posição de melhor filme de Almodóvar, um dos maiores gênios do cinema contemporâneo.

- Heitor Romero

 

Femme Fatale, de Brian De Palma

A ontologia de cinema que hoje não passe por uma estética obscena e ao mesmo tempo destrutiva não faz a leitura real do momento que pretende compreender. De Palma não é um criador, este era seu pai (Hitchcock), e todo filho é parricida. Seu novo Passion remonta pela publicidade este parcial arte/decalque que em Femme Fatale era do fotógrafo, um duplo de artista e paparazzo, de corruptor e compositor da imagem, como o é o próprio cineasta; mercador que se disfarça de nobre. Femme Fatale e Passion, como já fizeram Abel Ferrara em New Rose Hotel, Dario Argento em Síndrome de Stenhal, Werner Herzog em Coração de Cristal, compõem uma teleologia do objeto “imagem”, suas formas de produção e de consumo. De Palma propõe tanto a imagem mortífera, do processamento rápido da publicidade, quando a fotografia de Laurie em um painel tirada pelo paparazzo desencadeia os eventos que culminam em sua morte, quanto a imagem limpa e benigna, retrato tirado pelo fotógrafo (desta vez artista) que vai não para uma vitrine na rua, mas completar um grande mosaico em seu estúdio, cena em que a luz (literalmente, mas também enquanto matéria-prima das artes do olho) salva a bela loura, desde sempre sua melhor amante em cena. Assim, Femme Fatale é tese de cinema, ensaio da Kulturindustrie e um dos filmes mais eróticos deste mundo.

- Luis Henrique Boaventura

 

Herói, de Yimou Zhang

Reviravoltas e flashbacks montam harmoniosamente a narrativa de “Herói”, cuja estética apurada com características orientais e artes marciais coreografadas enche os olhos dos cinéfilos com uma exuberância técnica fascinante. Também pudera, foram 30 milhões de dólares investidos nessa obra-prima chinesa. Essa estética, por sua vez, é apenas um atributo secundário. A história mítica traz distintos reinos rivalizando-se contra um tirano que visa conquistar sete reinos e finalmente unificar a China. Quando um assassino desconhecido e sem nome surge após ter derrotado poderosos líderes, a história toma um rumo através de uma jornada de caráter épico. Essa história é narrada sem que tenhamos absoluta certeza a respeito da verdade dos fatos discursados. Durante os atos, o ângulo de visão nos quadros diminui a medida que o herói vivido por Jet Li aproxima-se do imperador Qin, durante uma longa conversa que carrega o filme inteiro. A natureza em volta articula-se, compondo cenários bucólicos em cada momento declarado, fundamentando a tradicional expressão cultural local, absurda, porém bela. Quando Quentin Tarantino apareceu apoiando o filme e divulgando-o no ocidente, então muitos tiveram a oportunidade de conhecer uma autêntica obra de arte e reconhecer o nome do diretor Zhang Yimou.

- Marcelo Leme

 

Homem-Aranha, de Sam Raimi

Homem-Aranha é desses filmes que já podem ser chamados de novos-clássicos. Contendo algumas cenas inesquecíveis, como o já tão copiado beijo entre o Aranha e Mary Jane na chuva (uhulll!!), Homem-Aranha bateu diversos recordes de bilheteria e ficou marcado na geração que viveu intensamente o 11 de Setembro. Talvez justamente por causa da tragédia terrorista, o filme uniu fãs de quadrinhos e o público em geral e formou filas enormes nos shopping centers. A aparência ingênua de Tobey Maguire contribuiu para criar um Peter Parker divertidíssimo, com o qual o público comum poderia se identificar - Parker podia ser qualquer adolescente do seu bairro. Anos depois, vieram duas sequências, que apesar de terem feito sucesso parecido, não marcaram como o original, pois Homem-Aranha não foi muito sobre vilões e cenas mirabolantes de ação, e sim sobre a descoberta de um novo herói.

- Josiane K

 

As Horas, de Stephen Daldry

A riqueza de signos, simbolismos e temas em As Horas se estende do título por todo o filme, soberbo em rimas temáticas e visuais. Percebo, no entanto, que ao aspecto mais óbvio da interessante premissa de acompanhar um único dia na vida de três mulheres em épocas distintas (autora, leitora e personagem de uma mesma obra) poucos se atêm: o papel da mulher na sociedade em cada tempo – e o ideal de independência de cada uma dessas fortes personagens é, curiosa e dolorosamente, o propagador da profunda tristeza que elas também têm em comum. Virginia é modelo de proeminência nos anos 20, e vê sua emancipação – social, ideológica, intelectual – se esvair em decorrência de uma grave doença (algo tão banal e implacável que torna sua situação ainda mais dramática); Laura é vítima do “sonhado” American Way of Life dos EUA pós-Guerra, no qual a mulher é “alçada” ao posto de pilar independentemente de sua conformidade com tal posição (e o “baby boom” entre as décadas de 40 e 60 reflete bem a condição retrocessiva de reprodutora e dona do lar ao qual à mulher foi instintivamente subjugada); e Clarissa, Mrs. Dolloway do século XXI, é a mulher contemporânea, que precisa se dividir entre a competitividade do mercado de trabalho, a dedicação materna e o matrimônio – e quando ela falha enquanto esposa devotada (na concepção masculina), o que lhe resta é buscar compreensão e cumplicidade em outro colo – e, cada vez mais, isso significa se render a um colo feminino, ainda que isso não necessariamente redunde em genuína felicidade (como o amor não correspondido por Richard traduz).

- Rodrigo Torres de Souza

 

Longe do Paraíso, de Todd Haynes

Belamente fotografados por Edward Lachman, os personagens de Longe do Paraíso demonstram o quanto pertencem à época em que o filme se ambienta. Nos distantes anos 50, uma dona de casa vê seu mundo ruir ao descobrir que o casamento não passa de uma fachada e, ainda assim, é incapaz de colocar um ponto final a essa situação constrangedora. Falta-lhe, sobretudo, a coragem para assumir um fracasso e se aproximar como gostaria do jardineiro negro da família, com quem travar um simples diálogo já escandalizava o suficiente as amigas fúteis que marcavam presença em suas reuniões elegantes. Até ali, não havia escapatória ao alcance dos olhos para uma mulher como Cathy Whitaker, vivida por uma irrepreensível Julianne Moore, atriz que o Oscar esnobou em favor de Nicole Kidman, ainda que esta tenha vencido por méritos. O realizador Todd Haynes presta o seu encantador tributo a um dos mais conhecidos melodramas de Douglas Sirk (Tudo Que o Céu Permite), que Rainer Werner Fassbinder (O Medo Devora a Alma) já havia revisitado, e apresenta um tocante ensaio sobre aparências que escondem desejos sufocantes de almas entregues à agonia de querer.

- Patrick Corrêa

 

Minority Report - A Nova Lei, de Steven Spielberg

Sempre achei que o tempo iria fazer justiça a Minority Report – A Nova Lei, e colocá-lo entre os melhores filmes de Steven Spielberg (ele claramente me parece superior a obras icônicas e aparentemente intocáveis do diretor, como Contatos Imediatos do 3º Grau, Jurassic Park e O Resgate do Soldado Ryan), e, se me permitem, um dos grandes filmes da primeira década dos anos 2000 (Roger Ebert o elegeu o melhor lançamento de 2002, logo à frente de Cidade de Deus). Infelizmente, minha projeção não se confirmou. Mas é hora de se dar o devido valor a esta bela adaptação do conto de Philp K. Dick, que transcende o seu próprio gênero (característica comum aos grandes filmes) e coloca na mesa questões que, se permanecem atuais até hoje, eram ainda mais pertinentes na época do seu lançamento, menos de um ano após o atentado às Torres Gêmeas: até onde vai o direito de defesa dos cidadãos? As pessoas são mesmo inocentes até que se prove o contrário? A caçada ao terrorismo justificaria a tipificação da simples intenção do agente, antes mesmo que se iniciasse a ação criminosa propriamente dita? Um sistema que previsse e punisse a preparação do crime seria 100% confiável? Spielberg desenvolve estes temas por meio de um fio condutor eminentemente hitchcockiano (o falso culpado), sem espaço para sentimentalismos (a fotografia gélida de Janusz Kaminski ajuda), e com um trio de interpretações de primeira, liderado pelo melhor-ator-do-que-dizem-por-aí Tom Cruise (a parceria dele com Spielberg em Guerra dos Mundos já não tão feliz), um surpreendente Colin Farell, e uma excelente Samantha Morton. De quebra, o diretor estava em seus dias mais inspirados e nos oferece sequências que figuram entre as melhores de sua carreira, em especial, o crime passional que abre o filme, o  ataque das aranhas metálicas e a perseguição no shopping. É hora de dar uma segunda chance a Minority Report, o filme mais subestimado de Spielberg.

- Régis Trigo

 

O Pianista, de Roman Polanski

O Pianista nunca foi (e nem tentou ser) um filme tradicional de Guerra. Trata, sim, da Segunda Guerra Mundial, especificamente sobre o extermínio da Alemanha com judeus e sua tentativa de resistência, porém, é claramente uma terapia psicológica pelo que Polanski viveu na época; perdeu a mãe e uma irmã para os nazistas, além das humilhações sofridas pela família. Assim sendo, o diretor viu na história do pianista Wladyslaw Szpilman, não um combatente, mas um sobrevivente, a chance de superar os traumas de sua infância e recontar uma mancha inapagável para os seres-humanos. Em O Pianista não há combate direto, não há feitos heroicos. Não há raiva, inclusive. E nem vingança. Há, sim, uma imensa vontade de viver. É a intolerância trazendo dor, frio, fome e destruição. Ele apenas quer viver, tocar, deixar de ser um indigente escondido, um moribundo daquela situação. Quando os dois mundos inevitavelmente se encontram, a humanidade ressurge através de um piano, que faz com que as diferenças sejam esquecidas por notas quase enferrujadas pelo tempo e derrubam as diferenças ideológicas através da arte, da música, em uma cena linda de morrer. Ao mesmo tempo, um luta pela vida, enquanto o outro percebe o absurdo da situação. É justamente essa cena que resume toda a grandiosidade de O Pianista e traduz aquilo que o diferencia de filmes tradicionais do tema. Não é uma condenação, mas sim poesia em forma de imagem e som.

- Rodrigo Cunha

 

Sexta-Feira à Noite, de Claire Denis

Noite de sexta chuvosa em Paris. A paralisação do transporte público deixa as ruas intrafegáveis, congestionadas por filas quilométricas de automóveis. Em torno deles circulam pessoas sem tempo ou disposição para trocar olhares – ou, em casos mais extremos, que tratam grosseiramente uma mulher segundos antes de acariciar seu cachorro. O colapso da modernidade emerge em Vendredi Soir neste ambiente inóspito em que uma senhora transita à procura de pulsação e oxigênio – uma Paris em clima de canção dark de synthpop, filmada com cores desbotadas, umidade e reflexos de néons publicitários. O abundante uso de closes sugere à personagem uma solitária clausura rompida apenas quando abandona as ruas da cidade para visitar um quarto de hotel barato com o desconhecido com quem flerta na rua. Não sabemos quem são, o que fazem, o que desejam ou esperam do outro. A Claire Denis interessam apenas a nudez, os beijos e corpos entrelaçados. É na vitalidade do orgasmo que o filme atinge seu clímax, e o que antes eram barreiras, restrições de campo na imagem, converte-se em intimidade e sorrisos. Pois, diante das distrações e dos obstáculos do novo mundo, é na fricção dos corpos nus que ainda experimentamos o mais legítimo gozo, momento em que gritos de desespero emudecem frente a um pequeno gemido de prazer.

- Daniel Dalpizzolo

 

Sinais, de M. Night Shyamalan

Shyamalan ainda estava nos holofotes que o sucesso de O Sexto Sentido (seu melhor filme até hoje) lhe proporcionou e, em menor escala, Corpo Fechado, quando lançou ao mundo seu “suspense de alienígenas”. É deste filme para frente que o diretor indiano iria dividir a crítica e a audiência: enquanto muitos se preocuparam em criticar falhas no roteiro que não estão lá (por inércia interpretativa, talvez), parte da crítica se rendeu à genialidade do plot, e aos vários simbolismos que Sinais traz. Ou, simplesmente, se rendeu ao fato de Sinais ser um suspense do cara***. Shyamalan sabe (ou, dizer-se-ia hoje, sabia) criar engrenagens que montavam cenas de arrepiar os fiozinhos da nuca. E temos aqui um bom punhado de cenas inesquecíveis, como a do milharal. Dizem alguns que este é o melhor e mais maduro filme do diretor, e entende-se, pois agora com o apoio do estúdio (carta branca da Disney), Sinais é próximo do que um filme de gênero pode proporcionar.

- Alexandre Koball

Comentários (45)

Alexandre Marcello de Figueiredo | terça-feira, 02 de Julho de 2013 - 19:26

O filme "Durval Discos" eu já assisti e não gostei não. Tem certeza que ele deveria estar nessa lista?

Victor Ramos | terça-feira, 02 de Julho de 2013 - 21:16

Rafael, não necessariamente. O filme é sobre personagens comuns vivendo uma situação extraordinária, como bem diz a bio do Koball; e não sobre um mundo e a sua população - como um 2012, por exemplo. (Vale lembrar também que Shyamalan desenvolve o limite especial para construir boa parte do suspense.) Todo o desenvolvimento que ocorre com a narrativa tem peso na vida daqueles que nos são apresentados; o que importa para o filme está aí. O filme tem um enfoque em algo, e é isso o que importa. E mesmo que se fosse algo mais universal, algum foco o filme deveria ter. Ou seja, nada impede de existir uma relevância apenas para aquele pequeno universo, algo que não condiz conosco.

Renato Coelho | sexta-feira, 05 de Julho de 2013 - 23:20

Cidade de Deus e Minority, grandes filmes!

Lt. Dan | sábado, 06 de Julho de 2013 - 00:13

Prenda-me Se For Capaz, SdA: As duas torres e Star Wars EP2 fizeram minha alegria em 2002 😁

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