“E eu nunca me senti tão imerso em uma pessoa ao mesmo tempo em que estou tão desapegado de mim mesmo e tão presente no mundo”
(Albert Camus)
Mas Tony Kaye escancara que os problemas da sociedade hoje são ligados diretamente a criação dos jovens e a um mal que vem tomando conta do mundo: A SOLIDÃO. Sim, essa que nos afeta, que nos faz guardar nossos segredos, ao ponto de virarmos uma verdadeira bomba relógio prestes a explodir. É a solidão que nos deprime que nos enfraquece e que nos coloca o medo e nos tira sentimentos preciosos como amizade e compaixão.
E o que falar da loucura deste mundo de hoje? Que abraçar uma pessoa pode te colocar como suspeito de um crime grave, porém matar a sangue frio um animal é algo que parece rotineiro em nosso cotidiano. Que mundo é esse que o desapego parece ser hereditário? Que mundo é esse onde os pais estão mais despreparados que os filhos? Que não sabem decifrá-los, que não sabem orientá-los para o melhor caminho. Que mundo é esse, onde as pessoas que querem fazer algo para mudar parecem perder a esperança ao ponto de escolherem tirar suas próprias vidas de tão exaustos que estão delas mesmas?
'O Substituto' poderia soar cansativo pelo teor extremamente cru e pessimista, porém neste aspecto a montagem é brilhante por dar um ritmo agradável ao longa e usando flashbacks de forma inteligente durante o filme. A fotografia do próprio Kaye é interessante, alternando cores fortes, preto e branco, usando as sombras quando Brody aparece sozinho, fazendo meio que um depoimento e embaçando o rosto do protagonista de forma curiosa durante a projeção. Seu trabalho de direção é preciso, empregando um tom quase documental a obra, aumentando ainda mais o impacto de algumas cenas. O roteiro é o ponto forte do filme, com questionamentos fortes, inteligentes e conduzidos com maestria. Reparem no tom pessimista através dos monólogos de Barthes, como se tivesse perdido a esperança nos jovens e, especialmente, em sua família, mostrando que não resta muita coisa aos professores que operam verdadeiros milagres em sala de aula.
O elenco está fabuloso, repleto de nomes conhecidos como Lucy Liu, James Caan, Blythe Danner e Marcia Gay Harden brilhando em cena. A surpresa fica por conta da estreante Sami Gayle, que consegue pegar uma personagem meio batida e inserir uma enorme complexidade nela, graças a coragem em sua composição. Ainda tem Louis Zorich espetacular como o avô do protagonista, em um homem que sofre de Mal de Alzheimer e pensa sinceramente que sua vida não merece ser lembrada, afinal, nem ele se lembra dela mesmo. Mas o grande destaque fica pela atuação visceral de Adrien Brody. O ator vive Barthes de forma intensa, oferecendo um dos melhores (senão o melhor) desempenhos de sua carreira. E o interessante em seu desempenho vem de sua postura com os ombros curvados, do olhar cabisbaixo, devastado, da mudança em seu tom de voz, a fúria contida explodindo de dentro pra fora. Suas lágrimas, que soam verdadeiras, assim como a profunda melancolia estampada em seu rosto, em suas lembranças e na desesperança presenciada em seu dia-a-dia, mostrando todo peso que aquele homem carrega mesmo tendo como regra a INSENSIBILIDADE.
Bullying, suicídio, assédio, abuso, prostituição infantil, desigualdade social, sistema de ensino público e hospitais com pessoas desinteressadas e desmoralizadas regendo algo de fundamental importância. Todos esses problemas são tratados com extrema atenção por Kaye, que dá a cara para bater, nunca fugindo dos questionamentos levantados durante a fita, que permeiam este vigésimo primeiro século de vida. O filme não é uma crítica direta a "Geração Y" como muitos apontam, mas sim aos pais destes jovens de hoje. "Deve haver um currículo para ser um pai", fala Barthe durante o longa. Nas reuniões das escolas, onde a pergunta que ecoa pelos corredores escuros e vazios são "onde estão os pais dessas crianças?", em um tom quase desesperador. É o desapego passando quase que de forma hereditária, sendo refletida em manchetes de primeira página dos jornais, mas que ninguém parece ligar para isso.
Sim, os pais precisam de pré-requisitos, pois o comportamento dos filhos é de grande parte influenciada por seus genitores, por aqueles que nos criam e que são nossos exemplos diários. Onde estão aqueles que se importam com seus descendentes? O que vemos é o inverso, são os que têm suas crias como verdadeiros fardos, que vão à escola brigar com os professores por ter que ficar em casa cuidando de "seu rebanho". Cadê os sentimentos básicos como amor, amizade, respeito, cumplicidade e compreensão? Será que tudo está perdido? Em qual universo a depressão é tratada como uma mera bobagem? Em que lugar você discriminar alguém é engraçado? De que maneira desmoralizar as pessoas pode ser um estímulo para que a mesma possa tentar melhorar suas deficiências? Desde quando você tentar ajudar as pessoas é um delito? É revoltante pensar que tantas questões possam ser levantadas durante 97 minutos, e ainda serem tratadas de maneira tão banal pela sociedade. Será que todos precisam de um Henry Barthes? Porque não podemos simplesmente ser um Henry Barthes? A verdade machuca, mas aqui, é necessária... Necessária não, é obrigatória para acordarmos e começarmos a fazer nossa parte, antes que o desapego tome conta e nos faça querer desistir do amanhã.
Esse filme é espetacular!!! Ainda acredito muito no Brody.
Chico, parabéns, cara. A cada texto seu que leio, me motivo ainda mais pra continuar com os meus, sinceramente. São poucos que pegam tão bem a atmosfera dos filmes como você.
Sim Felipe, na verdade, se tivesse uma atriz melhor... Teria passado um pouco despercebido algumas coisas. Hehehehe
Muito obrigado, Alan. Sim, eu fico depressivo, revoltado e pensando por dias. O filme tem esse poder de nos fazer refletir sobre vários assuntos, e sobre nós mesmos.
Poxa Christian, muito obrigado, fico realmente honrado vindo de você. Brody é um ator talentoso, só que embarca raramente em bons projetos. Parece a Swank. Hehehehe