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Críticas

Cineplayers

Aconteceu de forma torta ou simplesmente não aconteceu?

4,0

Ao contrário do que muitos possam pensar, O Amor Acontece não é uma comédia romântica bobinha e cheia de piadas imbecis: inclinando-se muito mais para o lado dramático, conta a história de Burke (Aaron Eckhart), um viúvo que, para conseguir lidar com a morte de sua amada esposa, escreve um livro que se torna um best seller inesperado. Ministrando palestras motivacionais sobre como seguir em frente na vida após perdas importantes, acaba conhecendo Eloise (Jennifer Aniston), por quem se sente vivo novamente. Essa relação revela muito mais sobre a persona de Burke que, se parece confiável e resolvido para a grande maioria, encontra em Eloise seu ponto de realidade, já que nunca superou de verdade a perda da ex.

A idéia é interessante, pois essa trama de tentar seguir em frente depois de uma perda importante é algo sempre que atrai boas discussões, uma vez que o ser humano, por si só, gosta de discutir a morte e suas conseqüências. As pessoas costumam se identificar com esses personagens, torcer por eles, simpatizar por sua causa; e com Burke não é diferente: é engraçado ver seu jeito desajeitado ao flertar com Eloise no jantar depois de anos de inatividade e a cena particular em que ele solta o papagaio de sua ex na mata é bonita tecnicamente e tocante como um todo.

Seu discurso, enérgico a partir que seu nome é chamado para as palestras, soa bastante hipócrita quando conhecemos o background de sua vida, algo que seus clientes não conhecem: bebida, tristeza e culpa. Trilhando um perigoso caminho em que poderíamos sentir raiva do personagem perante esta hipocrisia, o filme acerta ao nos apontar que ele é apenas uma vítima daquele meio, e por lidar com a morte todos os dias, sem ter conseguido superá-la de fato, torna-o um personagem trágico e sofrido. Os outros o tornaram em um espetáculo, mas será que era realmente isso que ele queria? Tudo bem que ele poderia ter criado uma resistência maior e negado todo o show business a que fora atirado, mas até que ponto uma pessoa sem perspectiva, perdida, triste, tem forças para lutar contra algo que o está levando a frente? E as pessoas que ele realmente ajudou? Mesmo que não tenha se ajudado no processo, é algo que lhe dá razão para seguir em frente.

Só que o filme é lotado de deslizes. Começando pela escalação do elenco, Aaron Eckhart, apesar de ótimo ator, não é lá muito galã para atrair bons olhares e nem normal o suficiente para convencer na fluência de seu sofrimento. Não que ele seja mal ator; muito pelo contrário, seu estilo apenas não encaixou com o de seu personagem, deixando-o exposto à críticas a maioria do tempo – simplesmente não cola sua participação. Já Jennifer Aniston é a responsável pela referência à comédia romântica citada lá no começo deste texto: apesar de sua participação no recente e ótimo Marley e Eu, ela não fizera um drama realmente importante ou convincente ao longo de sua carreira, e não vai ser desta vez que se firmará como grande atriz de cinema. Talento ela tem, falta escolher melhor seus trabalhos.

É um desperdício ver um ator como Martin Sheen em um personagem tão limitado como o sogro de Burke. Não, o personagem não é ruim, mas sua execução, desde as falas até as ações que toma, são simples demais, assim como todo o roteiro. Os diálogos são vazios, bobos, limitados... Não é um trabalho muito feliz e o final do filme é quase constrangedor quando deveria emocionar. Há um personagem que se destaca dos demais no dia-a-dia de Burke, que é o ex-empreiteiro Walter (John Carroll Lynch), já que é o único que representa certa resistência aos métodos que o viúvo utiliza, e também muito mais tocante do que o próprio protagonista, mesmo que soe, algumas vezes, desnecessário e meloso demais – outro erro grave do roteiro, ao não introduzi-lo de maneira mais natural à trama, já que é um bom personagem.

O roteiro é tão ruim que ainda insiste em trabalhar com o clichê conveniente: insere um namorado na vida de Eloise apenas para que este seja dispensado logo nos primeiros minutos da personagem em cena. Por que diabos não economizar alguns preciosos minutos e colocá-la solteira desde o início? Ela poderia demonstrar receio de seguir um relacionamento pelos mesmos motivos apresentados no filme, mas compactar isso em sentimento, não em uma das várias seqüências totalmente descartáveis do longa-metragem. E se ela demonstra uma certa resistência aos flertes de Burke, logo isso muda da água para o vinho e ela passa a aceitar e se envolver muito rápido para o modo que agia.

O amor que intitula o filme, tanto nacional quanto em seu original, não convence e nem é o principal tema escolhido, então para que tanto destaque no título? Será que o amor citado realmente aconteceu ou a redenção do personagem, muito mais importante, é mero segundo plano? Seja o que for, mostra que as intenções em O Amor Acontece ficaram muito mais fortes do que a execução. Isso tudo somado ao tom despretensioso, bobo, ingênuo e raso que o filme tem, mais à seleção do casting e as imagens coloridas demais dá o tom errado ao que o filme propunha. As músicas são bonitas e o tema também, mas acabam apagados perante a tamanha perda de tempo que a experiência em geral proporciona.

Comentários (1)

Fernanda Pertile | sexta-feira, 28 de Outubro de 2011 - 20:54

parabéns pela crítica, concordo plenamente.

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