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Críticas

Cineplayers

Pequenos delírios.

7,0
O universo infantil está muito representado esse ano no Olhar de Cinema. Alem das sessões infanto-juvenis, que já são características à programação, os personagens mirins são protagonistas ou estão em situações-chave de diversos títulos em cartaz. Esse longa em questão vem das Filipinas e mostra uma realidade ao mesmo tempo particular, poética e ainda assim cinematográfica, de alguma forma muito peculiar. Isso tudo é transpassado pela visão da protagonista, uma menina que não apenas irá traduzir o filme em imagens para o espectador, ela ainda mostrará sua conotação quase surreal do seu contexto familiar.

Tem ainda uma estrutura muito contemporânea de núcleo, que se resume a mãe e filha. Essa é a nossa personagem principal, que tem como principal passatempo ouvir repetidas vezes as fitas cassete que seu pai envia pra sua mãe, à distância. Nada do que ela ouve é próprio para alguém tão pequeno, mas sua fixação nas fitas e na voz do pai é maior. Ela escuta repetidamente os mesmos trechos, numa busca contínua para suprir a falta dessa figura. Paralelo a isso, sua mãe passa o dia dando duro em um hospital, e o irmão gêmeo do seu pai (um cantor local) que assume uma certa função naquela rotina, criando um equilíbrio impensado. Aos poucos, vamos observando o quanto de fantasia pode caber no universo dessa personagem.

O segundo longa da diretora Shireen Seno é também um belo estudo de construção de personalidade, que conta com a delicada interpretação de Jana Agoncillo como a interiorizada Yael. O esforço conjunto da direção e da protagonista elevam o material, que investe na elipse narrativa para fazer o desenho do roteiro. Tanto do jogo do filme faz sentido mediante uma chave delirante de imaginação, que permite criar atmosfera e uma base de entendimento, ainda que o tal venha embalado com tintas cada vez mais fortes e artificializadas, que liberam qualquer obrigação do filme com o naturalismo (ainda que as interpretações o sejam). A direção de arte do filme é também um capítulo à parte, inclusive há nos elementos da cenografia um resumo da proposta do longa.

A cada novo delírio de Yael parece haver um proposital descolamento sutil de estética, que acaba abrangendo texto e encenação. A fotografia começa a elevar a temperatura das luzes, que começam a ir para os lados do vermelho e do azul em tons neon. Mas nada é exagerado em 'Nervosa Tradução'; a intensidade que a projeção passa também vem em um passo de cada vez, proporcionando uma gama de reações condizentes com cada novo momento proposto por Shireen. Até colocando questões muito prementes da sociedade atual, o filme escolhe ainda debater questões estéticas sob um olhar jovem e diferenciado. Ainda assim, um filme de fácil assimilação, o que é uma prova de que filmes narrativamente elaborados não são necessariamente inacessíveis.

Filme visto no Olhar de Cinema de Curitiba

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