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Críticas

Cineplayers

Apesar do roteiro falho, com excesso de histórias paralelas, as atuações fazem de Árido Movie um bom trabalho do cinema pernambucano.

7,5

Quantos bons filmes sobre vingança você conhece? Quantos filmes brasileiros ambientados no nordeste, mais precisamente no sertão, existem? E películas com temática principal sobre a água? À primeira vista, muitas obras podem ser citadas, e este é o cenário em que Lírio Ferreira lançou seu mais novo filme.

Nos últimos anos, o cinema pernambucano com certeza é um dos que mais cresceram no país. Lírio Ferreira, Marcelo Gomes e Cláudio Assis são uns dos principais nomes deste estado. Lírio já havia se consagrado com um filme sobre o nordeste, Baile Perfumado (1997) que conta a história de Lampião e seus cangaceiros, sob as câmeras de um cinegrafista turco. Porém, em seu mais novo filme, o diretor optou por visões mais pessoais e estereotipadas, de forma muito parecida com outra fita recente aqui produzida, Abril Despedaçado, de Walter Salles. Ambos os filmes retratam a rivalidade entre famílias, a vingança propriamente dita. No entanto o filme do cineasta pernambucano prefere uma narrativa mais pessoal e arrojada, deixando claro sua modernidade.

Já nos créditos iniciais, o filme conta com uma visão panorâmica sobre o mar indo ao encontro de uma praia, e ao fundo uma música soando “o sertão vai virar mar, e o mar vai virar sertão”, retratando toda uma simbologia nostálgica de uma das melhores safras do cinema nacional. Talvez com esta frase, o diretor queira mostrar ao público suas influências e consciência sobre o que está por vir. Além desta cena, outro ponto crucial, influenciado pelo diretor de Deus e o Diabo na Terra do Sol, é o nome da cidade em que é ambientado o filme: “Rocha”, justamente por causa de Glauber.

O filme conta a estória de Jonas (Guilherme Weber), um jornalista que apresenta a meteorologia na TV. O apresentador vai ao encontro do corpo de seu pai (Paulo César Pereio) que foi assassinado na pequena cidade de Rocha, situada em Pernambuco. Chegando na cidade, o protagonista encontra uma parte da família a qual não conhecia, e eles o cobram que vinguem a morte do pai. Algo demasiado complexo para um sistemático repórter legalista, matar não está em seu dicionário, não se encaixa com seu perfil. Vingar alguém é algo de outro mundo para Jonas. Talvez a escolha de um ator paranaense para este papel contribuiu para o desenvolver do filme, o ator não se encaixa fisicamente com as características nordestinas, tais como altura, cor de pele, cabelo e olhos.

Enquanto isso, Giulia Gam faz o papel de Soledad, uma videomaker que está fazendo um documentário sobre a água no sertão. Seu principal objetivo é encontrar e entrevistar uma figura lendária da região, o Sr. Meu Velho, interpretado por um dos maiores dramaturgos do país, José Celso Martinez Côrrea.

Um fator precário do filme é o uso excessivo de tramas paralelas, como um grupo de amigos interpretados por Mariana Lima, Selton Mello e João Falcão, companheiros de Jonas que seguem seu rastro, deixando muito amplos e vagos seus papéis. Tais atores foram utilizados para deixar o filme com um tom mais humorístico e sarcástico, são eles que dão o toque cômico no filme e se não fosse por esta característica, seriam completamente dispensáveis. Na região de Rocha conhecem um índio pseudo-intelectual, José Dumont, um fã de Raul Seixas que tem um papel fundamental na trama, é ele que dá toda a liga, as bases para o encaixar da estória. Além dele, outra índia ganha um papel importante, é Wedja, interpretada pela modelo Suyane Moreira, bela como nunca, seduz o pai de Jonas e o leva a morte. Como já dito, o filme conta com muitas intrigas eqüidistantes. Renata Sorrah como a mãe do protagonista recebe um papel totalmente infortúnio, mesma coisa com Matheus Nachtergaele que fica muito apagado e perdido no roteiro.

Totalmente desnecessário o grande consumo de drogas no filme, principalmente quando o personagem de Selton Mello ensina a enrolar um baseado. Esta seqüência me lembrou Vento do Oriente, um filme de Jean-Luc-Godard no qual é ensinado como fabricar um coquetel Molotov. Cenas como esta enfraquecem e desmistificam a cultura pop, de certa forma modernizando e provocando reações prescindíveis na platéia, não contribuindo em nada para o desenrolar do filme.

As atuações, de certa forma, compensam o roteiro que é falho em vários pontos: falta conclusão de alguns personagens, maior abordagem de outros. Incrível como quase todo elenco merece destaque por suas atuações, menos o protagonista Guilherme Weber (Jonas) que, apesar de compensar com seus aparatos físicos, não teve uma atuação das melhores. A parcela indígena, principalmente José Dumont (Zé Elétrico), surpreende com sua naturalidade e astúcia e, mesmo em um papel totalmente estereotipado e desgastado, com sua bela performance, consegue de certa forma encaixar tudo ao final. Árido Movie não é o melhor filme recente sobre o nordeste, e talvez nem o melhor do próprio diretor, porém compensa pelas belas atuações, pela excelente trilha sonora que ensambla toda construção, e pela excelente fotografia assinada por Murilo Salles que enaltece a riqueza de cores e luzes atribuídas ao local.

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