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Birdman ou (A Inesperada Virtude da Ignorância)

(Birdman or (The Unexpected Virtue of Ignorance), 2014)
7,8
Média
725 votos
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Sua nota

Críticas

Cineplayers

O razzle dazzle de uma sátira.

9,0

Em uma award season protagonizada por alguns razzle dazzles cinematográficos, espetáculos virtuosos, de grandiloquência particular, como O Grande Hotel Budapeste, Boyhood e, em escala menor, Whiplash, Birdman consegue superar o próprio exotismo e trazer para a tela algo seu: uma sátira, um exagero de tom perfeitamente histérico. Alejandro Gonzalez-Iñarrittu costumava ser o elo mais fraco e ambicioso do world cinema, ainda querendo fazer do cinema sua orquestra megalomaníaca, ele finalmente entrega algo de frescor criativo.

Acredito que, filtrado pelo tempo, Birdman vai perder muito de seu encanto imediato. O filme é de um estilo demasiadamente atrativo, é fácil cair pelo virtuoso, mas é fácil também se perder nele, como a própria filmografia de Iñarrittu mostra, não é o caso aqui. Passei o último ano defendendo que O Grande Hotel Budapeste é uma obra-prima porque faz sua grandeza visual ter uma razão de ser dentro daquele personagem, que é o filme mais meticuloso de Wes Anderson justamente porque é sobre Wes Anderson e o universo cinematográfico que ele costuma criar. Embora eu não iria tão longe no meu carinho por Birdman, acredito que o seu truque está muito bem motivado pela narrativa. O plano-sequência falso que sempre dá tanto o que falar é a tentativa pelo sublime de um diretor sobre a mesma tentativa de outro diretor, curiosamente as duas parecem cheias de falhas e tropeços e exageros desnecessários, como costuma ser a arrogante procura do sublime na arte.

Birdman funciona muito como uma música orquestrada. Há um crescimento de ritmo que atravessa o filme, começando com o leve ping-pong do tom cotidiano, provocando-se com alguns absurdos no decorrer da trama e da montagem e alcançando um clímax. Infelizmente, Birdman vai algumas vezes além do clímax. Mas não gratuitamente: há muito que o filme quer dizer e precisa de tempo depois de tempo para isso.

Há uma brincadeira metalinguística óbvia com a escalação de Michael Keaton. O personagem dele, o ator de cinema aventurando-se como diretor de teatro Riggan Thomson, era famoso nos anos 1990 por interpretar o super-herói Birdman, do título, assim como Keaton uma vez foi famoso pelos Batmans de Tim Burton. A única coisa espetacular na performance de Keaton é essa relação, o resto é de uma histeria bem-vinda, mas singela. O destaque do elenco, a meu ver, é a desgraçada performance Naomi Watts, esquecida pelos tantos prêmios. O desespero de uma personagem que está chegando ao fundo do poço emocional enquanto se aproxima do auge da sua carreira é tocante.

A grandeza do elenco (de todo ele, unido) está na sua perfeita sintonia. Eles se comunicam no bom excesso. Assim, é Edward Norton que pressiona Watts para o seu maior momento, é Keaton que empurra Norton, Emma Stone dá espaço para uma nova abordagem de Riggans por Keaton; esse ciclo tem várias ramificações, todas muito eficientes. A química entre eles é muito corporal, conflituosa e perfeita. Ninguém procura a luz para ofuscar seu colega.

O elenco, a direção de Iñarrittu e a fotografia de Emmanuel Lubezki se aliam no truque da não interrupção de ritmo e narrativa. O trabalho de arte e efeitos visuais do filme os dão assistência no que for preciso não apenas para que a ilusão não seja quebrada, mas para aumentar a sua potência a cada novo momento. Há um certo realismo em não permitir cortes (ou a apenas aludir à falta de cortes, como acontece aqui), Birdman recusa esse falso realismo desde o primeiro momento, em que o protagonista flutua no seu camarim. Aí se afirma a outra parte do pacto de ilusão: nós.

Sabemos desde o princípio que é tudo um truque, um exagero, uma sátira, é inútil apontar os momentos em que claramente os cortes acontecem, os absurdos das atuações aos rodopios de Lubezki, de um roteiro e uma direção que não sabem quando dizer “basta” na mensagem prolixa sobre ego, criação e crítica (crítica também em sentido mais amplo, como recepção e observação). Pela primeira vez, acho que a falta de limites de Iñarrittu tem um bom resultado. Era ela que deixavam seus moralismos sociais minimamente interessantes. Livre disso, ela parece finalmente se aproximar da grandeza.

Comentários (23)

Guilherme Santos | domingo, 01 de Fevereiro de 2015 - 20:05

Era pra ficar assim:
melhor filme: boyhood
melhor diretor: birdman
melhor roteiro original: o grande hotel Budapeste
ficaria bem feliz😁

Marlon Tolksdorf | terça-feira, 10 de Fevereiro de 2015 - 11:49

"Será que Norton mexeu no roteiro como sempre?"

Discorra sobre o assunto.

Davi de Almeida Rezende | sexta-feira, 05 de Junho de 2015 - 09:01

O problema dos jovens "críticos" de internet é que eles escrevem muito preocupados com o que os leitores vão achar, e ficam floreando, andando em círculos, falando de maneira "difícil" para parecerem escritores, caindo em redundâncias, etc, o que afeta a qualidade do texto.

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