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Críticas

Cineplayers

Clint se firma como grande cineasta ao apresentar a bela história dos soldados japoneses abandonados no campo de batalha.

8,5

Mais uma vez Clint Eastwood acerta. Seu Cartas de Iwo Jima é um bom filme. Como os anteriores, trata-se de um produto bem feito ao extremo, quase acadêmico e excessivamente bem cuidado. Colabora para isso o roteiro um tanto esquemático e óbvio de Paul Haggis. Enfim, um filme de septuagenário, algo que Clint é. Inteligente e sensível, com visão humanista, impecável; só não espere inovação.

O que Cartas de Iwo Jima tem de melhor é o fato de ter sido co-escrito por uma mulher, Iris Yamashita, e o olhar dela para a guerra do Japão contra os EUA é caloroso e bastante peculiar, aproximando o filme de Clint de uma das obras-primas dos filmes de guerra, A Harpa da Birmânia, também escrito por uma mulher, Nato Wada.

Para quem gosta de história material, é um primor. O Japão não tinha condições de estar naquela guerra. Não tinha dinheiro, nem armamentos, seus oficiais eram aristocratas ligados ao rei sem treinamento militar adequado, a maioria dos soldados era de camponeses recrutados à força. Como disse um deles, um padeiro, ele foi para a guerra porque confiscaram as suas panelas e até os fornos para produzir armamentos.

Os soldados japoneses sabiam que iriam perder a guerra desde o início. Estavam lá para morrer. A ordem era de lutar até a morte. Em Iwo Jima, o Japão tinha dois mil homens para 70 mil dos EUA. A frota de 40 navios japonesa de guerra havia sido destruída numa batalha anterior e o que restou dela voltara para as proximidades de Tóquio. Enquanto isso, os 80 navios americanos, com a mais potente tecnologia da época à disponição seguiam firme, fora as duas centenas de aviões.

Não foi uma luta, foi um massacre. Os japoneses não tinham sequer água e mantimentos o suficiente e foram abandonados por Tóquio. Muitos soldados se entregavam ao inimigo famintos para ganhar água e uma refeição. A munição era pouca e eles tinham espadas para lutar contra a pesada artilharia americana. Fora isso, tinham de lidar com a cegueira dos oficiais japoneses da Era Meiji, obcecados em fazer do Japão um império e disposta a morrer para conseguir – eram fanáticos.

Tanto que quando a guerra acabou, boa parte dos soldados continuou lutando, seja pela ideologia obscurantista, seja pelo precário sistema de rádio, que mentia para a soldadesca sobre a derrota. Tudo isso descrito acima está na obra de Clint, um americano.

O filme é baseado nas cartas que vários desses soldados escreveram para amigos, parentes e esposas e que nunca foram enviadas – até o correio fora suspenso, a maior parte das cartas era censurada. Enterradas, foram descobertas mais tarde, perfazendo o retrato sem retoques oficialescos da guerra, dura e sem sentido para os soldados rasos. O resultado é nunca menos que cativante.

Clint Eastwood fez um filme forte. A edição de som e os efeitos sonoros são impressionantes, assim como o fato de pintar com cores as cenas de destruição (o filme é em preto-e-branco). Alguns flahsbacks são meio constrangedores pela manipulação escancarada, mas nada que interfira no belo resultado deste lindo Letters from Iwo Jima.

As artimanhas e estratagemas do combate são deixados ao longe, a destruição só se insinua até que se torna explícita e violenta. O que interessa a Clint são seus soldados e a história de vida deles, comandantes e comandados. Se não por esses motivos, Cartas de Iwo Jima serve para mostrar o quanto choradeiras e patriotadas como O Resgate do Soldado Ryan, de Steven Spielberg, são ruins. A elegância e a inteligência de Clint Eastwood fazem dele um grande cineasta, mas colabora também a baixa concorrência.

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