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Críticas

Cineplayers

Entre defeitos e qualidades, a disputa entre os dois snipers empolga e faz desta experiência algo muito divertido.

7,0

Realmente não dá para entender como um filme desses pode ter ido mal de bilheteria nos EUA. Talvez seja pelo fato de abrandar um fato histórico onde os EUA não estão envolvidos, perdendo muito do público patriota que vai ao cinema para ver o quanto o seu país é bom. Só que Círculo de Fogo é um dos melhores filmes de guerra que eu vi desde O Resgate do Soldado Ryan (que muitos odeiam, mas eu amo). Ele tem um clima todo especial, algo que não vejo constantemente hoje em dia, o que contraria justamente com o que vou falar agora: sua falta de profundidade. Mesmo com esse defeito grave, o diretor Jean-Jacques Annaud (do também excelente O Nome da Rosa) consegue dar um ar de disputa incrível às suas cenas, deixando o espectador tenso sempre que deseja isso.

A história do filme se passa durante a Segunda Guerra Mundial, mais precisamente em 1942, quando os soldados de Hitler tentavam invadir uma das últimas cidades da Rússia que ainda resistia, Stalingrado. Só que, historicamente falando, essa foi a primeira grande derrota da Alemanha na guerra, onde mesmo com todo o seu poderio bélico não conseguiu invadir a cidade (que ficou toda em ruínas). Essa importante passagem histórica é deixada de lado (só serve como ambiente) para contar quem foi Vassili Zaitsev (interpretado maravilhosamente por Jude Law, de A.I. - Inteligência Artificial), um herói russo nesta guerra, e como ele serviu de símbolo de estímulo para as tropas russas não desistirem da luta. Seu amigo correspondente Danilov (Joseph Fiennes, de Shakespeare Apaixonado) dá a idéia aos seus superiores de criarem esse símbolo de guerra e, por ter conhecido Zaitsev em um massacre onde esse usou sua habilidade com o rifle para se salvarem, dá a idéia do rapaz como símbolo da resistência.

Após a primeira meia hora de filme, entra em cena o Major König (Ed Harris, de As Horas e Pollock), o personagem que virá a duelar com Vassili, por este ter matado diversos soldados alemães e estar começando a abalar sua moral. König é a melhor coisa do filme. É frio, calculista, exímio atirador, enfim, tem uma presença incrível na tela. Gostei muito mesmo tanto do personagem quanto a interpretação de Harris (que considero um excelente ator). O problema com esses personagens é que nada realmente profundo acontece a eles. A guerra, na verdade, é apenas um motivo, como dito antes, nada que acontece nela afeta diretamente o decorrer da história. Os dois ficam duelando, e essas batalhas são o ponto alto do filme.

Nessa história toda, ainda há tempo para um romance, o que é um outro ponto fraco do filme. Extremamente clichê, não há nada de novo para ser contado nesse romance. Nem emocionar ele consegue, e já deve para imaginar o que rola, não é? Vassili e Danilov em disputa pelo amor de Tânia Chernova (interpretada pela jovem e bela Rachel Weisz, de O Retorno de Múmia e Um Grande Garoto). Claro que haverá guerra de ciúmes e tudo mais, só que nem isso conseguirá desviar o foco principal do filme (a guerra de ‘snipers’ entre o mocinho e o vilão; ainda bem!).

Recapitulando, só para você não se perder: há um romance, uma guerra, mas o foco principal mesmo do filme é a luta entre os dois snipers. Até aí tudo bem, já que nem o romance e nem a guerra influenciam na luta, mas fiquei impressionado com a falta de profundidade dada pelo roteiro aos personagens principais. Por exemplo: é possível ver que o personagem de Vassili teve uma grande ligação com o avô, mas isso não é explorado pelo filme. Você não fica sabendo de nada do seu passado, de seus medos (um medo é apresentado, mas totalmente desnecessário, já que ele não influiu na habilidade de atirar de Vassili), nada! E isso se reflete em todos os personagens, menos o de Rachel, que tem um passado pelo menos apresentado (mas também não trabalhado). Mas o personagem que mais marca é, sem sombra de dúvidas, o garoto Sacha Filipov (interpretado por Gabriel Thomson). Toda a sua importância na trama, o modo como se desenvolve e, principalmente, o desfecho que tem são marcantes, gostei muito do trabalho sobre esse personagem. Enfim, para não me estender sobre os personagens, é mais ou menos isso: eles são carismáticos, mas extremamente pouco trabalhados.

Não venha assistir esse filme esperando um trabalho psicológico sobre os personagens (como em Apocalypse Now), ou tiros e mais tiros para todos os lados (Falcão Negro em Perigo), ou um sentimentalismo (O Resgate do Soldado Ryan), o foco aqui é único e exclusivo sobre a batalha travada entre os dois atiradores. E posso dizer que as cenas são fantásticas. Fiquei todo o tempo grudado com os olhos na tela, conferindo as táticas, pensando junto. Nossa, tinha tempo que um filme de guerra não me entretinha desse modo! A cada mira, a cada tiro disparado, me empolgava mais, gostava mais do filme. Me identifiquei muito também por sempre gostar muito de jogar com rifles em jogos como Counter Strike ou Medal of Honor, o que fiquei com bastante vontade de fazer ao terminar de assistir Círculo de Fogo. E não digo que ele é ação pura, não é isso! Aqui sim, o tratamento psicológico é todo especial, profundo, o clima dado é fantástico. Arrisco até a dizer que o filme cria um suspense muito maior do que um clima de guerra em si (tirando a cena inicial, um massacre que os fãs de cenas de guerra com certeza adorarão). O combate entre os snipers é mais calculado, mais preciso, não é somente atirar para qualquer lado e ficar vendo quantas pessoas caem ou perdem um pedaço do corpo. É algo muito mais profundo que isso. Há algumas grandes sacadas, como o atirador atirar junto com o som de uma explosão para que os inimigos não o ouçam, ou então usar o reflexo de cacos de vidro para um enxergar ao outro. Enfim, as batalhas foram extremamente bem pensadas.

O que um filme de guerra geralmente pede para quem o assiste é estômago. Não vou dizer que esse não tem cenas fortes, não é isso, mas ele é bem mais moderado sim, não se prende a ficar mostrando um ou outro dilacerado. Aparece sim, mas a maior violência nele está, sem dúvida, nas pessoas alvejadas pelos snipers. Ali o diretor não prepara, simplesmente mostra, de forma nua e crua, como uma pessoa fica ao receber um tiro. É natural, não ficou forçado, e isso gostei. É menos nojento que o tradicional, tudo o que aparece na tela de violência é justificado.

Círculo de Fogo é bem isso aí. Não tem personagens profundos, não explora o ambiente e nem a importância histórica em que se passa, tem uma história de amor clichê, porém também não tem mil horas de duração, é um filme bem tenso e divertido, enfim, diferente, consegue ter um estilo próprio. E isso, no meio de tantos filmes ‘figurinhas repetidas’ que vem saindo hoje em dia, é um grande mérito. E deixe o Counter Strike aberto em seu computador para assim que terminar o filme dar uma jogada no embalo que o filme te deixa. É um dos melhores filmes de guerra da atualidade, pelo menos em diversão.

Comentários (1)

Cristian Oliveira Bruno | sábado, 23 de Novembro de 2013 - 18:18

O lima de tensão é sensacional. Infelizmente, Joseph Fiennes está no elenco....
Mas a cena de sexo entre Jude Law e Rachel Weisz em silêncio, em meio à tropa de soldados dormindo no chão é, no mínimo, inusitada!!

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