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Críticas

Cineplayers

Cinebiografia segue narrativa sem ousadias.

5,0

Como o próprio título já sugere, se compramos a idéia de pensar numa Coco antes de se tornar Madame Chanel e aceitamos ir ao cinema para vê-la, o que mais interessa é enxergar na trajetória dessa personagem os elementos que a transformaram no símbolo de elegância e alta costura que seu nome hoje sugere. Até estão lá os chapéus que a tornaram inicialmente conhecida; a adaptação do vestuário masculino às necessidades de conforto e praticidade femininas; a introdução da idéia de simplicidade e elegância com a adoção do pretinho básico; as estampas de marinheiro e as camisas de jersey. Mas tudo como pano de fundo da vida romântica de Gabrielle, justo uma das mulheres que - apesar dos muitos e polêmicos romances - manteve-se sozinha por escolha e, segundo conta a história das grandes citações, não se interessava por romances.

E assim a diretora Anne Fontaine (também responsável por adaptar o livro de Edmonde Charles-Roux em roteiro) pega a cultuada figura da estilista francesa e transforma numa francesinha irritada e cheia de opinião - animada pela atriz Audrey Tautou -, que de órfã abandonada, se transforma numa tentativa frustrada de dançarina de cabaré enquanto trabalha como costureira numa confecção de cidade pequena, até conhecer o comerciante de tecidos Étienne Balsan (Benoît Poelvoorde) com quem se relacionará em termos nada razoáveis, para que então tudo se altere com a entrada de outro personagem, este sim, o homem que conquistará o coração da mocinha ranzinza: Arthur “Boy” Capel (Alessandro Nivola).

Não entendam o parágrafo acima como uma defesa exaltada do que seria mais correto como representação sobre a vida da estilista, mas de histórias de mulheres duras que são dobradas por um amor - que ainda por cima termina em tragédia - o cinema está cheio. Inclusive, a cena em que Coco é avisada sobre o acidente com Boy remete imediatamente a Piaf - Um Hino ao Amor, apenas que Tatou e Cotillard interpretam mulheres de temperamentos diferentes e, em ambos os casos, não menos fortes.

Carregando nos traços do melodrama e mostrando Chanel como uma mulher que sabia impor suas vontades, o filme não leva o espectador a pensar sobre a natureza dos contratos sociais que a estilista precisou assinar para, sair da condição de dançarina de cabaré e alcançar o status de referência em estilo, ainda que Audrey Tatou mantenha o biquinho e as sobrancelhas crispadas. Mais interessante seria se Fontaine tivesse explorado os conflitos e exposto personagem e atriz a embates mais intensos, ao invés de optar pela facilidade de uma história bonita, de compreensão e aceitação de um tipo como Grabrielle Chanel em meio à distintiva e arrogante sociedade francesa da primeira metade do século XX.

Nada disso importa: estamos ali para celebrar Chanel e todas as maravilhas criadas por ela, ícones de moda que alguns apontam como revoluções na vida femina, liberando as mulheres dos pesos dos espartilhos e das semelhanças com bolos confeitados, ainda que a trama do filme possa ter deposto contra esse caráter de emancipação quando liga diretamente a perda de um grande amor à dedicação da estilista ao seu ofício, o que lhe garantiu o sucesso cujos louros vemos a personagem receber, sem afetações, sentada numa escada e rodeada de modelos.

Ainda que esta homenagem tenha lá uma aparência de presente grego e toda uma dívida com dramas românticos de época, vale imaginar que Chanel tenha mesmo cortado as gravatas de Balsan e se apropriado de seus pijamas, livros e camisas para se tornar o que conhecemos dela.

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