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Críticas

Cineplayers

Misturando narrativas, o longa-metragem realmente consegue assustar.

7,0

Baseado em imagens de arquivo das entrevistas que a psicóloga Abbey Tyler deu a uma universidade no ano 2000, Contatos de 4º Grau conta o horror que Tyler passou ao tentar explicar e provar que fora abduzida por alienígenas (o quarto grau que dá título ao filme), assim como diversas pessoas de Nome, sua cidade, que desde os anos 1960 viram inúmeras pessoas simplesmente desaparecerem e receberem constantes visitas do pessoal do FBI. O recado final é dado pouco antes do longa começar de verdade: o filme é baseado em imagens e depoimentos reais e acreditar ou não no que irão ver depende de cada um – e isso é um pré-requisito essencial para o filme funcionar.

Pesquisando um pouco sobre a história somos guiados a acreditar que o filme é mais um herdeiro da escola A Bruxa de Blair de se fazer cinema: nunca houve uma psicóloga Abbey Tyler no Alasca, o que se conclui que todas as partes "reais" do filme são encenações, feitas pela própria produção, para dar um tom mais forte e realista à narrativa. Fica a nota que a opção deu certo, pois Contatos de 4º Grau não é mais um daqueles filmes de horror para adolescentes que apelam apenas para o gráfico afim de chocar, mas sim cria uma atmosfera angustiante durante toda a projeção, ficando mais perturbador ao decorrer de sua duração com um leve tempero de novidade ao já desgastado gênero.

Milla Jovovich encarna Abbey Tyler em sua "recapitulação", uma psicóloga que luta para entender estranhos sonhos com uma coruja branca que seus pacientes costumam ter - sonhos estes que eles não se lembram de nada, a menos que estejam hipnotizados. Conforme vai juntando as peças do quebra-cabeça, Abbey percebe que está muito mais envolvida no assunto do que parecia estar, e o espectador vai entendendo a degradação da personagem após a morte do marido, que afetou profundamente não apenas a ela, mas também a toda sua família.

Constantemente tratando sua história como real, o diretor novato Olatunde Osusanmi intercala imagens de "arquivo" (a outra atriz que interpreta Abbey não possui crédito) com as recriações de Milla e elenco, muitas vezes colocando-as lado a lado, para que o choque entre "realidade" e ficção fique ainda maior. Ainda que soe estranho no começo, essas imagens "reais" são as que mais chocam e conseguem causar medo na platéia, principalmente por causa do elenco (muito mais natural e realista do que quem está encenando a recriação, obviamente proposital) e de sua precariedade também proposital de captação. O diretor, ao dividir a narrativa, erra por sua inexperiência ao tornar sua "reconstituição" totalmente desnecessária quando paralela às imagens teoricamente reais, que são muito mais chocantes e convincentes.

Mas, ao mesmo tempo, ao optar por assumir uma recriação e tentar enganar o público com suas imagens de arquivo, o diretor acerta em criar uma história convincente e agoniante durante sua duração. Um dos problemas em A Bruxa de Blair, Atividade Paranormal, Cloverfield - Monstro e demais filmes do gênero pseudo-documental é que muitas vezes as pessoas se perguntam “por que diabos, apesar de tudo o que está acontecendo, as pessoas continuam filmando?”, que é uma argumentação bastante válida e, muitas vezes, o principal ponto fraco dos filmes citados.

Acontece que em Contatos de 4º Grau a narrativa é inteligente e, ao assumir uma reconstituição dos "fatos", as partes narrativas, que intercalam as cenas realmente assustadoras, funcionam muito melhor ligando o longa-metragem do que em um filme 100% como se fosse de arquivo, pois esse tipo de questionamento não existe – essas cenas são criadas, teoricamente, a partir de declarações detalhadas de Abbey em entrevistas e das 65h de vídeo que eles tiveram "acesso".

Resultando em uma mistura de pseudo-documentário e filme hollywoodiano, temos uma enorme surpresa ao constatar que o resultado final funciona, pois os sustos são reais, o filme é bem interpretado e as imagens "de arquivo" conseguem alcançar o seu objetivo de chocar, convencendo algumas pessoas de que o que está sendo visto em tela pode realmente ter sido real. Isso graças à opção de não usá-las a esmo, pois quando a imagem bonita, polida e colorida de Hollywood é substituída pelas imagens caseiras feitas pela psicóloga magra, pálida e fraca, tudo fica mais tenso e nos induz a acreditar que aquilo é real - e muitas pessoas irão discutir e bater de pés juntos que realmente é, e convenhamos, esse poder de convencimento é um ponto fortíssimo a favor do longa. Uma estratégia extremamente inteligente pelos responsáveis do filme, que trabalham com o contraste e a mitologia envolta ao tema para alcançar seus objetivos.

Desaprovado pelas autoridades locais do Alasca, que consideram Contatos de 4º Grau extremamente desrespeitoso com as pessoas reais da cidade que tiveram familiares sumidos, prepare-se para um filme principalmente de clima, incômodo, e que faz valer o preço do ingresso. Incluindo áudios reais de pessoas que tentaram relatar visões ou interações com extra-terrestres, o diretor aposta que isso ajudará o seu filme a ganhar veracidade (afinal, se aquelas declarações em áudio são reais, por que as imagens não seriam?). A proposta de criar dois tipos de projeção dentro do mesmo filme é falsa e manipuladora, mas funciona. E é isso que realmente importa no final.

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