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Críticas

Cineplayers

David Fincher exagera no pedantismo e no visual maneirístico nesta fantástica história.

7,0

É a Cate, estúpido!

Há vários equívocos nas opções dramáticas do diretor David Fincher para seu O Curioso Caso de Benjamin Button, mas nenhum poderia ser pior do que fazer Cate Blanchet entrar em cena apenas após 1 hora e 40 minutos de projeção.  Sim, ela está lá desde o início, uma velha moribunda contando sua vida para a filha enquanto o furacão Katrina se aproxima de New Orleans – clichê que estraga o filme. Mas linda, jovem, dançarina, belíssima e inteligente Cate só dá as caras depois da segunda metade desse inexplicavelmente longo filme de 2 horas e 47 minutos. A duração excessiva é o primeiro dos defeitos que saltam no filme. Não é o único.

Uma pena. Com uma história tão interessante (a do homem que nasce velho e vai rejuvenescendo com o tempo), atores carismáticos (Brad Pitt soube manejar sua carreira com inteligência e se meteu em vários bons filmes), belos e convincentes efeitos visuais, tudo conspirava a favor do filme, mas as fraquezas do diretor Fincher nunca foram tão evidentes, nunca suas cenas pareceram tão mal dirigidas em todos os filmes que comandou.

Escrito pelo roteirista de Forrest Gump - O Contador de Histórias, tem esse filme como uma espécie de fantasma. Da mesma forma que o primeiro, vai misturando a vida pessoal do protagonista com fatos da história americana. Muita música, reconstituição de época saborosa e piadas. Mas David Fincher carrega demais a mão nos movimentos de câmera e pirotecnias visuais – não tem nem o humor nem a leveza de Robert Zemeckis. Como o filme é todo narrado em forma de diário (outro clichê duro de engolir), há uma insidiosa e muitas vezes desnecessária voz de Brad Pitt em off falando, falando, falando, contando exatamente o que está na tela. Excesso de didatismo que arruinou o humor da trama.

Depois de uma hora de filme, sai a Primeira Guerra Mundial como pano de fundo e entra a Grande Depressão. Daí em diante vê-se que David Fincher estava mais interessado em posicionar sua câmera de forma mais extravagante possível, mobilizar seu filtros e nos fazer arregalar os olhos com os efeitos especiais. Fincher não é um diretor de delicadezas, aposta na apelação para tocar suas narrativas, impressionar o público pelo choque. Seu realismo nervoso, obsessivo, que faz sua fama entre os fãs de Clube da Luta e Seven (no Brasil, Os Sete Pecados Capitais), é aqui seu ponto fraco.

Quando chega a Segunda Guerra Mundial, a música de Alexandre Desplat começa a enjoar. Fincher e o roteirista não têm vergonha de usar todos os clichês, mesmo os mais surrados (além dos já citados acima), e fazem algumas cenas parecerem risíveis, tamanha a falta de imaginação e previsibilidade. Fincher contra-ataca fazendo malabarismos na narrativa. O filme começa a ficar confuso. Sua segunda hora derrapa feio. Felizmente Tilda Swinton aparece para iniciar Benjamin Button nas artes do adultério e do caviar. Mesmo passado no sul racista da Klu Klux Kan, nenhum comentário político. Falta estofo ao Forrest Gump de Fincher: o diretor neutraliza tudo, prefere artificialismos.

Mas enfim Cate Blanchet nos chega. Bailarina do American Ballet Theatre, estava mesmo era interessada no concorrente, o New York City Ballet. Ao levar Brad Pitt para jantar em Nova York, conta como é inovadora a dança do coreógrafo George Balanchine. Dança para ele alguns passos com a trilha de Who Cares?, uma das coreografias do lendário artista. Nem assim ela consegue que Benjamin Button a leve para a cama – conservador, queria a cidadã como esposa e nada de sexo antes do casamento, o caipira.

Benjamin Button tinha 26 anos e parecia 60. Apesar de filho de um milionário que o abandonou na escadaria de uma mulher que não tinha filhos (sim, mais clichê impossível), sem estudo e sem dinheiro, trabalhando em empregos pequenos e ex-soldado, Benjamin Button não impressionava a artista contemporânea metida com o que havia de melhor na dança mundial - ao reconstituir essa época de ouro, o filme se aproxima de F. Scott Fitzgerald, o autor do conto de origem, considerado o cronista maior do glamour americano.

Ela sofre um acidente, quebra a perna, fica impossibilitada de dançar. Amargurada e infeliz, volta para casa e encontra não só um homem que a ama muito, mas esse homem é… Brad Pitt, já no auge da forma, o corpo impecável finalmente sem efeitos de computação. Ela pede desesperada que ele faça sexo com ela, precisava daquilo mais do que nunca, se sentir bela e desejada. Assim a barriga tanquinho de Brad Pitt encosta na bunda esplendorosa de Cate Blanchet, os dois imaculadamente belos, numa cena de sexo que teria sido linda se o diretor não desviasse a câmera para mostrar coisas como a fumaça da calefação e um ratinho correndo pelo chão – é muito para David Fincher (sim, o ratinho entra no buraco da parede na cena de sedução com Tilda Swinton – eu avisei que as cenas eram risíveis).

Cate sabe mostrar como é ter um passado atrás de si, cheio de remorsos e rancor. O marido, que ela tanto ama lhe dá uma filha, continua a ficar cada dia mais novo, não tem esse problema. Um dia, chega a parecer a mesma idade da filha adolescente, 12 anos. Cabe a Daisy, personagem de Cate, cuidar dos dois, sendo que Benjamin, criança, em vez de aprender as coisas que ela lhe ensina, desaprende. Vai recuando até virar bebê de colo, numa seqüência horripilante, verdadeiro triunfo tecnológico digno dos melhores filmes de horror.

Em vários momentos, imagina-se que a história foi desperdiçada nas mãos de David Fincher - um diretor menos pedante poderia ter feito algo melhor, mas com certeza não teria ido tão longe na parte técnica. Talvez pela complexidade, tanta gente tenha desistido de levá-la a cabo (Spielberg, Spike Jonze, Ron Howard). O próprio Scott Fitzgerald escreveu apenas 25 páginas e deixou tudo inconcluso. Há que considerar a coragem de Fincher, mas ainda falta um bom caminho para se tornar realmente um bom diretor, fato que vai acontecer quando ele apurar o estilo e deixar de lado seus exageros visuais maneirísticos.

Comentários (3)

Pedro Paulo Vieira Silva | domingo, 09 de Março de 2014 - 21:02

\"Assim a barriga tanquinho de Brad Pitt encosta na bunda esplendorosa de Cate Blanchet, os dois imaculadamente belos, numa cena de sexo que teria sido linda se o diretor não desviasse a câmera para mostrar coisas como a fumaça da calefação e um ratinho correndo pelo chão\"

puta merda, como eu amo o Demetrius

Pedro Paulo Vieira Silva | domingo, 09 de Março de 2014 - 21:34

eu acho regular, cresce com a entrada da Cate Blanchet.depois que cessam as fábulas mal narradas e começa a falar da proximidade da morte (e do fim do relacionamento dos dois).o texto aponta todos os defeitos que encontro no filme.

Robson Oliveira | sábado, 02 de Fevereiro de 2019 - 10:06

filme lindo de se ver, uma trama envolvente, esse curioso caso de Benjamin Button é um conto apaixonante.

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