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Deserto Estrangeiro

(Deserto Estrangeiro, 2020)
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Críticas

Cineplayers

Desbravando territórios e gêneros

7,5

Radiografar espaços e os seres que os compõem é uma especialidade de Davi Pretto. Filmes como Castanha (2014) e Rifle (2016) pensam o espaço físico com a mesma potência com que pensa o desenvolvimento de seus personagens, na verdade um completando o outro e criando novas camadas de compreensão para suas cognições. Aqui em Deserto Estrangeiro (2019), Davi busca em lugar distanciado em todos os sentidos o material necessário para realizar uma espécie de horror do hoje, com uma fatia de observação muito específica.

Passado na Alemanha, o filme mostra o encontro entre um jovem brasileiro e uma mulher angolana num parque florestal, sendo ele uma espécie de zelador local. A aura de estranheza que percorre o clima geral, com uma pouco aguçada observação sobre a flora ao redor, se estabelece assim que a câmera filma um osso achado por um cachorro perdido. Na busca pela dona do mesmo, o rapaz encontra essa mulher vagando depois que o parque fechou, e trava com ela um crescente diálogo nada convencional sobre auto-exílio, em condições favoráveis ou não. E daí pra frente o filme passa a se dividir entre essa estranheza e um possível crescimento do horror.

O filme se aproxima de uma noção de cinema de gênero justamente ao aproximar toda a migração para a Europa de povos refugiados; tem uma reflexão sobre o assunto acontecendo na produção que começa sutil e explode em verbalização. Por se tratar de um cinema aqui particularmente gráfico, essa noção não é necessariamente incômoda, mas também não é confortável ao espectador. Davi sabe estabelecer clima e propor leituras não óbvias sobre o jogo que estabelece, mas o caminho que os diálogos apontam realmente quebram qualquer sinal de sutileza.

A disposição da câmera de Davi é muito desbravadora, no sentido de compor planos a um só tempo simples e também inusitados, lugares incomuns para sua própria filmografia; aqui basicamente ele se joga no desconhecido. A ele se juntam dois belos atores (Mauro Soares e Isabel Zuaa) que compreendem seu lugar dentro do espaço e deixam a narrativa fazer o "trabalho sujo", o ato de contar histórias tão primal que se confunde com o próprio Cinema. Que ele dialogue de uma tragédia mundial até um filme de atmosfera crescente de gênero é um passo novo na carreira ainda diminuta de Davi. Ainda que uma certa exposição dialética crie ranhuras na prospecção da imagem, o diretor conecta imagens que varrem o conceito de diáspora pela tela.

Crítica da cobertura da 23ª Mostra de Tiradentes

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