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Críticas

Cineplayers

Debruçados sobre uma única luz.

4,0
Lembram de Joe Wright? O talentoso jovem cineasta britânico surgido na década passada com incríveis adaptações de Jane Austen e Ian McEwan explodiu nas telas trazendo frescor e vigor a produções de época que constantemente eram (na verdade são até hoje) associadas à vontade única e irrestrita de faturar prêmios. Wright apareceu com os pés na porta, como se dissesse que os prêmios poderiam até vir, mas seriam através da visão muito enérgica dele, com uma autoralidade e uma mão firme para não se curvar a clássicos, apenas respeitá-los e torná-los atraentes e excitantes. Sempre aliado a roteiristas que entregavam trabalhos à altura de sua pegada, parecia uma questão de tempo a sua ascensão a um patamar híbrido muito difícil de alcançar, agradando as mentes mais antiquadas e dominantes e também ao novo quadro geracional. Então resolveu diversificar, e fez filme de ação, adaptação de Tolstoi, nova versão de Peter Pan, atirou para muitos lados, sempre com uma certa assinatura. Mas talvez nesse percurso algo tenha mostrado para Wright a passagem do tempo, e hoje ele entrega um filme onde ele parece um detalhe.

O Destino de uma Nação em tudo parece um típico produto 'made for awards' que Wright sempre teve nas mãos para subverter, mas, cada vez mais, a subversão que antes lhe era cara hoje não passa de uma picardia momentânea. Com roteiro do mesmo Anthony McCarten de A Teoria de Tudo, o longa é mais um produto em que esse rapaz se envolve onde tudo é melhor que o trabalho dele, aqui ainda inferior; num projeto onde a oratória é uma característica do protagonista, ter diálogos infanto-juvenis pendendo para o clichê/brega vez por outra é no mínimo frustrante, e faz o diretor se ver num lugar onde ele raramente esteve, o de depender exclusivamente de si para contar sua história em imagens. Ao lado de Wright está Bruno Delbonnel no desenho de luz da fotografia, e juntos eles conseguem captar grandes momentos imagéticos, na maioria das vezes onde o diálogo é supérfluo. Mas a verdade é que o protagonista do filme atende pelo nome de Winston Churchill, um homem reconhecido pela eloquência e ferocidade na língua. Como colocar tolices na boca desse personagem?

O roteiro ainda comete outros pecados. Na ânsia de se debruçar embevecido pela figura de Churchill, o filme reduz um momento de sua vida a algo muito pequeno, uma coisa boba chamada Segunda Guerra Mundial. O filme não me parece nem um pouco interessado em radiografar aquele momento, muito embora exiba datas em cartelas a cobrir toda a imagem projetada a cada passagem de tempo; qual a função da passagem de tempo se tudo o que o roteiro quer é perseguir Churchill para trás e para adiante, indiscriminadamente, e relega suas colocações macro a meros artifícios apêndices? Além disso, há toda uma construção de personagens a seu redor apresentados como importantes e dignos (sua esposa Clementine, o rei da Inglaterra George VI, sua nova secretária Elizabeth Layton, seu rival no Parlamento Halifax) que são tratados com desleixo coletivo e terminam sem qualquer função dramática a não ser a de suporte a Churchill nas cenas, compondo planos ou existindo para o personagem simplesmente não falar sozinho. Não duvido que numa possível adaptação teatral essa produção conseguisse claramente se transformar num monólogo com nenhuma perda narrativa, tão superficiais e mal tratados são seus coadjuvantes.

O interesse do roteiro de McCarten infelizmente parece ser corroborado por Wright - acredito que ele, enquanto diretor, pudesse direcionar a visão para outro lado, o que nunca acontece. Há uma paixão muito clara ali pela fascinante figura de Churchill, na qual o filme tenta alongar esse fascínio, e que reside também muito na interpretação de Gary Oldman. O filme está debruçado e babando sobre Oldman, e é completamente compreensível já que ele promove algo muito difícil, que vai de uma composição muito aguda a uma muito introspectiva, sempre dando o máximo de humanidade e credibilidade a alguém muito complexo. Não é uma interpretação deslumbrada nunca, pelo contrário; Oldman sempre teve uma queda ao histrionismo em seus tempos de Luc Besson, mas vem criando um ator novo e muito mais interessante desde a década passada, e expõe esse equilíbrio de maneira muito delicada aqui, sempre chamando atenção. Mas se Oldman não é deslumbrado, o filme o é com ele desde sempre, num ritmo de prostrar toda sua maquinaria e disposição apenas a assistir esse grande momento da dramaturgia mundial. Que fique claro que a culpa nunca é do ator, mas da forma como o filme se coloca ao seu redor.

No fim das contas os belos e já citados planos criados por Wright e Delbonnel (como a do elevador escurecido com apenas a figura iluminada de Churchill, ou o primeiro discurso de rádio dele, todo avermelhado por uma lâmpada) acabam sobrando nessa ânsia de se debruçar por um ator - sim, brilhante - que atravanca o resto da produção, que ainda conta com um trabalho preguiçoso de um dos mais brilhantes compositores da atualidade, Dario Marianelli, em notas sem qualquer inspiração. Agora pense no quadro geral, uma produção imersa na preguiça de ideias do seu diretor, que repete planos em câmera lenta da população e tomadas aéreas a cada 15 minutos a ponto de esgotar a validade do recurso, e quando seu roteirista volta a demonstrar um desenvolvimento de pouca qualidade do material objetificado. Sobra um Gary Oldman genial, e só.

Comentários (2)

Matheus Darswik | sábado, 17 de Fevereiro de 2018 - 23:33

Discordo da crítica e ao meu ver, todas as pessoas envolvidas no filme estão de parabéns, Gary Oldman está extraordinário e o filme é ótimo.

Letícia | sábado, 03 de Março de 2018 - 11:34

quando tentei assistir pela primeira vez dormi na metade
na segunda foi uma penúria
uma pena os talentos desperdiçados nesse longa

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