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Críticas

Cineplayers

Uma hora e meia e nada para ser contado.

3,0

A expectativa criada em torno de Do Começo ao Fim, novo filme de Aluizio Abranches (de Um Copo de Cólera), é compreensível pelo seu tema extremamente polêmico – homossexualidade e incesto de uma vez só – e pelo belíssimo vídeo de divulgação disponibilizado no You Tube, no qual a trama promete tocar fundo em conceitos tabus para muitas pessoas, ainda mais em uma sociedade tão heterogênea como a brasileira. O problema é que nada do que é visto no vídeo promocional condiz com a realidade final da obra.

Artificialidade é a palavra que melhor define o longa-metragem em todo seu início. A narração feita pelo personagem Thomás é de doer o ouvido pela falta de naturalidade em sua leitura. O menino Gabriel Kaufmann, que interpreta Thomás quando criança, é infeliz em sua composição amadora de personagem, com pausas que evidenciam a decoreba do texto – além do tom de voz bastante irritante. O diretor mostrou fragilidade para conduzir o trabalho dos atores e a displicência com o trabalho primário de Kaufmann torna o fraco texto ainda mais fraco e a história, desse modo, não emplaca.

Logo na primeira sequência, Abranches opta pela câmera lenta que, pela falta de razão para seu uso – além da posterior banalização do recurso – não acrescenta nada ao filme e, o que é pior, o torna apelativo em busca de emoções que o público não pode compartilhar com a trama. A primeira cena dos irmãos já adultos tentou transmitir sensualidade, novamente pela escolha estética da câmera lenta, mas essa opção apenas explorou de forma grosseira o físico de dois modelos que interpretam personagens sem conteúdo e sem profundidade alguma.

Conteúdo é algo praticamente inexistente em Do Começo ao Fim. A história dos irmãos que desde cedo desenvolvem um carinho profundo um pelo outro e que, com o tempo, relacionam-se amorosamente, poderia ser rico ao mostrar preconceitos, ao propor discussões sobre sexo, prazer, felicidade e uma lista infinita de temas concretos e abstratos. Dessa forma, poderia contribuir para o avanço da sociedade no que diz respeito a seus conceitos, mas nada disso é visto. A história é completamente vazia de significado.

Quase não existem outros personagens além dos meninos e da família, que pela naturalidade com que encara a situação desde o início retira qualquer tipo de possibilidade de crença na história e anula qualquer espécie de conflito, o que seria fundamental para retratar a realidade de uma sociedade permeada por tabus. Quando existe a inserção de algum tipo de conflito para funcionar como ápice dramático da narrativa, a sequência – a de um possível envolvimento extra-relação de um personagem – mostra-se ineficaz.

No fim das contas, os 90 minutos de filme servem, num primeiro momento, como um desfile vazio de carinho entre irmãos e, posteriormente, como retrato do envolvimento de duas pessoas do mesmo sexo. O problema é que o próprio longa foge da discussão que, em teoria, deveria propor. Não há polêmica, pois o assunto incesto – condenado por grande parte das culturas – é simplesmente deixado em segundo plano pelo roteiro.

Quando crianças, os irmãos não experimentam nenhuma descoberta, não exploram sexualmente os corpos, nem em momento algum mostram atração física recíproca, apenas trocam carinhos exacerbados, o que desperta a atenção – mas quase nenhuma preocupação – por parte de sua mãe e de seus respectivos pais (eles são filhos de casamentos diferentes). Os meninos não passam por crises que seriam naturais e não se sentem diferentes, pressionados ou coagidos por ninguém – como infelizmente seria normal –, e também não encontram desafios para superar a fim de ficarem juntos. A vida social, além do relacionamento deles, praticamente inexiste durante todo o tempo.

Já adultos, não faz mais diferença nenhuma o fato de eles serem da mesma família, banalizando o tema do filme a uma relação homossexual comum e que, pelo caminhar da trama, nada propõe de novo à temática.

O pouco que se salva em Do Começo ao Fim é a atuação correta de Júlia Lemmertz, responsável pelos momentos em que há alguma esperança de que a história se desenvolva com naturalidade. De resto, há um roteiro fraco, opções narrativas e estéticas equivocadas e ainda uma trilha sonora melodramática absolutamente descolada da história. O que fica claro para quem assiste é que o filme é vazio e artificial do começo ao fim.

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