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Críticas

Cineplayers

Bruce Willis melhor do que nunca. Um dos filmes mais agradáveis do ano.

8,0

Lançado em 1988, Duro de Matar modificou o cenário dos filmes de ação. Em um gênero tomado pelos “exércitos-de-um-homem-só” como Stallone e Schwarzenegger, o surgimento de um herói vulnerável e humano como John McClane tornou-se referência para produções futuras. O sucesso do filme, além de estabelecer novos padrões, gerou as inevitáveis seqüências, Duro de Matar 2 e Duro de Matar 3: A Vingança, dois bons derivados, mas aquém da qualidade do original.

O projeto de uma quarta obra envolvendo o sarcástico detetive de Nova York estava circulando há tempos pelos corredores hollywoodianos. Finalmente, a obra ganhou sinal verde com uma história envolvendo um ataque cibernético aos EUA. Na trama, McClane é chamado para escoltar um hacker até o escritório do FBI. O que ele não sabe é que o garoto ajudou inconscientemente um grupo que tem como objetivo destruir qualquer serviço gerenciado por computador, causando um caos no país. Cabe ao detetive proteger o hacker enquanto tenta impedir os planos do vilão.

Admito que tive ressalvas quando tomei conhecimento dos nomes envolvidos na produção. Sempre fui fã da série e, principalmente, do personagem principal e os nomes de Len Wiseman e Mark Bomback, diretor e roteirista, respectivamente, causaram calafrios. E não podia ser diferente, afinal, o primeiro é o responsável pelos fraquíssimos Anjos da Noite e o segundo bolou o insosso O Enviado.

Mas como é bom ser surpreendido. Duro de Matar 4.0 não é somente um digno representante da série, como também o melhor filme de ação do ano até agora e a segunda melhor incursão de John McClane nas telonas. Tudo que o público espera está presente: um personagem carismático, falas divertidas, cenas de ação espetaculares e um roteiro eficiente.

Talvez este último seja o mais inesperado. Obviamente, a trama contém sua parcela de furos. No entanto, mesmo longe de ser uma obra-prima, o texto de Mark Bomback funciona exemplarmente para um filme de ação, criando a base necessária para que John McClane saia matando vilões a torto e a direito. O grande mérito do roteiro é manter as características que fizeram da série um sucesso. McClane continua como o cara certo no lugar errado, destilando ironia e sarcasmo para enfrentar uma situação na qual não queria se ver envolvido.

Da mesma forma, o roteiro ainda encontra espaço para leves alfinetadas no governo norte-americano, acusando o Tio Sam de possuir um despreparado sistema de defesa e até arriscando críticas mais pontuais, como sobre a demora no envio de ajuda à Nova Orleans pós-Katrina. No fundo, porém, fazer o filme girar em torno de um ataque cibernético foi uma grande sacada dos cineastas, uma vez que a grande maioria do público não faz a menor idéia se tudo aquilo é possível ou não e acabam comprando a idéia.

O mesmo, aliás, ocorre com McClane. Algumas boas cenas são construídas sobre o fato do detetive fazer parte de outro tempo: “Você é um herói analógico em uma era digital”, diz o vilão. Duro de Matar 4.0 é recheado destas frases espirituosas, uma das características da série e do personagem. A cada dois minutos, McClane ou seus coadjuvantes têm uma piadinha a fazer e o mais surpreendente é que a maioria delas é bem inserida no contexto do filme e realmente dá certo. Dentre elas, a minha favorita é a resposta de McClane quando o personagem de Justin Long diz que ele destruiu um helicóptero com um carro: “Eu estava sem balas”.

Ah, sim, McClane destrói um helicóptero com um carro. Absurdo? Certamente, mas é uma das cenas mais bacanas do filme. Ponto para o diretor Wiseman, que cria algumas seqüências genuinamente empolgantes, utilizando efeitos especiais para gerar tensão e divertir o espectador, não para mascarar os problemas da obra. Se o duelo de McClane com um F-35 é exagerada, ela também é divertida como poucas. E o mesmo vale para a seqüência dentro do túnel, onde a dupla de protagonistas escapa por milagre de ser literalmente esmagada por carros.

Outra boa escolha de Wiseman foi a utilização do chamado parkour – aquele esporte surgido na França no qual alguns caras ágeis saltam de prédios, escalam paredes e promovem a “arte do movimento” –, já utilizado em outros filmes como B13 – 13º Distrito e Cassino Royale. Além de render imagens impressionantes, o parkour transmite um grau de realismo a Duro de Matar 4.0, construindo um balanço interessante com as cenas de ação explosivas do filme.

Mas se os cineastas forçam um pouco a barra nestes momentos, eles também não esquecem daquilo que sempre fez de McClane um herói diferenciado: sua vulnerabilidade. Todos sabem que ele não vai morrer e no final vai derrotar o vilão, porém o detetive sempre sofre para atingir seus objetivos. Ele apanha, sua, sofre, se machuca, sangra e chega ao término da missão completamente quebrado. Esta composição traz um grau de humanismo ao personagem; o espectador acredita que ele pode fazer as peripécias que faz na tela, mas também crê que poderia ser o cara que mora na casa ao lado.

Boa parte disso deve-se ao magnetismo de Bruce Willis. Extremamente à vontade no papel que o levou ao estrelato, Willis mostra que, ao contrário de Stallone e Schwarzenegger, continua capaz de carregar nas costas um filme de ação. Bem-humorado e rabugento ao mesmo tempo, com um problema de atitude que constantemente põe um sorriso na platéia, o McClane de Willis revela-se um herói ainda cativante.

E não é só Willis que está bem. O restante do elenco parece ter captado o clima do filme e divertem-se à beça na tela. Justin Long, que poderia se tornar uma espécie de Jar Jar Binks e irritar o espectador pela improvável parceria com McClane, consegue manter a empatia e tem até algumas boas cenas. Enquanto isso, Timothy Olyphant cria um bom antagonista para o detetive, ainda que fique anos-luz atrás do eterno Hans Gruber de Alan Rickman. Já Maggie Q. dá um show como vilã, fazendo McClane passar por maus bocados, e Mary Elizabeth Winstead surge como um bom acréscimo, assumindo com naturalidade a atitude que se espera da filha do protagonista (“Vamos lá pra fora, só você e eu. Vamos ver quem machuca quem.”).

Quem gosta de filmes de ação não tem o que reclamar sobre Duro de Matar 4.0. Admito que meu receio em ver pessoas com talento duvidoso assumindo uma série tão querida transformou-se em satisfação. Duro de Matar 4.0 é uma aventura deliciosamente divertida e provavelmente as duas horas mais agradáveis a se passar no cinema este ano. E nunca é demais ouvir John McClane esbravejando seu inimitável “Yippee-ki-yay, motherfucker”.

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