Existe uma beleza peculiar quando o cinema se permite não ter pressa. Em Vez de Árvores, coprodução entre Argentina e Alemanha dirigida por Philipp Hartmann, abraça exatamente isso: a contemplação. Guiado pela presença do crítico argentino Roger Koza — aqui não apenas um pensador, mas também personagem —, o filme convida o espectador a uma caminhada que cruza espaços urbanos, domésticos e naturais, mesclando encontros, conversas e devaneios sobre a nossa relação com o mundo ao nosso redor. Mais especificamente, com a natureza. E, inevitavelmente, com o próprio cinema.
Difícil classificá-lo. Está no território do documentário, sim, mas também flerta constantemente com a ficção, com o ensaio audiovisual e com o registro performativo. A cada novo diálogo ou situação, o filme parece menos interessado em respostas e mais em acumular perguntas, como se a própria tentativa de compreender o papel da natureza na arte (e vice-versa) já fosse, por si só, um gesto poético suficiente.
Por vezes, esse jogo funciona de maneira encantadora. É o caso, especialmente, da conversa com a cineasta Paula Gaitán, onde seus relatos sobre como pensa a natureza dentro da sua obra oferecem uma das passagens mais inspiradas da projeção. Há também uma reflexão poderosa sobre a taxidermia, que surge quase como uma metáfora desconfortável sobre como, historicamente, a arte ocidental buscou aprisionar e domesticar aquilo que é selvagem — seja a fauna, seja os próprios povos colonizados.
Por outro lado, nem todo encontro rende o mesmo impacto. A dinâmica entre Roger Koza e seus interlocutores às vezes parece dispersa demais, perdendo força no meio de suas próprias tentativas de criar um fluxo livre de pensamento. A proposta de pensar o cinema dentro dessa equação, inclusive, se esvai em certo ponto, surgindo mais como ruído de fundo do que como eixo estruturante.
Talvez essa seja, de fato, a maior armadilha que Em Vez de Árvores enfrenta: ao se deixar levar pela abstração e pelo ritmo das divagações, flerta frequentemente com uma experiência que pode soar descompassada, distante e até desinteressada para quem não embarcar de corpo inteiro na proposta.
Ainda assim, há beleza no risco. Há força em assumir o desconforto de não conduzir seu público pela mão, e, sobretudo, em aceitar que pensar sobre natureza, arte e cinema é, na maioria das vezes, menos sobre encontrar respostas e mais sobre se permitir o incômodo das perguntas.
Filme assistido no Olhar de Cinema – Festival Internacional de Curitiba.
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