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Críticas

Cineplayers

Simplicidade e boas interpretações são a chave da boa qualidade do filme.

7,0

Ensinando a Viver (Martian Child, no original) é o tipo de filme que Hollywood faz às pampas. Dessa grande leva de dramas cômicos, a maioria cai no esquecimento e vai parar em uma prateleira deslocada da vídeo-locadora, por onde fica por muito tempo para eventualmente ser redescoberto e logo descartado. Eventualmente, porém, as produtoras acertam, e acabam criando uma obra com um pouco mais de substância, ainda que se utilize dos mesmos ingredientes que tornam os “competidores” irrelevantes. Ensinando a Viver, felizmente, é um desses casos. Não é especialmente genial. Na verdade, nem chega perto disso. Mas sua mistura de fórmulas e clichês conhecidos mas bem empregados, de forma a não abusar muito da inteligência do espectador, faz deste um trabalho bastante interessante.

Trata-se de uma viagem agradável entre diversos gêneros: comédia, drama, mistério e uma pontinha de romance. Um garoto deslocado e com hábitos estranhos, que acha que vem de Marte (literalmente) é adotado por um escritor de ficção científica infantil, viúvo, que quer se lançar no desafio de ser pai. Vê no garoto algo dele mesmo quando criança e mesmo com tudo contra (irmã, conselheiros adotivos, dificuldades do garoto em se adaptar) resolve tentar. Até porque se ele não fosse tentar não haveria um filme, certo? John Cusack faz mais um tipo boa pinta e levemente depressivo, talvez sem sorte na vida, algo que parece se encaixar bem em sua filmografia. Aqui, felizmente, o ator não está tão caricato quanto em outras interpretações recentes (1408, O Contrato).

A criança é interpretada por Bobby Coleman, que tinha 10 anos à época das filmagens (mas pelo seu tipo franzino aparenta bem menos). Com o papel principal nas mãos – e o mais difícil de todos – é óbvio que o sucesso qualitativo do filme dependeria de sua interpretação. Felizmente, graças ao ótimo trabalho do garoto, que conseguiu passar uma simpatia imensa, pelo menos para mim, e sem deslizes na interpretação (apesar de um ou outro exagero), a proposta do filme funciona, e o roteiro, um tanto fantasioso, consegue ser crível o suficiente. Foi um belo trabalho infantil. Coleman realmente parece alguém diferente das outras crianças e seu tipo físico (franzino e sensível) combina com a imagem de excluído das brincadeiras. Ele só pode pensar que é de Marte mesmo.

O roteiro também marca pontos ao brincar com a origem do garoto e, consequentemente, com as expectativas do público. Seria o garoto de Marte realmente? Estaríamos assistindo a uma ficção científica ou a um drama singelo de um pai viúvo em busca do amor de uma criança de hábitos estranhos? O resultado disso é muito interessante (embora possa confundir as pessoas mentalmente preguiçosas) e cria interesse constante a cada cena subsequente, quase que “hipnotisando” o espectador. Pelo menos meu interesse foi total e, mesmo sabendo que não deveria esperar um final extraordinário (porque não faria sentido), Ensinando a Viver vale mesmo é pela viagem divertida e cheia de pequenas surpresas.

Até mesmo os coadjuvantes, por menos desenvolvidos que sejam, estão bem, e não comprometem o resultado global. É o caso de Amanda Peet, cuja personagem tem um meio-romance com John Cusack, mas não é intrusiva na história central (viúvo e filho adotivo) de forma alguma, isto é, esse aspecto do roteiro adiciona um sabor extra ao todo sem desfocar a história principal. Bom trabalho dos roteiristas, que souberam (como geralmente não acontece) dosar a mão e não abusar da boa vontade de seu público. A moral da história é bem banal e óbvia (“seja você mesmo”, “acredite em si”, “não dê atenção ao que os outros pensam de você”, etc.), mas isso é o de menos, pois a realização é tão adorável que torna esse clichê um ponto bastante desculpável. Um filme muito bom.

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