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Críticas

Cineplayers

A aranha arranhada.

7,0

No primeiro filme da nova franquia do Homem Aranha, dirigido por Marc Webb, a discussão trazida pelo subtexto da trama girava em torno das fraquezas que acometem a todos, inclusive os super poderosos. O novo Peter Parker não é mais o nerd adolescente que está aprendendo a criar responsabilidades e descobrindo como lidar com as mudanças de seu corpo, e sim o jovem que luta para reconstruir os estilhaços de seu passado para enfim saber dominar sua própria força e superar suas imperfeições. Se para alguns essa mudança-chave na composição do personagem chega a soar como um insulto (em especial para os fãs xiitas da trilogia de Sam Raimi), para outros é a justificativa que valida o reboot precoce da franquia. 

Agora, em O Espetacular Homem-Aranha 2: A Ameaça de Eletro (The Amazing Spider-Man 2, 2014), o diretor Marc Webb consegue um feito duplo ao ampliar sua rica discussão iniciada no primeiro filme e ainda driblar as ambições mercenárias da Marvel em transformar tudo em uma superprodução vazia e sem personalidade. A garra do diretor em defender seus personagens é tão evidente que o mais importante no filme acaba sendo justamente essa abordagem intimista de cada um deles, em detrimento das cenas de ação recicladas, que não passam de encomendas de estúdio. Se por um lado a relação entre esses personagens parece ocorrer muito depressa (como o romance vai-e-vem com Gwen Stacy, a amizade com Harry Osborn e a ligação com o passado dos pais de Peter), por outro há um carinho muito especial por eles, e esse acaba sendo o ponto alto da produção.

O novo vilão, Eletro, que ganha vida na caricatura de Jamie Foxx, não passa de pretexto para a introdução de Harry Osborn/ Duende Verde (Dane DeHaan) na história, por isso a trama inicial de um conflito com esse engenheiro elétrico não desperta grandes interesses, até porque no universo original do Homem Aranha ele não atua como um vilão tão importante, e aqui valerá mais pelos efeitos especiais que seu super-poder proporciona visualmente. Sendo assim, o foco do filme é na verdade Gwen Stacy (Emma Stone).

Depois de percorrer uma série de clichês exigidos por estúdios, desses que se tornaram obrigatórios nos filmes de heróis pós-The Avengers - Os Vingadores (The Avengers, 2012), o novo Homem Aranha retoma algumas discussões interessantes iniciadas no primeiro filme, quando Marc Webb atuou de forma mais independente. Primeiro por abordar a relação romântica de Peter e Gwen, que ganha uma força estratosférica sob o comando do carisma e química entre Andrew Garfield e Emma Stone, e depois por se enveredar no discurso sobre as fraquezas humanas. Os personagens do universo de O Homem Aranha, e de certa forma de todos os filmes de super heróis, são todos vítimas de uma sociedade intolerante com suas fraquezas, e quando, por acidente, passam a obter algum tipo de poder, descontam de volta na sociedade todos os seus anos engolindo humilhações e descasos. O poder nas mãos deles é sempre uma arma, nunca uma solução, e por isso há um conflito tão interessante quando alguém de caráter como o herói Peter ganha a chance de usar essa força de uma maneira construtiva, apesar das imperfeições naturais o puxarem pro lado egoísta da alma. Se de um lado temos Eletro desejando se vingar de todos que o menosprezaram a vida toda, e um Duende Verde lutando por poder para curar sua doença degenerativa, do outro temos também uma vítima da vida procurando se encontrar em meio a um mundo em que poder rima com ganância e egocentrismo.

Mas o que engloba todos esses conflitos – tanto os de Peter Parker quando os de Eletro e Harry Osborn – é a abordagem sobre a finitude da vida, uma questão sempre presente em qualquer filme de super heróis, mas que aqui ganha uma atenção em primeiro plano. Afinal, o que são os super poderes senão uma chance de lutar não apenas contra suas próprias fraquezas, mas também contra sua inevitável mortalidade?  Logo no início da trama, Webb intercala cenas do Homem Aranha lutando contra o crime e cenas do discurso de Gwen Stacy sobre a importância de fazer um nome que perdure para além da própria existência, ou deixar um legado que mantenha viva sua memória. E é disso que tudo se trata. Cada qual na trama luta contra a morte, que está a uma distância diferente para cada personagem, e cada um o faz de uma maneira própria. Seja Gwen Stacy e seu sonho de se tornar uma importante pesquisadora médica, seja Eletro e sua carência nata pelo reconhecimento de seu valor profissional e pessoal, seja Harry Osborne e sua desesperador perspectiva de morrer jovem e deixar para trás todo o poder herdado pelo império bilionário de seu pai, ou seja Peter Parker e sua dificuldade para conciliar as descobertas do passado com as novas responsabilidades do presente, e finalmente a perpetuação de um nome e identidade para o futuro.

Todos ali lutam contra a finitude. O super poder é sempre uma forma de adiar o inadiável, desafiar a natureza humana, e se possível passar intacto contra a morte, o arqui-inimigo não só dos super-heróis, como de toda a humanidade. Para quem já assistiu, sabe que nem todos os quatro personagens centrais dessa história conseguirão passar vivos pela prova de fogo, mas fica no ar a sensação de que pelo menos um deles terá sua memória enraizada não só para o espectador, como também no coração despedaçado de um Peter Parker apaixonado.

Comentários (8)

Walter Faria | quinta-feira, 08 de Maio de 2014 - 12:38

crítica bem melhor que o filme

Marcos Freitas | quinta-feira, 08 de Maio de 2014 - 16:11

Prefiro bem mais Maguire e Dunst [3]

Seu Madruga | segunda-feira, 06 de Outubro de 2014 - 17:11

Tá ruim de aguentar essa franquia ordinária do Webb.

Leonardo | segunda-feira, 01 de Junho de 2015 - 15:15

Prefiro bem mais Maguire e Dunst [5]

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