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Críticas

Cineplayers

Anderson e Baumbach em uma fábula sobre família com boas doses de cultura pop.

8,0

É possível dizer que Wes Anderson dirige sempre fábulas: filmes quase fantásticos, sobre personagens incomuns e cenários que ofuscam com o excesso de cores e detalhes. Tudo meio esquizofrênico. Noah Baumbach, por sua vez, dirigiu o não menos esquizofrênico Margot e o Casamento, além de ser parceiro intelectual de Anderson no roteiro de A Vida Marinha com Steve Zissou, com quem também guarda a predileção pelo tema das relações familiares.

O prólogo acima é só para situar O Fantástico Sr. Raposo na trajetória dos dois cineastas e dizer que dessa vez eles produziram uma fábula com o gostinho das histórias que as mães deveriam continuar contando para fazerem dormir as crianças. Inspirado no livro homônimo de Roald Dahl, autor também do clássico A Fantástica Fábrica de Chocolate e de outros livros que viraram filmes - como Matilda e James e o Pêssego Gigante -, o senhor Raposo criado por Anderson e Baumbach não podia ser convencional, é claro. Nem a família de raposas poderia viver no universo dos dois diretores se tivesse a leveza que Dahl deu a eles.

Se a história original trata de uma família perseguida lutando por sua sobrevivência, no filme vemos papai Raposo (voz de George Clooney) lutando pelo resgate de seus instintos animais, buscando uma transgressão qualquer em sua rotina pacífica ao elaborar “planos perfeitos” para assaltar os galinheiros e adegas dos três grandes proprietários do vale, Boque, Bunco e Bino (Michael Gambon). É com a gana de um renascimento ritual que ele se muda com a família para perto dos inimigos e inicia um embate com eles apenas por divertimento.

Baseado nesse mote da castração dos machos pelas obrigações familiares e trocando a ninhada de filhotes por um filho único e problemático, a dupla de roteiristas adapta a história original (publicada em 1970) para o fim da primeira década dos anos 2000 e, portanto, para temas comuns a seus filmes: as relações entre pais e filhos, o egoísmo dos adultos e a busca dos jovens por afirmação.

A história de Ash (Jason Schwartzman) também é um exemplo atual da condição dos filhos, que por escolha dos pais, não ganham irmãos: ele é frágil, introspectivo e faz de tudo para chamar a atenção do pai, situação que se agrava com a chegada do primo Kristofferson (Eric Anderson), exatamente o seu oposto. A rivalidade entre os primos será outro ponto de tensão na história.

Enquanto isso, Sra Raposo (Meryl Streep) também terá de reviver seus momentos de astúcia animal quando sua família entrar em choque com os fazendeiros. Ela também trocou a juventude aventureira pela tranqüilidade do lar. Nos momentos de tensão veremos o passado da dona de casa vir à tona, quando Rato (Willlem Dafoe) relembrar os tempos em que ela e Raposo formavam uma dupla de delinqüentes.

Além disso, a dupla de roteiristas também atualiza a fábula infantil com outros elementos sempre presentes em seus trabalhos: a estética vintage pode ser reconhecida nos figurinos inspirados em roupas de brechó e no stop-motion estilizado para parecer antigo, fazendo referência a animações como Pedro e o Lobo, de Suzie Templeton (2006) e ao King Kong original de 1933 (percebam o balanço dos pêlos de todos os animais); o movimento indie também está lá, com a presença de dois de seus ícones: o músico Jarvis Cocker (vocalista da banda Pulp) cujo personagem -  Petey -  improvisa uma canção nonsense, enquanto Bill Murray empresta sua voz a Texugo, o amigo meio away de Raposo.

Enfim, referências pop não faltam no cinema de Wes Anderson, onde um cacoete como marca registrada do protagonista é apenas um dos detalhes que tornam o filme interessante não só para crianças, mas para a família inteira.

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