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Críticas

Cineplayers

A história recente por quem enxerga nossa época e seus efeitos: Kathryn Bigelow.

8,5

O ciclo da violência é a primeira questão sobre a qual a diretora Kathryn Bigelow se debruça. Há, logo de cara, o terrorismo físico e o psicológico, representado tanto pelo prisioneiro, personagem de uma rede terrorista, quanto pela equipe da CIA. Com a tortura institucionalizada pelo governo Bush, os agentes se entregam ao mesmo tipo de expediente que condenam. Está desenhado o primeiro acerto de A Hora Mais Escura (Zero Dark Thirty, 2012). Cai a barreira entre mocinhos e violões. A violência passa a ser a forma mais fácil de vingança. Isso vale para os dois lados. Claro que essa política de ambos gera mais e mais derramamento de sangue.    

Bin Laden é o alvo. Maya é a figura central da CIA na caçada pelo líder terrorista. Esse jogo de gato e rato se estende por dez anos. Na abordagem desse capítulo recente da história, Bigelow construiu o anti-argo, aquela fantasia baseada em fatos reais narrada com correção por Ben Aflleck. Aqui há, sobretudo, respeito aos fatos, secura narrativa, ausência de maneirismos hollywoodianos e ausência de autoglorificação. São os fatos escancarados que gritam “não torça, encare-os”. É dessa maneira que Bigelow conduz com invejável talento a caçada ao terrorista. O final não precisa ser catártico, apenas factual. Do mesmo modo, é cercado por tensão, mesmo com o conhecido resultado.

A polêmica acerca da tortura, no contexto de tudo o que representa A Hora Mais Escura, parece mais plantada do que as armas de destruição em massa do Iraque. Qual é o desvio ético possível da diretora? Não se posicionar contra? Também não o faz a favor. Existe um corte bem claro entre a política de obtenção de informação na era Bush e na Obama, e para Bigelow coube apenas capturar o retrato da história, o que ela fez com precisão. São ações que geram mais ataques e mais violência. O espectador que decida se os fins justificam os meios. É o mesmo dilema moral de Lincoln, mas que pelo nobre resultado não gerou tanta controvérsia. 

Além disso, Bigelow não glorifica os Estados Unidos, como seria mais fácil. No final, é como se perguntasse. “Matamos Bin Landen, e daí? Estamos seguros? Acabou o medo?” São as incomodas sugestões que doem aqui e acolá. De qualquer forma, A Hora Mais Escura produziu um debate sobre questões que alguns dizem terem sido negligenciadas, principalmente no caso da tortura. Nesse sentido, já não cumpriu o papel? O debate está posto sobre a mesa.

Ainda na linha de repensar esse heroísmo patriótico, a diretora também mexe com a CIA. A inteligência americana precisou de dez anos para descobrir o real paradeiro do inimigo público número 1 do país e, novamente, sob o uso da tortura para conseguir traçar a teia inicial de chefes, colaboradores e líderes. Nesse meio tempo, novos atentados ocorreram, pistas falsas atrapalharam e erros aconteceram. A inteligência, sob esse contexto, está onde mesmo? Da mesma forma, esse sistema tardou, mas não falhou. O resultado foi produzido. E é assim que entra a questão da obsessão de Maya, chefe de investigação. Ela é o retrato de uma sociedade que se tornou quase doente pela ideia de capturar Bin Laden e que, cumprido o objetivo, se viu momentaneamente sem ninguém para culpar por seus próprios erros, neste de ciclo de violência que leva a ações e reações que vitimam milhares. Maya no avião: sem chão, sem rumo e estranhamente infeliz.

Comentários (7)

Camila Gomes | terça-feira, 05 de Março de 2013 - 20:28

Achei a crítica mto boa, e também gostei do filme.
Em nenhum momento, me pareceu que Bigelow quis mostrar mocinhos ou vilões (a tortura na era Bush, mostrou que americanos podem ser tão ou mais cruéis quanto afegãos, mulçumanos ou qualquer outra nação/raça a favor disso).
Tbm achei notória a diferença entre a era Bush e Obama, e gostei como ela foi representada.
E que excelente interpretação de Chastain (Maya)!!!
Desde “The Tree of Life” venho admirando cada dia mais seu trabalho.
😁

Alexandre Marcello de Figueiredo | segunda-feira, 10 de Junho de 2013 - 19:44

Gostei do filme. A sequência inicial da tortura é muito boa e a tensão permeia a trama do início ao fim.

Lucas Aragão | sábado, 07 de Janeiro de 2023 - 23:36

Obama, o anjo da paz....

Esta militância perdeu o senso do ridículo.

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