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Críticas

Cineplayers

Os laços inquebrantáveis.

7,0
Aurora (Shirley MacLaine) e Emma (Debra Winger) vivem uma gangorra emocional constante, ora rindo juntas, ora chorando; ora passando a noite conversando e trocando experiências, ora brigando pelo telefone; ora enjoadas uma de olhar para a outra, ora desesperadas de saudade. A polidez e falta de senso de humor de Aurora se contrapõe à personalidade espirituosa e desinibida de Emma, de modo que uma parece incompleta e solitária sem a outra. Uma relação tão difícil e ao mesmo tempo tão natural parece improvável de se manter por tanto tempo sem sofrer algum desgaste, mas o fato é que a verdadeira ligação entre elas é incapaz de ser quebrada: Aurora e Emma são, antes de tudo, mãe e filha. Laços de Ternura (Terms of Endearment, 1983), diante deste fato, se desenrolará inteiro no sentimento mais forte que pode existir: o incondicional amor materno. 

Campeão de bilheterias, o drama do diretor e roteirista James L. Brooks acabou conquistando tanto público quanto crítica pela irreverência e delicadeza com que trata temas cotidianos, como as relações familiares, o casamento, a maternidade, o envelhecimento e o enfrentamento de uma doença. Sua simplicidade acabou lhe rendendo os Oscars de melhor filme, direção, atriz (para Shirley MacLaine), ator coadjuvante (Jack Nicholson) e roteiro adaptado. Se considerarmos que a década de 1980 é conhecida como uma das mais equivocadas em se tratando de filmes premiados com o Oscar, Laços de Ternura acaba parecendo um positivo destaque, mesmo não sendo necessariamente um grande filme. 

A estrutura de idas e vindas no tempo é um recurso interessante para frisar os altos e baixos na relação de Aurora e Emma e como os fatores externos na vida particular de cada uma acaba interferindo, porém jamais quebrando o relacionamento delas. Se por vezes os pulos entre passado e presente acabam sabotando o ritmo e impedindo o filme de se aprofundar melhor em alguns temas e núcleos, por outro ajuda a manter o tom leve e fácil de acompanhar pretendido pelo diretor e lhe dá a oportunidade de explorar Emma e Aurora como personagens individuais. Enquanto a mãe passa pelos medos naturais de envelhecer sozinha e de repente se encanta pelo vizinho despojado (vivido por Jack Nicholson), Emma encara sem a supervisão materna os desafios de formar uma família e lidar com desgaste no seu casamento com o inconstante Flap (Jeff Daniels). Tudo acaba sendo muito mais fácil para a filha, que seguiu seu caminho e tenta aprender com os próprios erros, mas para Aurora a distância se torna uma dor cada vez pior.

Laços de Ternura, desde sua primeira cena, resvala direto no seu tema principal, que não é necessariamente a relação de Aurora e Emma, mas sim a iminência da perda que toda a mãe sofre em maior ou menor escala. Desde o princípio Aurora perde cada vez um pedaço maior de sua filha, que aos poucos vai conquistando sua independência, vai aprendendo a se virar sozinha. Como mãe, seguindo seu instinto natural, ela está sempre sofrendo e de certa forma diminuindo conforme percebe seu espaço cada vez mais reduzido na vida da filha. Emma, por sua vez, só vai entender os sentimentos de preocupação e proteção excessivos de Aurora quando tem os próprios filhos e sente que precisa educá-los e amá-los sozinha, sem a ajuda de um marido desligado e emocionalmente ausente. 

A partir do ponto em que Emma se descobre com câncer, essa situação-chave de Laços de Ternura sobre a iminência da perda de uma filha se eleva à sua potência máxima. Se até então o distanciamento de Emma era parte do processo natural da vida, agora a chance de perdê-la de vez leva Aurora ao seu limite como mãe e como pessoa. Brooks explora esses sentimentos cada vez mais limítrofes com uma delicadeza tremenda, e as atrizes incorporam uma dinâmica tão verdadeira que fica impossível não se envolver com os dramas de cada uma. O tempo transformou Laços de Ternura em um desses casos de filmes injustamente premiados pelo Oscar que todos amam lamentar, mas independente de seu sucesso ou reprovação em círculos de prêmios, trata-se de um dos tratados mais belos sobre as relações capazes de prevalecer sobre qualquer obstáculo da vida – incluindo a morte. 

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