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Críticas

Cineplayers

Animação melancólica, adulta e comovente.

9,0

Sete anos depois do lançamento de As Bicicletas de Belleville (Les Triplettes de Belleville, 2003), o francês Sylvain Chomet volta ao comando de animações com O Mágico, e comprova seu talento para contar histórias por meio de imagens e símbolos, sem precisar recorrer a qualquer tipo de diálogo – por mais que existam raríssimas falas, elas não são necessárias à compreensão da narrativa e nem sequer foram legendadas nas cópias exibidas no país.

Menos preocupado com sutilezas para refrescar o público com o riso, Chomet desta vez intensifica o drama de seus personagens e, desse modo, apresenta um melancólico retrato dos valores modernos – a mensagem, explícita, entristece o espectador por constatar que vale menos o ser humano e mais o que ele representa.

Assim, quando o mágico se apresenta em Londres como atração secundária de uma banda pop, o cenário é desolador. O teatro, lotado por fãs neuróticas dos músicos, sobrevive graças a este tipo de apresentação, já que quando o show termina e o mágico pode, enfim, apresentar-se, apenas três pessoas continuam sentadas nas fileiras da casa de espetáculos – e a garota presente mostra sua descrença em relação ao artista enquanto apenas sua avó, talvez saudosa por sua época, sente-se interessada pelos números.

O talento para criar fantasias do personagem principal, portanto, parece não encantar mais quase ninguém, assim como diversas outras atividades artísticas. Desse modo, torna-se impossível não se sensibilizar com o personagem do palhaço, que mesmo maquiado não consegue transmitir alegria alguma em seu olhar pesado e desolado. 

O valor máximo, atualmente, é a imagem, neste culto exacerbado pelas celebridades e por suas vidas pretensamente glamorosas. Assim, o talento importa menos – ou nada – e o que vale é o espetáculo visual, a performance. Decepcionado, e sempre com a cara fechada, o mágico resolve buscar novos caminhos em busca da sobrevivência de sua profissão.

Ao visitar a Escócia, encontra o motivo pelo qual ainda faz mágicas: a crença das crianças de um pequeno vilarejo na magia da vida e no dom do ilusionista. Uma menina pobre acredita piamente no poder quase divino daquele homem e resolve fugir de sua pequena comunidade para seguir o mágico em sua caminhada por diversas outras cidades.

Deslumbrada com o gigantismo do mundo, visão adquirida ao morar em uma metrópole bem diferente de seu local de origem, a menina passa a se encantar com valores muito diferentes daqueles que prezava no passado – se antes era capaz de satisfazer-se com um simples sapato novo, ela agora deseja cada vez mais bens e acessórios. E, novamente, mais pela imagem e menos pela necessidade, apesar de toda sua carência.

E na crítica ao capitalismo exacerbado, desenha-se um dos mais belos simbolismos do filme. Quando o próprio mágico, já desesperado para conseguir dinheiro para sustentar a si e a menina, aceita um emprego que o coloca na condição de objeto, sendo visto, apenas, através do vidro de uma loja, tornando-se, por consequência, menos artista e mais um produto da sociedade tão criticada por Chomet.

O diretor, por sinal, achou o tom exato para que sua crítica não parecesse moralista e chata – afinal, discursos anti-sistemas cansam pelo excesso de utopias -, e tornou seu belo filme melancólico, triste e verdadeiro, que aponta os defeitos dessa sociedade, mas sem reprimi-la, apontando a arte, e sua própria arte, como uma importante válvula de escape.

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