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Críticas

Cineplayers

Menos do mesmo.

5,5
Quando a música Super trouper toca no primeiro Mamma Mia! (2008), nós temos três atrizes em seus 50 e tantos anos (Meryl Streep, Julie Walters e Christine Baranski), em roupas caracteristicamente anacrônicas, cantando para a filha de uma delas (Amanda Seyfried), em uma pequena reunião às vésperas de seu casamento. Mamma Mia!, adaptado de uma peça que durou 14 anos em cartaz na Broadway, era um musical caricato, de personagens que cantam espontaneamente e coreografias que brilham com o sol da Grécia, onde o filme é ambientado. Sequências como a de Super trouper, Chiquitita ou Slipping through my fingers não fazem dele menos caricato, mas acentuam um apego, que é muito positivo ao filme, à relação entre os personagens, a imaginar que, antes e depois daquele feriado de canções em coro, eles todos compartilharam e seguiriam compartilhando de suas histórias em comum, das quais enxergamos apenas aquele momento. É por isso que, logo antes de cantar a música-título, ao descobrir os antigos relacionamentos de sua juventude (Pierce Brosnam, Stellan Skarsgard e Colin Firth) em sua pousada, Donna (Streep) não se leva por um flashback, mas por uma projeção cômica de quem eles teriam sido um dia, em uma década de 1970 que só existe agora na memória dos personagens.

Um problema fundamental, e inevitável, de Mamma Mia! Lá vamos nós de novo (2018) é romper com o isolamento desse lugar e momento, cedendo ao flashback antes recusado, buscando personagens ausentes e delineando a continuidade de cada um dos convidados daquela primeira festa. O primeiro Mamma Mia! era um filme extremamente nostálgico — era, afinal, um musical com a trilha assinada pela banda ABBA, hoje fortemente vinculada a um imaginário dos anos 1970 —, mas reconhecia a sua nostalgia como parte daquela fantasia tropical. Isso era também o que juntava o filme em uma unidade estética, o que o apresentava como filme. A continuação não se sustenta nesse mesmo solo.

Sua justificativa se dá por outras linhas: um ano depois da morte de Donna, Sophie (Seyfried) se prepara para reinaugurar a pousada que sua mãe montou, o que leva a uma rememoração, pelo filme, da juventude de Donna (agora Lily James) e de como ela chegou à escolha de habitar a ilha em primeiro lugar. A narrativa intercala a juventude de Donna com o amadurecimento de Sophie e, por algum motivo, nas situações mais diversas do passado e presente, todos cantam ABBA. Mamma Mia! Lá vamos nós de novo, apesar de se propor a dar uma representação clara a uma história que foi apenas sugerida ou imaginada no filme anterior, vincula os seus números musicais bem mais frequentemente a uma diegese da fantasia. When I kissed the teacher e Waterloo, já no início do filme, apresentam logo um descompromisso em vincular os números musicais aos personagens e às relações entre eles (um ponto a que Catherine Johnson, responsável pelo texto da peça, atendia rigorosamente). A repetição de músicas que já vinham do primeiro filme é frequentemente mais interessante do que a tentativa de complementar o repertório antes negligenciado da banda.

O filme tem um outro acréscimo problemático, embora este fosse também previsível: a participação de Cher como Ruby, mãe de Donna. A única justificativa possível para a personagem — além de assimilar mais uma música do repertório negligenciado da banda (a saber, Fernando) — é juntar um enorme ícone setentista ao quadro de atrizes e atores do filme. E, mesmo neste sentido, a sua participação parece fora de lugar, principalmente quando consideramos que o reencontro e a reencenação do elenco original é uma das coisas que o filme tem de mais interessante. À essa exceção, a dinâmica do elenco favorece o aspecto cômico do filme; e os novos atores, responsáveis por interpretar uma versão mais jovem do elenco original, conseguem, de modo geral, reproduzir essa dinâmica.

Mamma Mia! Lá vamos nós de novo não é muito diferente do que se poderia esperar que fosse. Se a quase completa ausência de um dos nomes prometidos pelo material de divulgação desencorajar sua ida ao cinema, saiba que, pelo menos, Lily James entrega uma boa releitura para a personagem — ou, ao menos, tão boa quanto é possível à atriz. Este é, afinal, um filme de vários “tão bom quanto é possível ser” dentro de um material a que só é permitido repetir algumas das boas coisas que o primeiro filme oferece. Não é o melhor âmbito das possibilidades, mas também não é sempre que se pode sair do cinema cantarolando Super trouper.

Comentários (5)

Edgar Vinícius Oliveira | sexta-feira, 03 de Agosto de 2018 - 00:36

Este filme foi até uma grata surpresa, gosto do original (é aquele filme que a gente sabe que é ruim, mas é bom); e quando saiu a notícia de que iria ter uma sequência eu não gostei, mas o resultado final foi bem satisfatório. O elenco jovem todo está ótimo, especialmente a Lilly James, e o filme ainda fez algo muito arriscado: SPOILER: Matar sua protagonista. Enfim, achei esse Mamma Mia surpreendemente superior ao primeiro. Melhor dirigido, com uma melhor fotografia, com um roteiro mais arriscado.

Paulo Faria Esteves | sexta-feira, 03 de Agosto de 2018 - 09:38

Verdade, foi bem mais arriscado, sobretudo tendo em conta aquele que deve ser o seu público-alvo.

Walter Prado | sexta-feira, 03 de Agosto de 2018 - 15:00

Eu abomino o primeiro (conseguem a proeza de transformar Julie Walters numa figura insuportável) então nem pretendo ver este aqui.

Victor Tanaka | sexta-feira, 03 de Agosto de 2018 - 22:29

Melhor que o primeiro. Achei bem bagunçado sim, com momentos completamente nada a ver sim, porém bem carismático, o que dá abertura para que vários dos supostos escorregões sejam vistos como momentos nonsense que, no geral, funcionam. É um filme que acaba sendo, portanto, uma grande festa, lotada de referências ao ABBA, que com certeza vai agradar quem quiser diversão sem compromisso e, principalmente, quem gosta das músicas.

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